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Vinte e Dois

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Com Chris Paul perto de voltar, os Clippers podem ter perdido sua chance

Paul George, do Los Angeles Clippers, reage após errar lances livres contra o Phoenix Suns nos playoffs da NBA - Mark J. Rebilas/USA TODAY Sports
Paul George, do Los Angeles Clippers, reage após errar lances livres contra o Phoenix Suns nos playoffs da NBA Imagem: Mark J. Rebilas/USA TODAY Sports

Vitor Camargo

Colunista do UOL

24/06/2021 04h00

Me interrompa se você já leu isso antes nessa pós-temporada, mas o Los Angeles Clippers se encontra em uma desvantagem de 2-0 após perder os dois jogos iniciais de uma série de playoffs. Eu sei, chocante, não é?

Contra Utah, os Clippers fizeram história ao se tornaram o primeiro time da história da NBA a vencer duas séries consecutivas de playoffs depois de começarem perdendo por 2-0. Se quiserem chegar às Finais, portanto, terão que ir ainda além nos feitos inéditos e reverter a desvantagem pela terceira vez.

O lendário técnico Pat Riley, certa vez, disse que uma série de playoffs não começa de verdade até que um dos times vença fora de casa, o que os Suns ainda não fizeram aqui. Assim como foi contra o Jazz, Phoenix fez sua lição de casa e agora viaja para Los Angeles, onde os Clippers terão a chance de empatar a série na sua quadra e transformar a disputa em uma melhor de três. LA já esteve nessa mesma desvantagem antes, e por duas vezes deu a volta por cima para empatar a série e, eventualmente, passar de fase. Não tem nada perdido para os Clippers ainda.

Mas, ainda assim, eu não consigo olhar para esses dois jogos - em especial o Jogo 2, no qual o Clippers tinha a vantagem e seu melhor jogador (saudável) na linha do lance livre nos segundos finais, e perdeu com uma ponte aérea faltando 0,9 segundo no relógio - e não achar que LA desperdiçou uma chance de ouro de roubar o mando de quadra e conseguir uma vantagem importantíssima nessa série antes da volta de Chris Paul para o time do Arizona. O fato de não ter conseguido isso coloca o time em um buraco maior do que os que se encontrou nas séries anteriores.

E, para deixar claro, eu não digo isso como uma crítica aos Clippers por não conseguirem ganhar do Suns sem Paul - Phoenix ainda é um excelente time mesmo sem o armador. Vale lembrar que os Clippers também estão sem seu melhor jogador, Kawhi Leonard, além do titular Serge Ibaka, que seria importantíssimo sob uma ótica tática para essa série. LA não era favorito em nenhum desses jogos, e não tinha obrigação de ganhar.

Ao mesmo tempo, considerando os desfalques já conhecidos dos Clippers, esses dois primeiros jogos sem Chris Paul eram fundamentais para as pretensões da equipe de LA de chegar na sua primeira final de NBA. Não que os Clippers não possam vencer o Suns com Paul em quadra e classificar mesmo assim, mas a tarefa é inegavelmente mais difícil com o armador. Já começando em uma posição desvantagem, era fundamental para os Clippers roubar pelo menos um desses jogos sem Paul para equilibrar as coisas, e agora o caminho a ser percorrido é muito mais difícil.

O Jogo 2 foi a grande chance dos Clippers nesse sentido, e não apenas pelo que aconteceu nos segundos finais da partida. No Jogo 1, os Clippers buscaram bater de frente com os Suns e jogarem a favor das suas forças, começando com o small ball e se adaptando conforme o jogo foi progredindo. Eles estavam buscando jogar em função dos seus termos. No Jogo 2, no entanto, foi diferente. Os Clippers não entraram pensando no seu próprio jogo, mas em explorar ao máximo a ausência de Chris Paul com uma estratégia que foi muito parecida com a que o Lakers usou para massacrar Phoenix no Jogo 3: forçar qualquer um dos Suns a vencer o jogo, menos Devin Booker.

No Jogo 1, os Clippers já mostram que o foco seria defensivo, dobrando bastante em Booker quando ele atacava. Funcionou bem enquanto LA manteve seu quinteto small ball, mas a entrada dos pivôs e a defesa em drop - quando eles recuam para proteger o garrafão contra o pick-and-roll, abrindo a meia distância - tornou essa estratégia muito mais difícil e permitiu que Booker explodisse para 40 pontos.

No Jogo 2, os Clippers fizeram mudanças para levar essa ideia ainda mais ao extremo: colocaram em quadra Beverly, seu melhor defensor, caçando jogadores ao redor de corta-luz, e também Zubac. Mas, dessa vez, eles não deixaram Zubac recuar no drop de sempre, o que abriria totalmente o espaço para Booker atacar. Pelo contrário, colocaram Zubac mais alto contra o corta-luz para que ele não permitisse o chute médio.

Isso, naturalmente, tirava o chute de meia distância de Booker e incentivava o camisa 1 a infiltrar e atacar o aro para aproveitar a falta de proteção de aro dos Suns com o pivô longe da cesta, bem como a vantagem de velocidade de Booker em espaço conta Zubac. Mas isso tirava a cadência de Booker na meia distância e forçava ele a acelerar seu jogo. Nesse momento o Clippers trazia um terceiro defensor para atacar Booker durante sua infiltração, efetivamente prensando Booker entre Zubac, Beverly (espetacular na defesa) e a ajuda, forçando o armador dos Suns a tomar decisões rápidas em um ritmo que não é o que ele se sente mais confortável.

Essa estratégia tinha alguns riscos bastante óbvios. Um deles era se abrir para a rotação de bola do Suns no perímetro. Colocar Booker em situações difíceis para fazer passes levou a muitos turnovers e menos passes (7 TOs contra 5 assistências), mas ainda houve momentos nos quais o ataque dos Suns soube colocar Zubac na posição de ajuda e gerar bons arremessos:

Da mesma forma, como o foco dessa defesa era parar Booker, isso frequentemente significava deixar Ayton com mais espaço e menos atenção defensiva, frequentemente recebendo a bola contra a ajuda de um jogador menor no garrafão - não à toa o pivô teve sua melhor marca nos playoffs com 24 pontos.

Mas essas eram consequências com as quais os Clippers estavam dispostos a lidar, porque o plano era exatamente esse: tirar Booker (na medida do possível) do jogo e forçar a bola nas mãos do seu coadjuvante para ELES decidirem a partida. E, de certa forma, a estratégia funcionou: Booker teve seu pior jogo nessa pós-temporada - 20 pontos, 5-16, 7 turnovers - e os Suns anotaram 114 pontos por 100 posses de bola no ataque, depois de terem anotado 126 no Jogo 1.

Forçando a bola para longe das mãos de Booker dessa maneira, Phoenix dependeu dos seus coadjuvantes, com o espaço extra que tinham, para carregar o time para a vitória. E foi exatamente o que Ayton e Payne fizeram. Mas, do ponto de vista do plano dos Clippers, a estratégia deu certo, Booker foi limitado, e o ataque dos Suns não foi tão bom quanto vinha sendo. Pelo outro lado, foi o ataque dos Clippers que deixou a desejar, mas ainda assim, eles ficaram a dois lances livres errados e um game-winner espetacular dos Suns de roubar o mando de quadra.

O problema é que, com Paul de volta para o Jogo 3, essa estratégia para de ser viável. É uma coisa dar todo esse espaço para Cameron Payne decidir o jogo, outra bem diferente é fazer com Paul, o que força os Clippers a retornarem para a estaca zero. Voltar para a defesa drop com Zubac, ainda mais com Paul em quadra do outro lado, é inviável; manter esse nível de agressividade e dar tanto espaço para Paul (ou Booker, caso Paul seja o alvo da blitz) é suicídio.

A única alternativa para LA parece ser voltar justamente ao small ball do Jogo 3, o que não é uma coisa ruim porque essa é a formação na qual os Clippers jogam seu melhor basquete, mas as alternativas vão ficando mais escassas. O Jogo 2 foi a chance dos Clippers de usarem tudo que tinham contra um Suns limitado em opções pela ausência de Paul. Foi exatamente o que fizeram, e deveriam ter saído com uma vitória crucial de Phoenix.

Mas não saíram, e agora os Clippers precisarão correr atrás do prejuízo sem contar com os problemas do adversário. Terão que achar dentro de si seu melhor basquete para bater os Suns e virar mais essa desvantagem. E nós sabemos que eles são capazes: eles fizeram isso duas vezes já, a última delas contra a seed #1 e sem Kawhi Leonard. Mas o caminho teria sido muito mais fácil se tivessem aproveitado esses dois primeiros jogos para passar à frente. O desafio agora, eles sabem, é muito maior.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL