Thiago Monteiro me faz amar o tênis ainda mais
Tênis é um esporte peculiar em muitos sentidos. É individual, um-contra-um, como muitos outros, mas nenhuma modalidade mostra tanto - e por tanto tempo - as expressões faciais dos atletas. A câmera fecha no rosto da pessoa e fica lá por segundos que parecem horas, à espera de reações. Não há para onde correr. Educação, personalidade, honestidade, caráter... está tudo lá para o mundo inteiro ver e julgar durante toda uma carreira.
O tênis, sobretudo esta versão moderna que exige cada vez mais física e mentalmente, também tem o glorioso "hábito" de refletir o que acontece fora de quadra. Quem trabalha sério e duro avança. Quem relaxa, fica para trás. Em diferentes graus, é bem verdade, mas o tênis é implacável. Assim como na vida, carreiras dependem de muitas variáveis: oportunidades na infância, o talento nato, condições financeiras, um punhado de sorte aqui e ali, etc. Porém, quando tudo se junta, é simples entender por que Thomaz Bellucci teve uma belíssima carreira ou por que Thiago Wild teve uma queda gigante durante certo momento (para ficar apenas em dois exemplos bem conhecidos dos leitores).
É aí que entra minha admiração por Thiago Monteiro. Lembro de uma conversa com Marcos Daniel quando o cearense tinha seus 15-16 anos. O gaúcho disse algo do tipo "Esse garoto vai virar tenista. Trabalhador. Dedicado. Você vai ver lá na frente." Como quase sempre acontece quando tênis é o assunto, Daniel acertou. Monteiro tornou-se um tenista sólido, competente, que passou a maior parte dos últimos sete anos no top 100. Coisa para poucos.
Thiago cresceu, amadureceu e, durante todo esse processo, não deixou de trabalhar e se dedicar. Nunca se mostrou acomodado, embora sua condição financeira - acredito - lhe permita isso. Monteiro sempre falou em chegar ao top 50, mesmo quando não conseguia transformar sua dedicação nos resultados desejados.
THIS. IS. WHAT. IT. MEANS. #ThisIsTennis@dThiagoMonteiro | @InteBNLdItalia | #IBI24 pic.twitter.com/79YHwGQt75
-- ATP Tour (@atptour) May 12, 2024
Tão importante quanto: Monteiro sempre respeitou o mundo à sua volta. Honra compromissos, cumprimenta e trata todos - inclusive jornalistas, que, por motivos óbvios, gostam muito dele - com a mesma educação desde sempre, não importa se acabou de vencer um torneio ou se atravessa uma fase decepcionante. Parece básico, mas não é tão comum assim no tênis.
E é aí que Monteiro se conecta com a minha paixão pelo tênis. Nos últimos destes sete anos do cearense dentro ou beirando o top 100, ouvi e li muitos comentários do tipo "Já desisti do Thiago", "Monteiro não passa disso", etc. É óbvio que o próprio tenista leu e ouviu coisas parecidas. Vivemos no mundo de X, Instagram e TikTok, afinal. Todo mundo tem uma opinião e, como o frasista contemporâneo Casimiro Miguel uma vez filosofou, as pessoas não têm mais vergonha de serem burras.
Mas se o trabalho duro é recompensado, e o tênis é esse reflexo da vida, Thiago Monteiro teria algo ainda mais especial guardado para viver. Esse momento é agora, aos 29 anos. Quando salvou match points e derrotou Miomir Kecmanovic neste domingo (uma vitória parecida com tantas derrotas duras que o cearense viveu), Thiago avançou às oitavas de final de um Masters 1000 pela primeira vez na carreira. Junto com a bela campanha de Madri, são nove vitórias em dez jogos (três sobre top 50), dois qualis furados, um salto de mais de 20 posições no ranking (Monteiro volta para perto do 85º posto) e um enorme passo para se classificar por méritos próprios para os Jogos Olímpicos Paris 2024.
Mais do que resultados e números, atuações e situações têm sido especiais. Um triunfo memorável sobre Tsitsipas - que vinha em grande fase - em Madri. Duas vitórias em uma espetacular Pietrangeli em Roma, com direito a uma barulhenta torcida italiana a seu favor (nem Monteiro entendeu o porquê). Recompensas gloriosas para o trabalho de uma vida. Momentos que mostram que o tênis tarda, mas não falha a premiar quem merece. Dias que me mostram por que Thiago Monteiro me faz gostar ainda mais de tênis.
Coisas que eu acho que acho:
- É muito fácil cair na armadilha de acreditar que palavras como trabalho, processo e disciplina são clichês jogados ao vento - até porque há quem discurse que trabalha e "respeita o processo", mas, internamente, não conhece o real significado disso. No entanto, quem busca realmente viver uma carreira profissional com alicerces sólidos - o tal do processo - os resultados vêm cedo ou tarde.
- No WTA 1000 de Roma, Bia Haddad deixou a desejar na derrota para Madison Keys. Não, não era um jogo fácil nem a brasileira tinha obrigação de vencer, mas seu segundo serviço esteve em um nível muito abaixo do ideal, e o problema parece muito mais mental do que técnico. Difícil vencer coisas grandes assim.
- Thiago Wild teve suas chances contra Etcheverry na segunda rodada, mas deixou escapar o segundo set depois de abrir 5/1. Perdeu seis games seguidos e viu o argentino festejar.
- Fonseca segue aguardando o resultado do pedido feito pela CBT, que usou sua boa relação com a Federação Francesa para solicitar um wild card em Roland Garros. Não acho nada improvável. Por via das dúvidas, o carioca está inscrito no Challenger de Skopje, na Macedônia do Norte. O torneio começa no dia 20, junto com a chave principal do torneio francês.
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