Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
O Brooklyn Nets está sem James Harden, e até aqui isso não tem importado
Embora lesões sejam parte do jogo de basquete e aconteçam todo ano, isso não as torna menos tristes ou mais fáceis de se lidar, e o ano de 2021 tem sido particularmente cruel nesse sentido. Então, quando na primeiríssima jogada da série entre Bucks e Nets nós vimos James Harden sentir a coxa e imediatamente ir para os vestiários, eu acho que todo mundo deixou escapar um palavrão de raiva. Tudo que essa série - que alguns enxergavam como final antecipada da NBA - não precisava era um dos seus principais astros saindo machucado com uma lesão que parecia relativamente séria. Harden vinha em uma temporada espetacular desde que chegara em Brooklyn e talvez tinha sido o melhor jogador dos Nets na vitória sobre o Boston Celtics na primeira rodada, e não foram poucos os que pensaram que sua saída do jogo - e talvez da série - pudesse ser um fator decisivo no resultado do confronto.
Mas, em duas vitórias extremamente dominantes sem o camisa 13, os Nets ainda não deram sinal de que isso vai ser um problema. Muito pelo contrário: foi depois da lesão de Harden que começaram a jogar o melhor basquete da temporada inteira.
Agora, vamos deixar claro uma coisa: eu não estou dizendo que o Brooklyn Nets é um time melhor sem James Harden. Isso seria ingenuidade; Harden é um dos melhores jogadores da NBA inteira, e nenhum time fica melhor ao perder alguém assim. Mas a forma como os Nets se adaptaram e lidaram com a ausência de Harden logo no começo do jogo foi extremamente impressionante, e acabou trazendo para primeiro plano alguns aspectos do Brooklyn Nets que estão impulsionando a equipe a um dos mais espetaculares começos de série que eu já vi na vida. Brooklyn não está apenas vencendo os Bucks, está massacrando aquele que era cotado até cinco dias atrás como um dos principais candidatos ao título.
Ter Kyrie e Durant no seu time te protege melhor de uma lesão contra Harden, é claro, mas ainda assim você esperaria alguns efeitos negativos. Apesar de Kyrie ser o armador nominal do time, Harden o era de fato desde sua chegada no Brooklyn; Kyrie se ajustou mais a um papel sem a bola, e Harden continuou dominando a laranja mas achando um equilíbrio melhor entre distribuir passes e acionar os companheiros - que, todos concordavam, era a melhor forma dessa equipe se organizar. Perder Harden significaria perder essa capacidade de armação e iniciar as jogadas, e também um jogador a mais capaz de explorar qualquer elo fraco da defesa. Eu falei na prévia da série sobre as limitações do elenco dos Bucks, e da sua dificuldade de manter em quadra alvos defensivos como Bryn Forbes; a lesão de Harden parecia abrir maior margem para os Bucks nesse sentido, e ainda desacelerar o ataque dos Nets no processo.
Mas não foi o que aconteceu; na verdade, de forma esquisita, a lesão de Harden acabou até agindo a favor dos Nets nesses primeiros jogos. Steve Nash acabou colocando Bruce Brown no lugar do barba, e embora Brown não esteja na mesma estratosfera de Harden como criador e passador, ele é excelente se movendo fora da bola, fazendo corta-luz e executando o trabalho sujo para liberar os companheiros - e Nash, inteligentemente, usou Brown para fazer essa função na ausência da capacidade de criação de Harden. Em uma série onde os Bucks pareceram entrar preparados para defender as jogadas de isolação dos Nets, Brooklyn está destruindo a oposição com sua movimentação de bola e passes maravilhosos: o time está dando quase 30 passes a mais por jogo e rodando a bola em cima de uma defesa cada vez mais confusa e perdida dos Bucks, e Brown tem sido parte fundamental dessa evolução.
É impossível para qualquer time realmente parar Durant e Kyrie, e os Bucks terão que viver com isso ao longo da série, mas Brooklyn tem sido muito capaz na forma como explora a atenção que suas estrelas comandam e gerar cestas fáceis para seus coadjuvantes. Eles também estão sabendo atacar muito bem sua principal vantagem tática na série: a cobertura do Bucks em pick-and-roll, na qual recuam um dos jogadores para o garrafão. Kyrie e Durant tem conseguido ótimos arremessos de meia distância contra essa defesa "drop", mas não estão se limitando a isso: Brooklyn também tem explorado a defesa drop tanto com sua movimentação fora da bola, como aproveitando para colocar seus jogadores em velocidade na direção da cesta para passar com mais espaço.
E quando o drop não funciona e força a ajuda, abre todo um mundo de possibilidades para Brooklyn.
Isso porque é fundamental para entender como Brown virou a peça de xadrez que Nash usou tão brilhantemente. Os Bucks, como esperado, tentaram aproveitar a presença de Brown para esconder defensores mais fracos - em especial Bryn Forbes - em uma tentativa de acordar seu ataque dormente, mas foi um erro que colocou Milwaukee onde Nash queria. Apesar da altura de armador, Brown talvez seja o melhor jogador dos Nets fazendo corta-luz, então sempre que tinha um defensor fraco na marcação Brooklyn chamava Brown para fazer pick-and-roll e se envolver nas ações com suas estrelas, oferecendo aos Bucks um dilema impossível: você troca a marcação e deixa seu pior defensor marcando Irving ou KD? Você envia ajuda, e se abre para as ótimas trocas de passe dos Nets? Ou você pede para Forbes recuar para o garrafão e deixar o adversário conseguir o arremesso que quiser? Boa sorte!
Mas, apesar do inegável sucesso do ataque dos Nets, eu nem acho que a defesa dos Bucks na meia quadra tem sido o maior problema. Durant e Irving simplesmente farão seus estragos individuais, e os Nets têm se aproveitado muito bem disso e das brechas a serem exploradas no confronto para impor seu ataque, mas o maior problema dos Bucks tem sido o outro lado da quadra. E não apenas sua óbvia dificuldade de anotar pontos, ou o excesso de turnovers que está cometendo, mas o que acontece depois desses erros.
Onde os Nets estão realmente massacrando os Bucks é em transição. Quando Milwaukee erra um arremesso ou perde a bola - duas coisas que tem acontecido bastante - Brooklyn simplesmente liga o turbo e corre no contra-ataque, onde ele é impossível de ser parado nessas horas. Se não acham uma bola boa de três ou um ataque livre ao aro, Brooklyn pelo menos consegue pegar a defesa do Bucks embaralhada o suficiente para iniciar sua movimentação em boa situação.
Brown, naturalmente, é um ótimo defensor e tem sido parte importante desse esforço defensivo do Brooklyn; com Brown no lugar de Harden, os Nets simplesmente oferecem menos pontos fracos para serem atacados na defesa, e adicionam um defensor versátil que pode trocar a marcação nas ações de perímetros dos Bucks e evitar abrir os espaços que Milwaukee usou para atacar o Heat na primeira rodada.
Porque, para mim, isso tem sido o mais interessante da defesa dos Nets ser tão eficiente até aqui: eles não estão fazendo nada de muito diferente. Não tem uma novidade ou inovação tática. Brooklyn está fazendo exatamente o que era esperado antes da série: dando espaço para Giannis chutar de longe, fechando o garrafão, sendo agressivo nas ajudas e forçando as bolas longas... só que estão fazendo isso bem demais, e está funcionando. As ajudas estão sendo perfeitas, as rotações estão na hora certa, a comunicação impecável. Brown está ajudando em tudo isso, claro, pois são áreas onde ele é ótimo, mas vai muito além de um jogador e sim de um coletivo que sabe o que tem que fazer, como fazer, e está executando com uma consistência invejável. Isso vai muito além dos problemas do Bucks ou apenas da fagulha que Brown trouxe para o time titular; é um trabalho que vai desde a comissão técnica até o último reserva do elenco. Todos estão executando com confiança e inteligência, e o coletivo está se elevando como resultado - o que, combinado com seu talento individual, faz do Brooklyn Nets um time verdadeiramente assustador.
Apesar da dominação absoluta, os Nets até aqui de certa forma só fizeram seu dever de casa: venceram os dois jogos em casa, e agora é a vez dos Bucks. Pat Riley uma vez disse que uma série não começa de verdade até um time vencer fora de casa, e isso ainda não aconteceu. Alguns fatores flutuantes estão fora da curva para Brooklyn e tendem a regredir, e Milwaukee (em teoria) deve se ajustar. Nada está ganho ainda.
Mas os Nets fizeram muito bonito na ausência de Harden, e se conseguirem carregar esses fatores que estão fazendo a diferença para quando sua terceira estrela estiver de novo em quadra, é difícil negar que os Nets começam a se estabelecer como grande favoritos ao título da NBA.
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