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Enquanto Brasil traga rancor de Abel, Argentina chora 'adeus' de Gallardo
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Abel Ferreira hoje é o principal técnico do futebol brasileiro? Segundo os números, sim. Com sua segunda final seguida na Libertadores, o Palmeiras chegou à sexta decisão em um único ano pela primeira vez na sua centenária história. Atual campeão da Copa do Brasil e Libertadores, o clube foi vice na Recopa Sul-Americana, na Supercopa do Brasil e no Campeonato Paulista.
Os resultados históricos, porém, ficam em segundo plano pelo comportamento do treinador e pela aceitação pública negativa desde o ataque de fúria e sua ficção digna do "homem duplicado" de José Saramago. Segundo pessoas próximas a Abel ouvidas pelo UOL Esporte, o treinador usou a personificação de um vizinho como forma de revidar o xenofobismo e as críticas recebidas.
As ponderações foram imediatas. Juca Kfouri, em seu blog aqui no UOL, foi certeiro: "Abel escancarou como o futebol brasileiro virou um ambiente tóxico".
Outro colega sensato, Julio Gomes, também mandou no alvo: "Abel não precisa xingar o vizinho no campo. Não precisa dizer que são filhos da p... [que foi o que ele fez no gramado]. Porque aí ele se rebaixa. (...) As vitórias precisam de mais amor e alegria, de menos raiva e sentimento de vingança".
"Se sou melhor treinador, devo também a Marcelo Gallardo", declarou Abel depois de ganhar a Libertadores sobre o Santos. Em um livro sobre o técnico do River Plate, ele encontrou até maneiras de golear o Corinthians por 4 a 0 em março. Ávido por conhecimento, Abel ganharia demais em saber também como o colega argentino construiu uma receptividade digna de admiração.
Mesmo destaque, outra realidade
Marcelo Gallardo hoje é o principal técnico do futebol argentino? Sim, já detalhamos em um especial. Prata da casa e das "canteras" do River Plate, ele colocou o clube como treinador em outra esfera ao ganhar duas Libertadores (2015 e 2018), uma Sul-Americana (2014) e três Recopas (2014, 2015 e 2019). Há sete anos e meio no cargo, Gallardo gera comoção rara nos "vizinhos".
Tal veneração domina as conversas sobre futebol em Buenos Aires neste começo de semana. E com um plus sentimental. Gallardo terminou a vitória de anteontem (3) sobre o Boca (uma "goleada" por 2 a 1) chorando, sozinho, enquanto esperava os jogadores, perfilados, para cumprimentá-los um por um. Sempre afeita a dramas e reações emocionais, a Argentina caiu no choro com o técnico. O motivo? Seu pranto, oras, é "sinal claro do adeus que está por vir".
"Ele tinha um ar de que queria gravar tudo para levar consigo. Olhava sua obra, como um pai contemplando o filho. O clima é de despedida e de melancolia. Há dor nas ruas", definiu Luciana Rubinska, apresentadora da ESPN. "Ver Gallardo chorando vestido de Labruna foi muito forte. Forte demais."
O jornal "Olé" publicou raciocínio semelhante: "A tarde era especial para Gallardo porque na plateia estava seu filho Benjamín. E talvez passou por sua privilegiada cabeça que este tenha sido seu último superclássico".
"Poder decir adiós es crecer"
"Poder dizer adeus é crescer", um dos refrões mais fortes do rock argentino, está na linda "Adiós", canção de Gustavo Cerati que fala sobre como os finais são, na verdade, o começo de algo ainda mais poderoso. Foi com este tema que programas esportivos e musicais nas rádios e TVs começaram ontem suas edições, farejando que o adeus de Gallardo está cada vez mais perto, sim.
O contrato de Gallardo com o River acaba em dezembro, mês das eleições presidenciais no clube. Marcelo e Rodolfo D'Onofrio, o atual todo-poderoso, têm relação praticamente umbilical, e o fato de D'Onofrio não concorrer (encerra o segundo mandato) seria a deixa para o ponto final do treinador.
Quem se manifestou a respeito nas redes sociais foi o biógrafo de Gallardo: "Muitos entendem que a gravata e a emoção de Marcelo é porque ele vai embora. Pode ser, mas tampouco creio que tenha 100% definido", postou Diego Borinsky no Twitter. "Depende de como ele se sinta no fim do ano. Há um campeonato a ganhar em plena disputa. Este é o foco. Sem pressa".
Sem tanta pressa por causa da queda massiva do WhatsApp, os bastidores do River começaram a ferver ontem com o rumor de que a saída de Gallardo já está decidida e comunicada. Pela sua relação com o clube e pela complexidade de uma decisão que dificilmente seria tomada de bate-pronto, antecipar o adeus e facilitar a reposição teria sua razão (que ninguém, claro, espere confirmações prévias).
Os mesmos que giram esta versão indicam que o destino de Gallardo será o Barcelona no começo do ano que vem. É outro raciocínio de sentido. Neste fim de semana, a TyC Sports, emissora da TV argentina, mostrou um especial de quase uma hora destrinchando a chegada de Gallardo ao River. No material, soube-se que Marcelo tinha verdadeiro fetiche pelo Barcelona de Pep Guardiola —grande inspiração para montar seu primeiro River, o de 2014.
As mesmas fontes em Núñez vão além: o substituto de Gallardo teria até o aval do próprio Marcelo. Seria o uruguaio Alexander "Cacique" Medina, amigo de Gallardo e seu atleta no Nacional do Uruguai há dez anos. Medina é o responsável pela espetacular campanha do Talleres, vice-líder do Argentino. Sintomático: o "Cacique" não dá entrevistas coletivas há mais de dois meses.
"Passo a passo", como prega o tango. Hernán Crespo, ao contrário do que circula no Brasil, não é tido em conta nesta sucessão com ares de conclave.
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