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Johnny Cabianca, o mago das pranchas de Medina, revela segredos do campeão
Conheço o Johnny "desde sempre". Sei lá, há pelo menos uns 40 anos.
Quando era criança, meu dentista era o Luis Cabianca, Dizer que ele gostava de mim não é um exagero, mesmo depois de uma mordida daquelas no dedo durante uma consulta. O "Tuque" adora futebol, jogava com os moleques, me achava um craque. Lembro com carinho de algumas tabelinhas que fizemos.
Por coincidência (ou não), meus pais compraram uma casa em Guaecá, no litoral norte de SP, na década de 90, mesma praia frequentada pela família Cabianca.
Foi aí que me aproximei de verdade do Johnny. Ele até batia uma bolinha com os primos Gazire e os amigos. Mas o contrário do pai, não era tão fã assim. Na minha lembrança, a diversão sempre foi o mar. Prazer que, desde cedo, virou trabalho.
Não demorei para me apaixonar pelas ondas. E não foram poucas as vezes que "dividi o line-up" com ele.
E a primeira prancha que encomendei foi feita... justamente pelo Johnny, na Summer Birds.
Décadas passaram. Fiquei muito tempo sem vê-lo. Minha relação com o surfe passou a ser jornalística e não mais como praticante.
Já ele, se tornou um dos shapers (quem produz e molda as pranchas) mais comentados do mundo.
Só fui reencontrá-lo no comecinho de 2015, na redação da revista Hardcore, poucos dias após Gabriel Medina se tornar o primeiro brasileiro campeão mundial. O assunto, claro, era o título... e as pranchas produzidas por ele para o fenômeno de Maresias.
Johnny trabalha com pranchas há 35 anos. Com a "Cabianca Surfboards", girou o mundo... Brasil, Espanha, Havaí e EUA.
Trabalha em parceria com Medina desde 2009, acompanhando e colaborando diretamente em toda a trajetória vitoriosa.
Há 6 anos, toca a Basque Country Surf Company, em Zarautz.
Ele conversou com o @surf360_
O Gabriel Medina é um cara difícil de se trabalhar? Normalmente, qual é a maior exigência que ele faz?
Dificuldade de trabalho técnico, a gente nunca teve. Eu sempre trabalhei dois tipos de curva com ele e sempre teve bastante sucesso. A maior exigência dele... não tem. O que não pode é faltar prancha, nem pra treino, nem pra bateria. Sempre tivemos um acerto legal.
Você fica na Espanha e ele ao redor do mundo. Quanto a distância geográfica atrapalha na parceria?
Antes, quando era solteiro, eu participava muito, ia nos campeonatos. Mas a distância não atrapalha. É lógico que eu gostaria de participar mais, estar mais ao lado. Mas o Gabriel é, durante o ano, quando está em competição, muito focado. Às vezes, estar do lado até atrapalha, então, é até positivo não estar muito do lado. Não tem dado problema não.
A maioria das etapas se repetem ano a ano. Em 2022, as novidades serão G-Land (Indonésia) e El Salvador. Quando isso acontece, é preciso fazer um planejamento especial?
Existe muito... misticismo... que prancha funciona pra quê. Lógico que existem ondas muito diferentes, né. Se você pega Snapper (Snapper Rocks, em Gold Coast, na Austrália) e Teahupoo (Tahiti), são completamente diferentes. No caso de El Salvador, o que já andei estudando é que a onda é volumosa e que dá um potencial bom de repertório de manobras, então, é trabalhar um pouco em cima disso. G-Land é uma onda como Teahupoo ou Tavarua (Fiji), uma onda pra frente e intensa... então, essa daí já está resolvido. E no restante das etapas, modelos com as duas curvas que tenho trabalhado com ele, tem funcionado bem... vario só formato de borda e tamanho de prancha. Algumas vezes, altero também o volume, para adaptar melhor. Mas dentro do quiver (conjunto das pranchas usadas pelos surfistas) que ele carrega, tem uma diversidade boa, sempre acha ali 4 ou 5 pranchas que encaixam bem na situação.
Outra mudança para esta temporada foi a longa pausa de um ano para outro. O plano muda muito quando existe esse tipo de parada?
Pandemia, circuito mais curto, poucas etapas, depois volta a treinar... sempre, entre as longas distâncias, existem as pré-temporadas que ele faz. Viagens pra Costa Rica.... ou Maldivas... o trabalho dele não para. Claro que os campeonatos, ou seja, o circuito, é a expressão de todo o trabalho, né... a gente fica esperando por isso. Incomoda, é claro... não ver as competições, né. É que nem jogar futebol no campinho, se preparar pra jogar em um campeonato bom e não acontece, fica só no treininho ali do clube. O negócio é partir pra competição.
Qual é a qualidade indispensável do shaper?
Uma qualidade é a experiência. E a cabeça aberta, com soluções rápidas pra situações diversas. E, lógico, ter uma facilidade na produção. Eu tenho a minha fábrica, que me ajuda muito, além de parceiros pelo mundo que também sempre fazem. Em Santa Catarina, Austrália e Califórnia, sempre abrem as portas. Com a experiência que vai adquirindo, pode sempre estar se adaptando a qualquer tipo de situação.
Qual é a porcentagem do trabalho bem feito do shaper no desempenho do surfista? No seu caso, quanto das conquistas do Gabriel você atribui a seu trabalho?
Boa pergunta. O crescimento do atleta, lógico... pega como exemplo outros surfistas, que toda hora ou mudam de shaper ou no quiver tem vários tipos de pranchas, rabetas e tal. O Gabriel sempre foi um cara constante, até constante comigo, ele nunca mudou. Teve algumas vezes que ele competiu com JS (Jason Stevenson, australiano)... nos campeonatos do Havaí, em Pipeline, com aquela condição que passa de 17, 18 segundos a onda, exige... tem a ajuda do Tokoro (Wade Tokoro, havaiano). E no Havaí também tem aquilo... a gente faz sacolões de pranchas de até 6'4", no Havaí, ele usa 6'6"e 6'8", então, já estão as pranchas lá. Mas eu acredito que a minha participação no crescimento dele foi o que todo mundo viu, né.
Tá lá... que nem Claudinho e Buchecha, é Cabianca e Medina. Claro, podem acontecer várias coisas aí no caminho, como várias propostas foram feitas pro Gabriel, daí, ele voltou e continuou trabalhando comigo. Em campeonatos assim, direto... não sei, cara. Essa última final, no play-off em Lowers (Trestles), ele me ligou antes do campeonato, falando: "Cara, a prancha tava funcionando até hoje, hoje não tá". Eu falei: "Pô, Gabriel, você tá nervoso". Depois do campeonato, ele ligou e falou: "Funcionou bem pra caramba, cara, tudo funcionando perfeito, obrigado". Então quer dizer, sempre tem um agradecimento legal, sempre tem esse compromisso. E te falo... não existe contrato assinado, nada. Existe a amizade, eu continuo sendo o "Tio Joh"pra ele... desde que a gente se conheceu em Maresias. E... a gente continua fazendo prancha.
A temporada 2022 da World Surf League começa no sábado (29), em Pipeline. Em seguida, rola mais uma etapa no Havaí, em Sunset Beach. Depois, o tour segue pra Portugal (Peniche), Austrália (Bells Beach e Margaret River), Indonésia (G-Lad), El Salvador (Punta Roca), Brasil (Saquarema), África do Sul (Jeffreys Bay) e Tahiti (Teahupoo).
As finais estão programadas, mais uma vez, para Trestles, na Califórnia, de 8 a 16 de setembro.
por @thiago_blum / @surf360_
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