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Foi o último jogo de Messi na Argentina? Como a Bombonera se despediu dele
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Com Matías Navarro e Ezequiel Galeno, da Bombonera
Os pesados portões da Bombonera se abriram às 17h30, três horas antes do jogo, com grande movimento já neste horário. Muito temor e muita desconfiança com ingressos falsos, uma repetição do que já foi visto no Monumental de Núñez. Anteontem (24) foi feriado na Argentina e muitos emendaram a sexta-feira de descanso. É por isso também que há tanta gente. Parece um jogo do Boca. Por tanta gente tantas horas antes do começo, não pelo perfil do público, bem diferente do que se vê no Campeonato Argentino.
O jogo da seleção contra a Venezuela foi transmitido também pela TV Pública, que insistiu todo o tempo nos tributos e nas homenagens a Lionel Messi. Não há nenhum jogo previsto para a Argentina em território nacional antes da Copa do Mundo do Qatar. O Mundial será o quinto e, em tese, o último de Messi, que já beira os 35 anos.
A associação é inevitável: estamos então diante do último jogo de Messi na Argentina com a camisa da seleção? Um saudosismo silencioso invade as ruas da "República de La Boca", como o bairro da zona sul de Buenos Aires é tratado nesta sexta.
Há famílias inteiras, e muitas crianças. Muitas mesmo. Parece uma matinê do futebol. Há rojões, há fumaça e há sinalizadores nas arquibancadas que estão lotadas — 48.000 ingressos foram colocados à venda. Duraram cinco horas. Ao todo, 150.000 pessoas marcaram presença na fila virtual. A entrada mais barata era de R$ 170 (3.900 pesos).
De Passarella a Messi
A histeria por Messi invade até o hino da Venezuela. Em vez de silêncio, o tradicional cântico "Vení, vení / Cantá conmigo / Que un amigo vas a encontrar / Que de la mano / De Leo Messi / Todos la vuelta, vamos a dar".
(Algo como um "Chega aí / Canta comigo / Que um amigo vai encontrar / Pela mão / De Leo Messi / Todos vamos dar a volta olímpica").
Esse cântico nasceu na Copa de 1978, e o Messi de então era Daniel Passarella, alguém lembra na arquibancada, que fica em silêncio logo depois da emocionante entonação do hino nacional e o "Al gran pueblo argentino, salud".
É quase um amistoso, um jogo de festa. Mero encontro para azeitar a máquina e respeitar José Pekérman, técnico da Venezuela e histórico comandante da Argentina. A generosidade é tamanha que até Armani, goleiro do River Plate, é aplaudido pelo setor onde fica a Doce, a "barra brava" do Boca.
O jogo não empolga. A Argentina custa a chutar. Messi é escalado como substituto de Lautaro Martínez na função de centroavante. Discreto demais. Mesmo toda a devoção e toda presença infantil não evitam que a Bombonera por vezes fique em silêncio, como se fosse um teatro, não um estádio.
O primeiro grito chega aos 35 minutos, gol de Nico González. Messi é recuado, atua mais perto de De Paul na armação. Depois da abertura do placar, nova calmaria. Apenas um ou outro aplauso. A Argentina está invicta há 30 jogos, mas os primeiros 30 minutos são tão chatos que não empolgam nem a "melhor torcida do mundo", como estampa a AFA nas suas contas de redes sociais.
"Reclamar do quê? Da Argentina? Pensa no que a Itália daria para estar no nosso lugar. Ou Portugal. Ou o Chile?! O Chile!", dois adultos discutem aqui do lado no intervalo, no alto da arquibancada, quase no meio de campo.
Faz frio, o celular mostra 16 graus, a sensação perto do rio Riachuelo é de mais frio ainda. Uma garoa salpica a Bombonera e mantém a torcida acanhada, a famosa "chuva débil" tão repetida entre os portenhos.
Nada mais argentino
O segundo tempo tampouco empolga mais. Uma cobrança de falta de Messi chega a levantar a torcida, mas não há competição — o sabor de amistoso prevalece, a arquibancada não está em clima de festa. A Argentina toca de lado e deixa o tempo passar.
Há certa melancolia no ar, como se os anos de hostilidade argentina a Messi agora significassem uma timidez, uma reverência silenciosa. Buenos Aires é melancólica por si só, um tango em forma de ruas e praças - e nesta noite também de estádio. Paixão, amor e desejo. Jamais alegria desmedida, o famoso "carnaval carioca".
Um ou outro grito de "Meeessi", principalmente nas faltas, mas o relógio avança e a noite chega. Di María entra, há ovações especiais a ele, mas a Venezuela se tranca atrás e começa a bater, a Argentina não faz muito para furar o bloqueio, mas sai o 2 a 0 com o próprio Di María, e a torcida ensaia um tímido "olé!".
Quando tudo parecia uma mera questão de fechar a persiana, eis o gol de Messi, o do 3 a 0, para uma nova explosão do cântico de 1978 e de aplausos a De Paul, um verdadeiro monstro no meio, uma mistura de Simeone e Verón.
Há momentos de euforia, os minutos finais são os melhores, tanto de jogo quanto de ambiente, a melancolia dá lugar à histeria.
Nada mais argentino.
O jogo termina e o capitão sai de campo muito aplaudido. Há uma ou outra imagem no telão de criança chorando e cantando nas tribunas.
"Se tem aquela música que canta que vimos Maradona, agora podemos dizer que vimos também Messi?", brinca um pequeno de não mais de nove anos.
Vimos, pequeno. Fica a dúvida se veremos de novo. E dói só de pensar. Tantas e tantas vezes pedimos Messi fora da seleção. Agora que está perto mesmo de sair, dói.
Nada mais argentino.
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