Topo

Tinga

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Alex foi humilde ao escolher o sub-20 do São Paulo e vai deslanchar

Alex, técnico da equipe sub-20 do São Paulo - Rubens Chiri/saopaulofc.net
Alex, técnico da equipe sub-20 do São Paulo Imagem: Rubens Chiri/saopaulofc.net

30/07/2021 04h00

Sete vitórias e apenas um empate colocam o São Paulo, de forma invicta, na liderança do Campeonato Brasileiro sub-20. Se a situação da equipe profissional é instável, o momento da gurizada de Cotia é quase perfeito. Por trás desta ótima campanha está um conhecido da torcida brasileira: o ex-meia Alex, que assumiu o comando do sub-20 do Tricolor em abril.

Apesar da pequena diferença de idade — tenho 43 anos e ele completa 44 em setembro —, pouco joguei ao lado do Alex, as oportunidades escassas ocorreram nas Eliminatórias à Copa do Mundo de 2002. Quando estava no Borussia Dortmund, o nosso diretor até tentou trazê-lo, mas o Fenerbahçe não deixou. Nossos encontros nos gramados foram mais em times opostos, quando ele e eu atuávamos por clubes do Brasil antes destas janelas que nos levaram para a Europa.

Tenho muita admiração, inspiração e respeito por este camisa 10 nato, craque de última prateleira, daqueles que olhamos debaixo para cima. Sempre que paro para ouvir o Alex falar sobre futebol fico entusiasmado devido ao seu olhar macro ao esporte.

Além disto, ele se preocupa com o lado social. Já fizemos alguns trabalhos de assistências aos necessitados. Há uns dois, ele enviou para Porto Alegre inúmeros conjuntos de materiais esportivos para ajudar jovens carentes que praticam tênis. Mesmo à distância, tento trocar ideias com o Alex.

Falar sobre o seu tempo de jogador até torna-se redundante, pois é um cara sempre elogiado e lembrado, com méritos, pelos seus feitos. Gostava muito de vê-lo jogar pelo talento, com assistências precisas e ações rápidas tomadas em frações de segundos.

Alex foi homenageado pelo Fenerbahçe com uma estátua localizada em frente ao estádio do clube, em Istambul - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Alex foi homenageado pelo Fenerbahçe com uma estátua localizada em frente ao estádio do clube, em Istambul
Imagem: Arquivo pessoal

O Alex foi protagonista por todos os clubes por onde passou: na conquista da tríplice coroa do Cruzeiro, em 2003 (Brasileirão, Copa do Brasil e do Mineiro); no triunfo do Palmeiras na Libertadores de 1999; no início e fim da carreira pelo Coritiba; e nos times que defendeu pela Europa, sendo homenageado, inclusive, com uma estátua em frente ao estádio do Fenerbahçe, da Turquia.

O fato de uma mente privilegiada, uma visão de jogo rara e de ser líder por onde passou (inclusive ostentando a faixa de capitão) já o credenciava para um dia comandar algum time na beirada do gramado. Para isso, fez cursos da Universidade de Futebol, da CBF (Licenças A e B) e estagiou em alguns clubes, além de ter atuado como comentarista por anos nos canais ESPN.

Ele se aposentou como jogador sabendo o que queria, e isto é muito importante na nossa carreira. Planejou todos os seus passos para implementar no que acredita nesta nova função. Me chamou atenção, de forma positiva, o fato de ele começar debaixo, sem queimar etapas, sem usar fama de medalhão para subir degraus apenas pelo nome. Esta semana o questionei como foi ter tomado esta decisão, este autocontrole e escolher um clube que nunca havia defendido — bastava ele ter erguido a mão que o Palmeiras, Cruzeiro, Coritiba e até Fenerbahçe teriam aberto as portas para ele.

"Eu anunciei que gostaria de ser treinador em novembro do ano passado. De início, me imaginava começando em algum time de Série C ou Série B. Não me imaginava dirigindo times de base. Aí, conversei com alguns clubes e percebi que eles não tinham ideia de nada, não tinham processos, não tinham planos. Queriam apenas passar as semanas, de preferência ganhando. Caso não fosse assim, descartariam o treinador, no caso eu (risos). Já estava pensando em protelar mais uns meses quando o Muricy Ramalho [coordenador de futebol do São Paulo] me ligou e fez o convite. Após nosso papo, decidi tomar essa direção e estou feliz com a decisão", me contou o Alex.

Sigo essa linha de raciocínio. Sempre que um jogador que está prestes a se aposentar ou que já tenha parado vem conversar comigo sobre seguir futuramente no futebol, indico começar debaixo, humildemente. Se eu fosse trilhar este caminho, começaria pela base. São vários pequenos problemas todos os dias, e isto te dá bagagem, caleja para percalços maiores que estarão por vir.

Auxiliar vem do futsal

Alex tem como auxiliar um profissional renomado e experiente no futsal. PC Oliveira foi campeão mundial pela seleção brasileira em 2008. Também é de se aplaudir a coragem do PC, que deixou uma carreira vitoriosa nas quadras do salão para migrar para o campo há cerca de quatro anos, quando aceitou o convite para comandar o futebol de campo da Ferroviária.

Alex passa instruções para os garotos do São Paulo - Rubens Chiri/saopaulofc.net - Rubens Chiri/saopaulofc.net
Alex passa instruções aos jovens atletas durante treino do sub-20 do São Paulo
Imagem: Rubens Chiri/saopaulofc.net

Fiquei muito feliz de ver este encontro. A formação no futsal é muito importante para a gurizada que almeja se destacar no campo. Temos inúmeros exemplos de craques brasileiros que começaram com a bola pequena, como Ronaldinho Gaúcho, Ronaldo Fenômeno, Neymar e a Rainha Marta, entre outros.

"É uma aula diária [convívio com o PC]. Não apenas pelo futsal, no qual ele é uma lenda, mas também pela relação dele com futebol. É um ex-jogador, é professor e tem metodologia. Tudo que eu não tinha. Nossos papos eram maravilhosos e agora trabalhar com ele no dia a dia é de uma riqueza de aprendizado enorme. Então, a experiência de vida dele, pessoal e esportiva, tem o caminho aberto para me pontuar. Ele é auxiliar do clube e meu treinador. Assim, trabalhamos no dia a dia. É super prazeroso o trabalho porque estamos conseguindo desenhar, treinar e levar ao jogo. Belíssimo aprendizado", me revelou o Alex.

Esta talvez seja a grande oportunidade para mudar o quadro do futebol brasileiro e ter como referência aos jogadores da base craques como o Alex. A gurizada dos times inferiores precisa olhar para o treinador com um ídolo, admirá-lo por tudo o que alcançou no passado e por tudo que ainda almeja alcançar no futuro, sem que haja um conformismo. O Alex é um espelho perfeito para estes jovens, pois sabem que ele fez em campo tudo aquilo, e até mais, que pede ao grupo durante os treinos e jogos.

Acredito que daqui poucos anos iremos presenciar o Alex à frente do time profissional de um grande clube do Brasil ou no sub-20, sub-23 da seleção brasileira.