Saque e Voleio

Saque e Voleio

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
OpiniãoEsporte

Nem Djokovic resistiu ao calendário (uma tese nada apocalíptica sobre Nole)

Quando um tenista como Novak Djokovic perde na terceira rodada de um slam - algo que não acontecia desde 2006! - não existe apenas uma causa. É preciso cautela, atenção e uma boa dose de equilíbrio para evitar sentenças precipitadas e as tão comuns teorias apocalípticas que surgem em momentos assim. Portanto, peço paciência ao leitor porque esta análise pode ser um pouco mais longa do que as outras tantas (e já tão longas) que publico por aqui.

Primeiro: o que, então, faltou a Djokovic neste US Open? Talvez o mais fácil de notar tenha sido sua apatia durante boa parte da derrota para Popyrin. Tirando a quebra no começo do terceiro set e um ou outro ponto dali até o fim do jogo, Nole vibrou pouco. Conhecendo Djokovic, parecia o tipo de noite em que ele encontraria um torcedor bêbado para bater boca, quebraria uma raquete, discutiria com o árbitro de cadeira ou simplesmente gritaria "creatina!" para alguém de sua equipe. E depois, claro, viraria o jogo. Não rolou. Faltou vibrar. Faltou energia.

Também faltou saque, o que não foi um problema novo neste US Open. Djokovic teve menos de 50% de aproveitamento de primeiro serviço na segunda rodada, contra Djere. Na primeira fase, contra Albot, registrou nada espetaculares 56%. Contra Popyrin, foram 58%. Não chega a ser um desastre, mas é menos do que se espera de alguém do nível de Djokovic em um slam. E como se isso não bastasse, o que machucou mesmo foram as 14 duplas faltas. Popyrin teve chances demais nos games de serviço de Nole, o que não é nada comum.

Por último (ou quase isto!), faltou aproveitar chances. Popyrin teve 12 break points, o que é muito contra Nole, mas o sérvio teve 16(!) break points e só aproveitou quatro, o que também é muito ruim para o melhor devolvedor de saque do circuito. A verdade é que, embora Popyrin tenha feito uma bela e corajosa apresentação, Nole teve as chances para mudar a história do jogo e não as converteu.

O porquê disso tudo? O mais fácil de apontar é que Djokovic não chegou a Nova York tão afiado quanto costuma para iniciar um slam. Sua preparação foi afetada pelo calendário, pela cirurgia no joelho e, claro, pela medalha de ouro olímpica. O veterano tirou vários dias para comemorar, deixou de jogar em Montreal e Cincinnati, e apareceu em Flushing Meadows com a esperança de conseguir fazer seu jogo encaixar a tempo de brigar pelo título. Não aconteceu.

Antes que o leitor se enfureça, explico: não é o caso de condenar Djokovic por comemorar um ouro olímpico. Longe disso. Fosse este jornalista, estaria festejando até hoje em uma ilha grega entre canecas de Mythos, souvlakis (muitos deles!) e feta fresquinho grelhado. Nole fez o que a ocasião pedia, sobretudo tendo em conta o quanto essa medalha valeu neste momento de sua carreira.

Dito isto, o calendário do tênis é implacável. Assim como fez com Alcaraz, a sequência de eventos puniu Djokovic em Nova York. O sérvio, afinal, jogou Roland Garros, operou o joelho, voltou em Wimbledon (onde foi até a final!), mudou de piso novamente e disputou os Jogos Olímpicos, e, por fim, fez nova troca de superfície, chegando às quadras duras de Nova York. Fosse este escriba jogador do meu Mengão, corria risco de lesão só por escrever uma sequência assim (por via das dúvidas, fui na geladeira buscar um ice tea antes de continuar o texto). Sofrimento rubro-negro à parte, o calendário duro demais, física e mentalmente, minou até um dos maiores da história.

Imagem
Imagem: Robert Deutsch-USA TODAY Sports
Continua após a publicidade

Decadência ou ano atípico? Ou ambos?

É a primeira temporada desde 2017 (o ano da famosa lesão no cotovelo) que Djokovic termina sem conquistar um slam. Perdeu uma semi para Sinner em Melbourne, foi forçado a abandonar Roland Garros por causa da lesão no menisco, perdeu a final de Wimbledon para Alcaraz e, agora, saiu do US Open na terceira rodada. É normal, em tempos imediatistas e de gente buscando o próximo-post-viral-e-dane-se-o-conteúdo, que surja todo tipo de teoria definitiva sobre o tênis e a carreira de Djokovic. "Decadência", "o começo do fim", "a idade chegou", "melhor aposentar" e todo tipo de conclusão dita inquestionável por seu autor.

É claro que foi uma temporada incomum e abaixo das expectativas de quem terminou 2023 conquistando o US Open e o ATP Finals jogando tão bem. Também foi um ano cheio de incômodos físicos diferentes, que se manifestaram em Indian Wells, Monte Carlo, Roma, Roland Garros e Nova York. Em 2024, Djokovic também trocou toda sua equipe (e aparentemente ninguém de seu estafe atual conseguiu consertar seu saque no US Open). Logo, não é um período fácil de analisar e rotular de forma justa - sobretudo para quem não sabe dos bastidores e das causas de todos esses problemas físicos que Djokovic não parece ter intenção alguma e revelar.

Decadência? Fim da linha? Depois do que Novak fez na final olímpica? Tampouco parece o caso. No evento que era prioridade #1, o sérvio jogou seu melhor tênis do ano. Como cravar-acima-de-qualquer-suspeita que um atleta assim, com tamanho currículo e tantos recursos, não terá outros grandes momentos pela frente? Convém não esquecer que mesmo em dificuldades, Novak tirou da cartola vitórias tão improváveis quanto memoráveis contra De Minaur em Monte Carlo, Musetti e Cerúndolo em Roland Garros, Tsitsipas em Paris 2024, e Djere neste mesmo US Open.

Mas sim, a idade chega para todos, e o tempo sempre se mostra o adversário imbatível. Pode muito bem ser que Nole, aos 37-38-39, não consiga mesmo produzir "aquele" nível excepcional de tênis torneio após torneio. Mas qual tenista na história fez isto? E mais: alguém ousa mesmo apostar que Djokovic não tem tênis para vencer mais um, dois ou três slams? Os corajosos que tentem sua sorte. Eu nunca aposto contra o (D)Joker.

.

Continua após a publicidade

Quer saber mais? Conheça o programa de financiamento coletivo do Saque e Voleio e torne-se um apoiador. Com pelo menos R$ 15 mensais, apoiadores têm acesso a conteúdo exclusivo, como podcast semanal, lives restritas a apoiadores, áudios exclusivos e de entrevistas coletivas pelo mundo, além de ingresso em grupo de bate-papo no Telegram, participação no Circuito dos Palpitões e promoções.

Acompanhe o Saque e Voleio também no Threads, no Bluesky e no Instagram.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Deixe seu comentário

Só para assinantes