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Tales Torraga

REPORTAGEM

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Hoje relegados, técnicos brasileiros já dominaram o futebol argentino

Colunista do UOL

21/02/2022 04h00

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A Supercopa do Brasil terminou ontem (20) com o título de um técnico argentino — Antonio "El Turco" Mohamed, do Atlético-MG, que bateu o português Paulo Sousa, do Flamengo.

A ausência de treinadores brasileiros na decisão que reúne a elite do futebol nacional é sintomática. Mas ao contrário de hoje, houve um tempo em que os técnicos nascidos no país mais do que não davam chances aos estrangeiros, e sim dominavam um complicado território vizinho — a Argentina que se gaba de ter uma das melhores escolas de treinadores de todo o mundo.

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Oswaldo Brandão é carregado ao ser campeão pelo Independiente
Imagem: Reprodução web

Poucos no Brasil sabem, mas os portenhos acima dos 60 anos conhecem em detalhes a saga de Oswaldo Brandão em Buenos Aires. O blog "Patadas y Gambetas", daqui do UOL Esporte, resgatou em 2017 o périplo argentino de Brandão, até hoje conhecido por lá como "El Maestro".

Título maiúsculo

O técnico que marcou história no Corinthians, Palmeiras e seleção brasileira alcançou, de fato, um triunfo maiúsculo. Foi campeão argentino pelo Independiente em 1967 com um aproveitamento de 87% dos pontos — ainda hoje um dos melhores da história no país vizinho.

''Oswaldo é um dos grandes ídolos da nossa história e um dos melhores técnicos que passaram por Avellaneda, seguro'', afirmou Antonio Lasarte, historiador que então cuidava do memorial do Independiente, ao "Patadas y Gambetas".

''É claro que a equipe ganhou Libertadores, Intercontinentais, Mundial, tudo. O Independiente é o Rei de Copas, mas este título do Brandão em 1967 foi muito especial. Todos na Argentina sabem muito bem.''

O desfecho foi ainda mais espetacular que a própria campanha. O Independiente ganhou o campeonato com um 4 a 0 sobre o rival Racing, que acabara de conquistar Libertadores e Mundial. Vem daí a adoração por Brandão.

''Era uma pessoa especial, de um trato muito fino, vivia elogiando os argentinos. Falava muito bem do time, dos adversários. Brandão foi um cavalheiro [tinha 51 anos à epoca]. É claro que nossas Libertadores tiveram sim a participação dele como alguém que projetou aquilo. Se seguisse aqui, seria ele, Oswaldo, o condutor de tantas Copas que erguemos naqueles tempos'', conclui o historiador.

Um jogador argentino comandado por Brandão é mais sucinto: ''Foi o melhor treinador que tive'', cravou o goleador do Independiente em 1967, Luis Artime — um enorme craque que ainda brilharia pelo Palmeiras logo a seguir.

Brandão teve muitas ofertas para seguir na Argentina. O Independiente, claro, fez de tudo para ele ficar. Outra proposta veio do Boca, mas Brandão começou 1968 como supervisor da seleção brasileira. Depois, treinou o Corinthians.

No ano seguinte, mais brasileiro campeão

"El Maestro" Oswaldo deixou a Argentina, mas indicou o sucessor a um time que o procurou. E deu muito certo. Em 1968, Elba de Pádua Lima, o "Tim", levou o San Lorenzo ao título argentino sem perder um jogo sequer.

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Tim na campanha do titulo do San Lorenzo em 1968
Imagem: Reprodução San Lorenzo/Twitter

Tal conquista é igualmente famosa na Argentina, cujo campeonato é duro de ser conquistado de maneira invicta até hoje. "Sua grande façanha foi ter entendido seus jogadores e respeitado suas manias. A condução de elenco foi exemplar. Os atletas mantinham até as suas vidas noturnas. Muitos deles eram viciados em jogatinas e turfe. Mas na hora de entrar em campo, retribuíam a confiança do técnico e rendiam", contou o então goleiro Buttice à revista "El Gráfico" no aniversário de 30 anos daquela conquista.

(Sim, o mesmo Buttice que anos depois defenderia o Corinthians.)

Brandão e Tim são, ainda hoje, os únicos técnicos brasileiros a ganhar o complicadíssimo Campeonato Argentino. O último treinador nascido no Brasil a comandar o Boca Juniors foi Dino Sani, em 1984. A distância para o último antecedente no River Plate é ainda maior: 1972, com Didi (sem considerar o interino Delém).