Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Os coadjuvantes que estão dando forma ao duelo entre Suns e Clippers na NBA
Existe um velho adágio no mundo do basquete que diz que a NBA é uma liga de estrelas; ou seja, que são os grandes craques que determinam os destinos da liga. Isso é ainda mais forte quando falamos de títulos, e é comum ouvir que é praticamente impossível ser campeão sem um jogador Top 10 da NBA —o que, historicamente, não deixa de ser verdade. É só olhar para os times campeões da última década —liderados por nomes como LeBron James, Steph Curry, Kevin Durant e Kawhi Leonard— para ver que, sim, realmente é de fundamental importância para suas aspirações de título ter uma super estrela liderando sua equipe.
Mas o reverso da moeda também é verdade: nenhum jogador sozinho, por melhor que seja, é capaz de ser campeão sem ajuda —algo que a história também comprova. O motor por trás dos títulos podem ser os grandes craques, mas toda e qualquer arrancada para o lugar mais alto do pódio envolve jogadores de menor expressão cumprindo papeis fundamentais e aparecendo para decidir quando menos se espera.
Essa série entre Phoenix Suns e Los Angeles Clippers tem sido um ótimo exemplo disso. Uma que nos três primeiros jogos tem sido amplamente influenciada pelas atuações de jogadores secundários e heróis improváveis, atletas que ninguém via valor poucos meses atrás e agora podem definir o destino de uma temporada da NBA.
É claro que os grandes astros da série, e no fim do dia os grandes determinantes dos resultados, são os nomes já conhecidos: Devin Booker, Chris Paul, Paul George e (se estivesse saudável) Kawhi Leonard. Devin Booker foi o melhor jogador dos Suns na vitória do jogo 1 com seu triplo-duplo de 40 pontos; Paul George liderou os Clippers no jogo 3 com 27-15-8. Os times não chegariam onde estão se não fosse por eles. Mas você não precisa olhar além dos jogos 2 e 3 dessa série para ver o quão difícil é continuar ganhando nesse nível da NBA, e quão importante é o papel dos seus jogadores que estão longe dos holofotes para chegar lá.
Eu escrevi sobre como o jogo 2 foi o duelo no qual os Clippers decidiram apostar todas suas fichas na ausência de Chris Paul. Eles direcionaram seus esforços defensivos a tirar o jogo de meia distância de Devin Booker, forçar a infiltração e enviar ajuda para tirar a bola das suas mãos, forçando que o resto da equipe vencesse o jogo. O risco dessa tática é que, com tantos jogadores direcionados a marcar um único cara, os demais jogadores dos Suns tinham muito mais espaço para jogar, e Los Angeles apostou em duas coisas nesse sentido: na sua capacidade de recuperação para impedir que os espaços ficassem abertos por muito tempo, e na incapacidade dos jogadores coadjuvantes dos Suns sem Chris Paul castigarem esse espaço a mais que tiveram.
A tática funcionou bem, e se Phoenix ganhou não foi por causa diretamente de Booker —que arremessou 5-16 com 7 turnovers— mas, sim, de um jogador que, 18 meses atrás, estava jogando na China pela falta de interesse dos times da NBA: Cameron Payne. Phoenix tem um ótimo elenco de apoio, mas seu calcanhar de Aquiles é a falta de profundidade de criadores depois de Paul e Booker. Com Booker bem marcado e Paul fora, toda a responsabilidade de criação e de aproveitar os espaços dados pela defesa dos Clippers caiu nos ombros de Payne, que respondeu simplesmente com a melhor atuação da sua carreira: 29 pontos, 9 assistências, 2 roubos e até mesmo 2 tocos. Aproveitando a atenção defensiva dispensada ao companheiro, Payne atacou a cesta com agressividade e chegou ao aro como quis:
E, percebendo que contra ele esse tipo de marcação agressiva no pick-and-roll não seria usado e os Clippers ainda colocariam Zubac recuando para o garrafão, foi ele quem assumiu o papel de Chris Paul para castigar da meia distância:
E, curiosamente, o jogo 3 deixou ainda mais escancarada a importância de Payne e o tamanho do que ele fez no jogo 2. Com Chris Paul de volta, Payne se machucou logo no primeiro quarto de jogo e perdeu o resto da partida, de modo que, na prática, os Suns simplesmente "trocaram" a sua presença de CP3 em termos de rotações e minutos de jogo. Só que, ao contrário da partidaça de Payne que levou o time à vitória no jogo 2, Phoenix perdeu o jogo 3 com uma atuação consideravelmente abaixo de Paul: 15 pontos, 5-19 nos arremessos, —15 em quadra (embora, para ser justo, 12 assistências). E isso não é para dizer que Payne é melhor que Paul, ou que os Suns são melhores sem CP3 —isso seria ridículo— e Paul certamente foi defendido com mais atenção e menos espaços que Payne, mas serve para mostrar o tamanho do que o reserva fez quando precisou substituir o astro do time. As esperanças de título dos Suns estão com Paul e Booker, mas para chegar lá os Suns (ou qualquer time) também precisam de atuações dos coadjuvantes como a de Payne no jogo 2. Se Payne perder tempo com essa lesão, vai ser um duro golpe para Phoenix.
Isso é ainda mais verdade quando olhamos para os Clippers —não apenas sua vitória importantíssima no jogo 3, mas toda a sua incrível sequência desde a lesão de Kawhi Leonard. Paul George subiu seu jogo e tem liderado essa arrancada, colhendo os maiores méritos (com razão) e deixando para trás de vez o apelido pejorativo de Pandemic P. Mas o time não chegaria até aqui se não fosse a ascensão de dois jogadores que ajudaram a carregar a pesadíssima carga deixada pela lesão de Kawhi: em seu segundo ano de NBA, e um veterano que jogou 2020 em um contrato mínimo.
Escolha #48 no Draft de 2019, Terance Mann foi a opção do técnico Ty Lue para substituir Leonard quando este se machucou; até então, ele tinha jogado apenas 13 minutos por jogo, mas desde então tem jogado 28 e tido a tarefa de substituir no quinteto titular o melhor defensor e pontuador do time. Mann nunca vai ser Kawhi Leonard, é claro, mas ele correspondeu muito além das expectativas e isso foi parte importante dos motivos pelos quais os Clippers conseguiram se manter à tona após perder seu melhor jogador: são 16 pontos por jogo com aproveitamentos absurdos de 67% nos arremessos e 55% nas bolas de três, trazendo ótima defesa e, talvez mais incrível, NENHUM turnover nesses cinco jogos —melhor marca para um jogador de perímetro com tantos minutos como ele na história da NBA. Sua obra-prima, é claro, veio no jogo 6 contra o Utah Jazz, quando anotou 39 pontos no total e 20 só no terceiro período para ajudar os Clippers a virarem uma desvantagem de mais de 20 pontos e avançarem para as finais do Oeste. No jogo 3 contra Phoenix, Mann anotou "só" 12 pontos, mas ele e Patrick Beverly —que entrou no jogo 2 justamente para isso— foram os principais responsáveis por uma defesa extremamente agressiva e hiperativa que limitou Booker e Paul a combinados
Mas o nome do jogo 3 (tirando George) —na verdade, o segundo melhor jogador dos Clippers desde a lesão de Kawhi— foi Reggie Jackson, que também começou a pós-temporada no banco para entrar de titular após os ajustes feitos por Lue contra Dallas. E o armador tem correspondido além das maiores expectativas possíveis, graças em parte a um muito melhorado arremesso de três pontos: 19 pontos, 3 rebotes e 3 assistências e 53-43-87 nos arremessos. Desde a lesão de Kawhi, ele tem sido ainda mais impactante: 23 pontos e 5 assistências enquanto mantém os altíssimos aproveitamentos e comanda o time quando tudo fica estagnado. Na vitória no jogo 3, quando os Suns tiraram a diferença no quarto período para apenas seis pontos e ameaçaram a virada, foi Reggie Jackson quem anotou 5 pontos seguidos e 14 no período como um todo para salvar o jogo para Phoenix, incluindo duas bolas de três decisivas:
Os Clippers sabem que não podem substituir Kawhi Leonard, mas estão fazendo um trabalho muito bom substituindo a sua produção na medida do possível, e isso se dá graças ao quanto os coadjuvantes da equipe elevaram seu jogo e como as novas apostas corresponderam.
As grandes estrelas recebem (merecidamente) os holofotes, mas com defesas cada vez mais sofisticadas e esquemas voltados para marcarem os principais jogadores do adversário, cada vez mais os coadjuvantes vão ser colocados em situação onde precisarão decidir jogos cruciais na caminhada de qualquer candidato ao título. E, no caso da final do Oeste, essas estrelas têm sido o fator decisivo no resultado até aqui.
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