Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Como a lesão de Chris Paul reacendeu o campeão Lakers na NBA
Nenhum time com mando de quadra na primeira rodada dos playoffs tinha pela frente um desafio maior do que o Phoenix Suns, que pegou logo de cara o campeão Los Angeles Lakers. Mas, pela sua postura quando entraram em quadra no primeiro jogo da série, você nunca diria que era o caso.
Desde o primeiro minuto do Jogo 1, ficou claro que o Suns não estava intimidado pelo adversário. A equipe foi para cima do Lakers, impôs o seu jogo, envolveu o oponente e logo abriu vantagem. Parecia ser o começo dos sonhos para uma equipe do Suns que voltava para os playoffs pela primeira vez em 11 anos...
... só para tudo ir por terra no começo do segundo quarto, quando o armador Chris Paul se chocou com o companheiro Dario Saric e foi imediatamente para o chão, visivelmente sentindo muita dor.
Para quem acompanha basquete a mais tempo, a reação foi universal: "De novo, não!". A imagem de CP3 machucado em um momento crítico da pós-temporada não era nova, apenas o mais recente capítulo de uma carreira marcada por elas. Paul foi levado para o vestiário, e de repente uma nuvem escura começou a pairar sobre a série.
Paul acabou voltando para quadra e o Suns conseguiu a vitória no jogo, 99 a 90, e embora Paul estivesse visivelmente limitado - sofrendo para driblar com a mão direita, seus passes mais lentos e imprecisos - a outra estrela do Suns, Devin Booker, compensou com sobras. Booker terminou o jogo com 34 pontos e 8 assistências, dissecando a defesa do Lakers no pick-and-roll e comandando a vitória do Suns. Por um momento, parecia que o Suns poderia sobreviver mesmo com a lesão do seu melhor jogador.
Mas essa esperança logo começou a ruir no Jogo 2. Não apenas porque o Lakers se aproveitou disso para vencer o Suns para empatar a série, mas porque a lesão expôs as deficiências do próprio Phoenix Suns.
Em termos de construção de elenco, a grande fraqueza do Suns sempre foi a falta de criadores secundários. A NBA moderna é muito complexa e depende de ações contínuas; com isso, todos os times precisam de vários jogadores que possam criar jogadas para si e para os companheiros ao longo de uma posse de bola, seja com passes ou botando a bola no chão. O Suns é um dos poucos candidatos ao título que destoa; eles dependem quase exclusivamente dos armadores (Paul, Booker e Cameron Payne) na parte da criação. Durante boa parte do tempo, isso não foi um problema. Paul é um dos jogadores que mais controla a bola na NBA, assim como Booker e, portanto, na maior parte do tempo a bola estava nas mãos dos seus melhores jogadores, de modo que a falta de criação era compensada.
Mas, com Paul limitado, essa fraqueza voltou para assombrar o Suns: Paul jogou apenas 22 e 27 minutos nas duas partidas seguintes, e anotou 13 pontos e 11 assistências no total. No Jogo 2, com a partida apertada no quarto período, o Suns tirou Chris Paul - talvez o mais eficiente jogador em fins de jogos de toda sua geração - com 9 minutos no relógio, e o camisa 3 não voltou mais.
Com Paul, o Suns era perigoso demais para iniciar suas jogadas e dinâmico demais atacando de fora para dentro - a ponto de que Andre Drummond e os demais pivôs do Lakers se tornaram completamente impossível de manter em quadra, o que por sua vez ditava o tom da série. Se o Lakers mantivesse os pivôs eram presas fáceis para os pick-and-rolls de Paul e Booker, incapaz de marcar o dinamismo dos dois em espaço e impedir a infiltração de Paul; mas, se tirava Drummond/Harrell e jogava sem pivô, o time deixava de lado sua identidade da maior parte do ano.
Sem Paul para fazer esse tipo de jogada, o Suns não representa a mesma ameaça no ataque. Booker evoluiu muito como passador e criador, mas ainda não está no nível de Paul; Payne está tendo uma ótima série, mas o Lakers está perfeitamente ok com isso. A responsabilidade claramente está sobrecarregando Booker, que precisa criar quase tudo sozinho, e estamos vendo muito mais disso desde então:
E o Lakers, que não tem nada a ver com os problemas do Suns, soube se adaptar. LA teve a melhor defesa da NBA na temporada regular, e isso com LeBron e Anthony Davis perdendo 60 jogos. Com os dois em quadra e Phoenix sem a chave do seu ataque, Frank Vogel sentiu cheiro de sangue e ajustou - a princípio apenas sentindo a temperatura no Jogo 2 com ajustes cautelosos antes de, finalmente, partir para a ofensiva no Jogo 3.
Após a lesão de Paul no Jogo 1, o Lakers sabia que a bola ficaria na mão de Booker e reagiu atacando a estrela do Suns com dobras, o que a princípio faz sentido: se ele é o único criador do Suns, faça a dobra, tire a bola da mão dele e force o resto do time a criar. Mas com tanta atenção sendo jogada na direção de Booker, ele conseguiu acionar seus companheiros com tanto espaço e em situações tão favoráveis que eles não precisavam criar; só precisavam finalizar o que já tinha sido criado.
A partir do Jogo 2, o Lakers fez o oposto: eles começaram a defender Booker e seus PnR quase sem enviar ajuda. Desse jeito, se Booker passasse a bola, seus companheiros não tinham nenhuma vantagem e realmente precisavam criar o ataque a partir do zero, o que não são capacitados para fazer - e se Booker não passasse, o Lakers estava confortável em deixá-lo tentar ganhar o jogo sozinho, especialmente sem o espaçamento extra que a presença de CP3 normalmente traz. Vogel apostou que os secundários não poderiam fazer o Lakers pagar por isso, e corretamente. CP3 não está conseguindo, e o único Suns capaz até aqui de aproveitar essa vantagem é Cameron Payne, justamente o outro criador do time, que teve ótimos jogos desde então... mas é um jogador que o Lakers está perfeitamente feliz de deixar decidir os jogos, especialmente porque parece estar desgastando mentalmente Booker no processo - como sua falta flagrante no final do Jogo 3 atesta.
Isso permitiu aos atuais campeões muito mais tranquilidade para deixar o seu jogo aflorar, e resgatar sua forma dominante. Sem precisar que seus jogadores se movimentassem tanto em espaço, e sem os passes afiados de Chris Paul, o Suns não tinha mais como castigar os pivôs mais lentos do Lakers. Vogel podia deixar Drummond ou outros pivôs em quadra sem preocupação e usar o tamanho para castigar o time do Suns. Nos Jogos 2 e 3, o Lakers pegou 23 (!!) rebotes ofensivos contra 12 do Phoenix Suns e impôs seu jogo mais físico dentro do garrafão. Veja a imagem abaixo:
Esse é o mapa de arremessos do Lakers no Jogo 1, quando Phoenix estava ditando os termos do confronto e forçando o Lakers a jogar no seu estilo. Como você pode ver, muitos chutes espalhados pela meia distância que não estavam caindo, fora da característica do Lakers. Agora compare com o mapa do Jogo 3, quando o Lakers voltou a jogar o seu melhor basquete e trouxe a partida para o seu lado:
Os arremessos se aproximaram em muito da cesta, onde o tamanho e força física do Lakers é uma vantagem clara sobre um time mais baixo do Suns. E, coincidência ou não, isso ajudou Anthony Davis a embalar: depois de um fraquíssimo Jogo 1 - 13 pontos em 5-16 nos arremessos - Davis anotou 34 pontos em cada um dos seguintes.
O Suns começou a série com DeAndre Ayton marcando Davis, e Ayton fez um trabalho muito bom, mas conforme o Lakers ia conseguindo impor seu tamanho sobre o Suns e manter seus pivôs em quadra, Ayton foi obrigado a marcar Drummond para impedir que ele fizesse a festa perto do aro, o que deixou o mais baixo Crowder marcando Davis - um duelo que ele tem aproveitado. A lesão de Paul foi um golpe de sorte para o Lakers, mas o time não está se aproveitando disso apenas para vencer a série, e sim para retomar seu melhor basquete após um ano perdido para lesões e recuperar a forma que fez do Lakers campeão em primeiro lugar.
Do lado do Suns, ainda é cedo para decretar o fim das chances do time; tem muitos jogos pela frente, e em teoria Paul deveria ficar mais saudável a cada jogo, ainda que uma recuperação completa seja improvável. Mas, cada vez mais, parece mais e mais difícil para o Suns sobreviver ao Lakers sem Paul; não apenas pela qualidade individual que o time perde com a lesão, mas por todo o efeito cascata sobre o resto do time.
O Suns tem talento no elenco, sem dúvida, mas não é uma coincidência que todo esse elenco só se transformou numa potência com a chegada de Paul. Ele é a peça que dá sentido a todas as outras, e se o Paul dos jogos 2 e 3 for o que Phoenix tiver para o resto da série, a temporada mágica do Suns pode chegar ao fim bem mais cedo que o ideal.
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