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Tales Torraga

REPORTAGEM

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Livro de Sampaoli antecipou 'loucuras' vistas hoje no Flamengo

Capa de "Mis Latidos", livro publicado por Jorge Sampaoli em 2018 - Reprodução
Capa de 'Mis Latidos', livro publicado por Jorge Sampaoli em 2018 Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

15/05/2023 09h55

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Cinco alterações no intervalo, goleiro que sai jogando, muito ataque e pouca defesa.

A torcida do Flamengo está conhecendo na prática as "loucuras" de Jorge Sampaoli, mas a teoria foi registrada há um bom tempo.

Tanto é assim que até um polêmico livro com o "jeito Sampaoli de ser" foi publicado na Argentina em 2018, ano em que o elétrico treinador se preparava para tentar levar sua seleção ao tri.

(Não conseguiu, mas sejamos justos: ao menos ele teve o mérito de dar rodagem ao ajudante Lionel Scaloni, técnico que tanto surpreendeu ao ganhar o Mundial do Qatar em 2022.)

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O técnico argentino Jorge Sampaoli, do Flamengo, na partida contra o Ñublense, pela Libertadores
Imagem: Sergio Moraes/Reuters

'Minhas batidas'

O gênero não é tão simples de classificar. É mais fácil tratá-lo como um ensaio organizado por Sampaoli para expor suas reflexões sobre um tema específico (o futebol), tendo como pano de fundo o rock e a política —mais precisamente o ex-presidente argentino Juan Domingo Perón, de quem o treinador do Flamengo é praticamente um devoto.

O livro tem 192 páginas e foi publicado em março de 2018 pela Planeta, a maior editora da Argentina. Chamado de ''Mis Latidos'' ("Minhas Batidas"), a obra usa o nome de uma famosa música do grupo de rock Don Osvaldo. Sampaoli é amigo de longa data do vocalista do grupo, Pato Fontanet.

''Eu não planejo nada. Tudo surge na minha cabeça quando tem que surgir. Brota naturalmente no momento oportuno. Odeio o planejamento'', registrou o treinador, mostrando que improvisos são, de fato, a sua maneira de viver.

Sampaoli se mostra como uma pessoa 1000% intuitiva e 0% capaz de estudar e se planejar, o que surpreende por ele ser um técnico argentino, país que preza demais pelo conhecimento e pelo estudo —e que se orgulha demais disso.

Seu livro na época da publicação gerou muita polêmica por Sampaoli registrar tais conceitos depois de convencer a AFA (Associação de Futebol Argentino) a gastar milhões na atualização de tecnologia para estudar dados.

''Se eu planejo, me ponho no lugar de quem trabalha no escritório. Sou o mesmo de 1991. O futebol não se estuda: se vive e se sente. Parto disso. Eu sou da rua: negar isso é impossível. É estranho que tenham me colocado a etiqueta de uma pessoa que planeja.''

O sincericídio de Sampaoli é profundo:

''Talvez minhas conversas soem como a de uma pessoa super estudiosa. Nunca fui estudioso. Nem na escola, nem na faculdade, nem no curso de treinador. Eu não posso ler um livro. Viro duas páginas e já fico entediado. Escrevo três coisas em um papel e me canso'', destaca outro trecho.

(Seria Sampaoli a versão argentina de Renato Gaúcho, que ''não precisa estudar''?)

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O técnico Jorge Sampaoli acena para a torcida após a vitória do Flamengo sobre o Ñublense, pela Libertadores
Imagem: Thiago Ribeiro/AGIF

Capacidade de comover

''Mis Latidos'' revela também o que mexe com Sampaoli.

''Vejo discursos de Perón e aprendo o que pode gerar um condutor, um líder. Há um dom que deve ter alguém que ocupa este tipo de lugar - a capacidade de comover. Alguém precisa se comover antes de comover o outro''.

O livro está repleto de trechos de músicas de bandas argentinas de rock como Callejeros, La Renga e Los Redondos. E há também uma inusitada análise sobre a final da Copa do Mundo de 2014.

''A Alemanha não ganhou porque foi melhor que a Argentina. Ganhou porque foi mais fria. Se o futebol for assim, saio dele. Não me sinto parte. Vou tentar brigar da minha maneira.''

O ensaio tem também muitos trechos do famoso discurso de ''soberania argentina'', uma mania de grandeza que não encontrava eco nos gramados —afinal, a seleção não ganhava nada havia exatos 25 anos quando o livro foi publicado.

''Da Argentina saíram os melhores do mundo: Di Stéfano, Sívori, Maradona, Messi, Kempes e outros como Bochini, Alonso e Madurga. Os dedos das mãos não dão conta. As raízes argentinas não se comparam a nenhum outro país. Os melhores jogadores de criação e do terço final de campo da história são argentinos.''

''O desafio é impor esta superioridade com base na essência que permite que o futebol argentino seja muito respeitado na história. A Argentina esteve no topo mundial graças aos jogadores que fizeram isso possível. Não é só ganhar a Copa do Mundo e não é só o festejo de uma noite. É o respeito do rival.''

Eis a chave para entender o que Sampaoli quer hoje com o Flamengo. Resta saber se ele terá tempo e nervos para alcançar.