Topo

Tales Torraga

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Ex-árbitro chileno diz que time argentino tentou suborná-lo na Libertadores

Chileno Carlos Chandía foi árbitro da Fifa entre 2003 e 2009 - Reprodução web
Chileno Carlos Chandía foi árbitro da Fifa entre 2003 e 2009 Imagem: Reprodução web

Colunista do UOL

15/02/2023 08h20

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Árbitro da Fifa entre 2003 e 2009, o chileno Carlos Chandía declarou ontem (14) à Rádio Futuro, de seu país, que o San Lorenzo tentou suborná-lo na Libertadores da América de 2009, contra o Libertad, do Paraguai.

"Chegaram dois homens a Concepción [cidade chilena] e me disseram: 'queremos falar com você'", afirmou Chandía, que não identificou as pessoas em seu relato.

"Falei a um amigo para me acompanhar, porque não entendia nada. Fui ao aeroporto de Concepción, e essas pessoas pediram para ir a um banco e trocar dólares. Fomos comer, quando me disseram: 'Olha, Tinelli [Marcelo, empresário argentino], o único que quer, é ser campeão."

"Segui escutando, saímos com o carro e fui deixá-los no aeroporto. E eu disse: 'O único que posso falar é que vocês erraram de pessoa. Falem para esse Tinelli que ele nem pense nisso."

"Falei: 'Posso pedir um favor? Digam ao Tinelli que se ele aparecer no vestiário, vou dar um chute na bunda que ele não vai esquecer nunca mais. Vão embora, e espero que cheguem bem às suas casas."

"Isso foi tudo o que disse. Estavam nervosos, nem te digo", seguiu contando Chandía, que hoje tem 58 anos e é prefeito da cidade de Coihueco, onde nasceu.

"Quando cheguei ao estádio, olhei por todos os lados, para ver se Tinelli estava por lá. Não apareceu. Os paraguaios ganharam por 2 a 0. Não sabem a tranquilidade que tive. Ganharam bem. O único que queria era que terminasse bem, sem nenhum escândalo. Se eu visse Tinelli por ali, o mandaria à merda", finalizou o ex-árbitro.

A partida descrita por Chandía foi disputada em 5 de março de 2009, na cidade de Luque, no Paraguai, pela terceira rodada da fase de grupos. O Libertad vencia por 2 a 0 já aos 37 minutos do primeiro tempo. Foram mostrados quatro cartões amarelos e nenhum vermelho.

O Libertad passou para as oitavas de final como o primeiro do seu grupo, enquanto o San Lorenzo, eliminado, terminou na lanterninha.

Chandía seria o árbitro da finalíssima da Libertadores daquele ano, com o Estudiantes campeão em cima do Cruzeiro, no Mineirão.

O chileno comandou outras duas finais de Libertadores, em 2004 (Once Caldas campeão em cima do Boca Juniors) e 2008 (LDU 4 a 2 no Fluminense, jogo de ida daquela decisão).

tin - CASLA Twitter - CASLA Twitter
Marcelo Tinelli, empresário argentino e ex-presidente do San Lorenzo
Imagem: CASLA Twitter

O outro lado

O jornal argentino "Olé" de hoje (15) traz a versão de Marcelo Tinelli a respeito das declarações do ex-árbitro chileno.

"É um delírio. Pouco sério", disse o ex-presidente do San Lorenzo ao diário. Assessores seus acrescentaram ao jornal: "Em 2009, Marcelo não era dirigente, ele nunca viu esse Chandía. A verdade é que cômico, tragicômico, o que disse esse senhor [Chandía]".

Em 2009, o presidente do San Lorenzo era Rafael Savino.

Tinelli, que seria um histórico mandatário do clube nos anos seguintes, fazia parte então de um grupo de investidores que buscava contratações e encabeçava a área de marketing do clube, mas em 2009 não tinha cargo oficial no San Lorenzo, famoso em todo o mundo por ter o papa Francisco como seu torcedor símbolo.

ama - GettyImages - GettyImages
Juiz Carlos Amarilla
Imagem: GettyImages

Histórico de suspeitas

A entrevista de Chandía é um novo capítulo das desconfianças de manipulações envolvendo argentinos na Libertadores.

Em 2005, uma escuta telefônica divulgada pelo jornal "La República", de Montevidéu, reforçou a suspeita de que o River Plate subornou o árbitro uruguaio Gustavo Mendez.

O jornal revelava conversa em que o empresário Jorge Chiane admitia ter recebido US$ 20 mil (então cerca de R$ 45,6 mil) do time argentino, em Buenos Aires, para repassar a Mendez, que era vice-presidente e gerente-geral de uma empresa da qual era um dos sócios.

O pagamento seria para Mendez favorecer o time argentino na primeira partida das semifinais da Libertadores, contra o São Paulo. A equipe brasileira venceu o jogo, no Morumbi, por 2 a 0.

Em 2015, conversas exibidas pelo programa "La Cornisa", da TV America, da Argentina, levantava suspeitas sobre a arbitragem de Carlos Amarilla a favor do Boca Juniors contra o Corinthians em 2013.

O diálogo em questão envolvia Julio Grondona, então presidente da AFA (Associação de Futebol Argentino), morto em 2014, e Abel Gnecco, representante argentino no comitê de árbitros da Conmebol, e se dava em 17 de maio de 2013, dois dias depois de o Boca eliminar o Corinthians no Pacaembu.

Na conversa gravada, Gnecco relatava como havia sido a decisão pela escolha do juiz paraguaio. Ele conta que o acordo foi feito com Carlos Alarcón, representante paraguaio na Comissão de Árbitros da Conmebol que teria ligado para lhe oferecer Amarilla para apitar o duelo válido pela Libertadores.

A conversa era uma das 11 reveladas pelo programa de TV, que teve acesso às escutas usadas em uma investigação que começou em 2012 e teria investigado desde a sonegação de impostos em negociações de jogadores a manipulações no futebol.

Em 2017, um novo áudio foi vazado, revelando uma conversa entre o então presidente do Boca, Daniel Angelici, e Luis Segura, mandatário da AFA, em janeiro de 2015.

''Sou o torcedor número um do Boca. Vou me ocupar disso'', dizia o presidente da AFA na escuta levada ao ar pelo TyC Sports, canal de TV especializado em esportes na Argentina.

O acerto em questão era para um Boca x Vélez Sarsfield que decidiria o último representante argentino naquela Libertadores.

O Boca venceu o Vélez por 1 a 0, gol de Colazo, e o árbitro expulsou dois jogadores do Vélez, Grillo e Somoza.