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Tales Torraga

REPORTAGEM

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'Gagoneta': Como o Racing de Fernando Gago virou sensação na Argentina

Técnico Fernando Gago, do Racing - Divulgação Racing
Técnico Fernando Gago, do Racing Imagem: Divulgação Racing

Colunista do UOL

15/03/2022 08h31

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No superlotado Monumental de Núñez, o Racing comandado por Fernando Gago perdia por 2 a 0 para o River Plate e buscou o 2 a 2 há duas semanas. Como dizem os argentinos, desde então houve o "click".

A "Academia", como é chamada a tradicional equipe de Avellaneda, deslanchou no Campeonato Argentino (versão Copa da Liga Profissional). Bateu o Talleres por 1 a 0 em casa e ontem (14) aniquilou o Atlético Tucumán como visitante com um estrondoso 4 a 0.

O Racing está invicto e agora é o quarto colocado em seu grupo — com três vitórias e três empates —, mas o que chama a atenção é a qualidade do seu futebol agressivo. Como costuma ocorrer no país sempre que um time se destaca, já há até um criativo trocadilho repetido inclusive pelas torcidas rivais: a Argentina está vendo a "Gagoneta", paródia da ainda mais famosa "Scaloneta", como é chamada a seleção de Lionel Scaloni.

(Explicamos: a "Gagoneta" e "Scaloneta" seriam uma espécie de veículo improvisado — kombi ou van — com todos andando felizes e chegando surpreendentemente bem ao destino.)

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Time do Racing perfilado para enfrentar o Atlético Tucumán
Imagem: Divulgação Racing

Técnico jovem e futebol moderno

O Racing contratou o habilidoso meia colombiano Edwin Cardona (ex-Boca) como reforço principal nesta temporada, mas Gago tampouco tem contado com ele, que não para de se machucar. O time atuou nesta segunda-feira em um compacto 4-3-3, com um ataque poderoso e valente formado por Chancalay, Copetti e Hauche, que destroem o adversário desde a defesa.

Esta é uma das premissas da "Gagoneta": "comer cru" o rival em todos os setores do campo, para regozijo do técnico que é, de longe, o mais bem vestido do país. Muitos dizem que ele parece estar a caminho de um desfile de moda, tamanho o esmero da cor e do corte de seus ternos sempre impecáveis. O traje faz jus ao apelido de "Pintita" (o "Pintinha"), pelos trejeitos de galã portenho.

O trio ofensivo comandado por Gago agride tanto que abre oportunidade para os gols dos demais: contra o Tucumán, por exemplo, os quatro tentos foram marcados por jogadores de outras posições, como o lateral Mura e os meio-campistas Alcaraz, Lolo Miranda e Mauricio Martínez.

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Jonathan Gómez, do Racing
Imagem: Divulgação Racing

Quem integra o grupo do Racing é o ex-são-paulino Jonathan Gómez, que ontem entrou no segundo tempo. E a fase da equipe é tão boa que Gago se dá ao luxo de deixar no banco até medalhões como o zagueiro Orban e o lateral Pillud.

O Racing dissimula seu favoritismo tanto no campeonato nacional quando no grande objetivo deste ano: a Copa Sul-Americana na qual está também o rival Independiente. Os gigantes de Avellaneda são dois dos quatro representantes da Argentina na competição. Os outros quatro são: Banfield, Defensa y Justicia, Lanús e Unión.

Apenas 35 anos

O que dá o que falar na Argentina também é a precocidade de Fernando Gago. Ele tem só 35 anos e um conhecido currículo de peso como jogador. Volante de classe de Boca, Real, Roma, Vélez, Valencia e dez anos de seleção argentina, pendurou as chuteiras em novembro de 2020 depois de intermináveis lesões. Semanas depois de parar de jogar, estreou como técnico no nanico Aldosivi, da cidade de Mar del Plata. O time era fraco e Gago pediu demissão após nove meses, mas chamou a atenção de um grande do país como o Racing, que anunciou sua contratação poucos dias depois.

É raro encontrar um técnico tão jovem e tão brilhante como jogador. O último argentino a abraçar a prancheta tão jovem assim foi justamente o badalado Marcelo Gallardo, aos 35 (e também muitas lesões), em 2011, no Nacional do Uruguai. O zagueiro Thiago Silva, por exemplo, está com 37 anos.

O bom momento de Gago como técnico causa reflexão também pela ausência de exemplos brasileiros com sua trajetória.

Como os argentinos costumam brincar, o Brasil "pode ser a terra dos jogadores, mas a Argentina é o país dos técnicos de futebol". De fato, o interesse do país vizinho em seguir a carreira é incomparavelmente maior. E sem falar no gosto por aventuras. Gago, por exemplo, deixou para trás a vida de luxo vivida em Roma, Madri e Buenos Aires sem pensar duas vezes antes de enfrentar o calor de janeiro na modesta sede do Aldosivi, clube no qual estreou na nova profissão.

E ele cai no gosto do torcedor do Racing por outro fator ligado à juventude: para o tradicional clube de Avellaneda, há a mística de sucesso com treinadores jovens. Foi assim com Diego Cocca, Eduardo Coudet e Sebastián Beccacece, os últimos técnicos que brilharam na equipe. O exemplo contrário seria o experiente Juan Antonio Pizzi, de pobre passado recente pela "Academia", incluindo a surra por 5 a 0 do River Plate na final da Supercopa Argentina do ano passado.

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Fernando Gago, técnico do Racing, da Argentina
Imagem: Divulgação Racing

Como anda o Campeonato Argentino

O Campeonato Argentino (versão Copa da Liga Profissional) está em sua sexta jornada de um total de 14 rodadas desta fase de grupos. Os 28 times são divididos em duas chaves de 14 equipes — o jogo a mais é a "rodada dos clássicos", a única com confronto entre equipes de grupos diferentes, exatamente neste final de semana.

No Grupo A, os quatro primeiros que hoje se classificariam para as quartas de final seriam, pela ordem: River Plate, Defensa y Justicia, Unión e Racing. No B, Estudiantes, Colón, Boca Juniors e Tigre.

E se da "Academia" se trata, a próxima rodada perfila o explosivo Independiente x Racing para o Estádio Ricardo Bochini (antigo Libertadores da América) para as 20h45 (de Brasília) de sábado (19).