Topo

Tales Torraga

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

O dia em que 'Loco' Bielsa quase foi assassinado às vésperas da Copa

Marcelo Bielsa no comando do Leeds United - @LUFC/Twitter
Marcelo Bielsa no comando do Leeds United Imagem: @LUFC/Twitter

Colunista do UOL

29/10/2022 08h31

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Houve um tempo em que parecia ser necessária uma dose de loucura para treinar a seleção argentina. A lista de nomes - hoje - assusta. Mas o país se acostumou com as mais diversas esquisitices entre 1983 e 2004, quando a azul e branca foi comandada por Carlos Bilardo, Alfio "Coco" Basile, Daniel Passarella e Marcelo, "El Loco", Bielsa.

Bilardo nega até hoje, mas entrou para a história pela ''água batizada'' dada a Branco na Copa de 1990. Basile bebia e fumava com os jogadores abertamente, e Passarella chegou para pôr ordem no pedaço com seu famoso autoritarismo: proibiu homossexuais, brincos, tiaras e cabelos compridos na seleção.

E para consertar as bizarrices de Passarella, a Argentina escalou ninguém menos que Bielsa, que já rendeu muitos livros sobre seus inúmeros causos.

Uma dessas situações inusitadas foi contada ao blog "Patadas y Gambetas", aqui do UOL Esporte, em 2018, por Pablo Cavallero, goleiro da Argentina na Copa de 2002.

Cavallero está com 48 anos e trabalha como diretor de futebol no Independiente (exerceu a função também no Vélez).
Ele conviveu com Bielsa como poucos. Seu relato é imperdível:

''Bielsa era um técnico muito intenso. Ele tinha argumento para tudo, sabia de tudo, era uma enciclopédia ambulante. Mas cansava demais."

"A preparação para a Copa de 2002 foi assim: cansativa. Bielsa pensava em futebol 24 horas por dia. A gente dormia e ele não conseguia dormir, e uma forma de Marcelo relaxar passou a ser caminhar e correr ao redor da concentração. Estávamos em Ezeiza [perto do aeroporto internacional de Buenos Aires], em uma área com muita natureza, com muitas árvores."

"Estava escuro, e o prédio de Ezeiza, claro, tinha muita segurança, muitos carros de polícia, aquilo que é perfeitamente possível imaginar em uma situação assim. Era um dos primeiros dias em que Marcelo havia começado a correr e andar. Ele fazia isso sempre com fones de ouvido, sempre escutando palestras ou preleções de futebol."

"Mas a polícia, claro, estranhou ver alguém no meio das árvores de madrugada. Falavam com ele, e ele não escutava porque estava com os fones. Quando os policiais chegaram para atirar, jogando a luz na cara dele, Marcelo correu para trás de uma árvore, gritando 'por favor, sou o Bielsa, não disparem'."

"No dia seguinte, demos risada. Mas vendo hoje, por pouco não perdemos o técnico às vésperas de uma Copa do Mundo por uma tragédia impensada. Que loucura.''

A Argentina terminou a Eliminatória de 2001 com a então melhor campanha da história - 12 pontos de vantagem para o segundo colocado (o Equador) e 13 a mais que o Brasil.

Mas Batistuta, Simeone, Ortega, Crespo, Gallardo (Zanetti, Sorín...) e companhia foram eliminados ainda na primeira fase da Copa do Mundo do ano seguinte, ganhando da Nigéria, perdendo para a Inglaterra e empatando com a Suécia.

Fora da Copa ainda na primeira fase. Que loucura.