Topo

Vinte e Dois

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Tudo que os Hawks precisavam no jogo 3 aconteceu, mas não foi o bastante

Nate McMillan, técnico do Atlanta Hawks, durante jogo contra o Milwaukee Bucks nos playoffs da NBA - Todd Kirkland/Getty Images/AFP
Nate McMillan, técnico do Atlanta Hawks, durante jogo contra o Milwaukee Bucks nos playoffs da NBA Imagem: Todd Kirkland/Getty Images/AFP

Vitor Camargo

Colunista do UOL

29/06/2021 04h00

O jogo 3 das finais do Leste era um jogo que o Atlanta Hawks não podia ter perdido.

Depois de um massacre no jogo 2, que deixou Atlanta em busca de respostas e expôs o quão difícil era a situação do time ao enfrentar um adversário superior no Milwaukee Bucks, no jogo 3, Atlanta teve tudo que precisava agindo a seu favor: Milwaukee recuou um pouco nos ajustes agressivos que foram tão efetivos no jogo 2. Trae Young embalou de novo, e dessa vez suas bolas de três estavam caindo, assim como as do time em geral, com Atlanta chutando 45% de trás do arco antes que alguns arremessos desesperados no final do jogo abaixassem esse número para "só" 41%. Jrue Holiday, que vinha sendo dominante, teve seis pontos em 2-11 nos arremessos. E os Hawks ainda receberam uma bênção na melhor performance de Danilo Gallinari com a camisa da franquia, que anotou 18 pontos e até forçou três turnovers contra Giannis defendendo em isolação. Mas, apesar de tudo isso, Atlanta acabou com uma derrota por dois dígitos que devolve aos Bucks o mando de quadra na série e coloca a equipe enfrentando um jogo 4 decisivo ainda sem encontrar as respostas definitivas que precisa. Uma vitória no jogo 3 não apenas colocaria Atlanta mais perto das Finais, mas daria à equipe tempo e margem maior para erro. Agora, essas duas coisas estão ficando perigosamente escassas.

Ofensivamente, Atlanta respondeu muito bem depois do debacle no jogo 2, ainda que o placar final (113 a 102) possa esconder isso em uma partida de ritmo muito mais lento. Ajudou que Milwaukee pareceu ficar receoso dos ajustes de Atlanta para essa partida e recuou um pouco em relação à defesa ultra-agressiva que sufocou Trae Young, voltando a deixar Brook Lopez mais longe do corta-luz e enviando menos ajuda. Mas Atlanta entrou muito mais bem preparado dessa vez no que diz respeito ao posicionamento dos seus jogadores em volta do pick-and-roll, dificultando a ajuda —e assim Trae pode voltar a jogar com espaço e dominar ofensivamente.

Atlanta também fez um trabalho muito bom em colocar Trae e seu PnR em situações onde os Bucks não conseguiriam colocar um terceiro defensor no caminho do armador. A jogada abaixo é um erro de comunicação dos Bucks —Holiday não pode ceder o fundo livre com Lopez tão perto do corta-luz— mas acontece porque Atlanta coloca Milwaukee em uma posição de estar preso entre dois estilos de defesa, forçando os jogadores envolvidos a tomar a decisão em tempo real:

Esse desconforto dos Bucks inclusive ficou bastante evidente ao longo da partida. Como dito antes, Milwaukee pareceu recuar um pouco na sua defesa agressiva do jogo 2, e ao invés disso apostou mais nas trocas de marcação. Quando fez isso direito, em geral os resultados foram bons, mas ficou escancarado o quanto os Bucks não estão acostumados a manter esse tipo de pensamento coletivo e entrosamento por longas posses. Atlanta aumentou seu uso de ações fora da bola para forçar essas trocas, e foi extremamente comum ver os Bucks batendo cabeça ou errando nas trocas e comunicações, algo que os Hawks estavam muito espertos para explorar.

Atlanta também esteve mais confortável explorando mismatches que surgiam a partir dessas trocas, especialmente com Gallinari:

Trae teve 35 pontos —embora limitado a 4 assistências— e Atlanta anotou 109,7 pontos por 100 posses; não tão bom quanto os 114,9 no jogo 1 (o que é normal, dado que Milwaukee não vai mais estender um tapete vermelho para Trae), mas muito melhor que os 90,1 do jogo 2. Foi um bom jogo ofensivo, impulsionado por mais uma boa performance de Trae, participações pontuais dos coadjuvantes e um ótimo aproveitamento nas bolas de três pontos. Atlanta sabe que, para vencer a série, precisa fazer isso no volume ofensivo, e os fatores que poderiam fazer o jogo pender para seu lado nesse sentido todos estiveram presentes.

E, mesmo assim, não foi suficiente. Mesmo com tudo a seu favor, mesmo com um jogo pavoroso de Holiday, mesmo com Milwaukee sofrendo novamente para acertar bolas de três por boa parte do jogo, Atlanta não conseguiu vencer a partida. E o problema, de novo, veio na defesa.

Depois de três jogos, Atlanta continua sem resposta para o Milwaukee defensivamente. Mesmo nos momentos onde o ataque dos Bucks não funcionou, em geral teve mais a ver com o time errando arremessos ou tomando decisões ruins do que necessariamente com algo de especial feito por Atlanta. E o mais estranho é que isso não é necessariamente uma crítica aos Hawks, porque não existe algum problema óbvio com o que estão fazendo, ou algum ajuste que todo mundo está enxergando menos o seu técnico (como foi o caso dos Bucks no jogo 1). Atlanta simplesmente não tem o tipo de elenco para conseguir defender o ataque dos Bucks, especialmente sem DeAndre Hunter. São jogadores grandes demais, físicos demais, e muito fortes no garrafão para um time de Atlanta que não consegue impedir os Bucks de rodarem seu ataque e conseguirem os arremessos que querem, e cuja única peça central capaz de impedir isso - Capela - está sendo obrigada a defender um dos jogadores mais dominantes da NBA na atualidade em Giannis Antetokounmpo.

E, na grande ironia do esporte, Atlanta sobreviveu por 3 quartos com Milwaukee gerando uma série de bons arremessos e errando um número excessivamente alto deles (muito semelhante ao jogo 1 nesse sentido) só para Khris Middleton decidir o jogo com uma série absurda de arremessos, alguns deles contestados e até forçados que simplesmente caíram. Eu não posso frisar o suficiente o quanto os Bucks PRECISAVAM dessa explosão de Middleton, especialmente em um jogo no qual Holiday foi tão nulo pontuando. Um dos grandes problemas de Milwaukee é a inconsistência das suas estrelas, e contra times de ponta, é difícil para Miwaukee vencer quando não tem os três jogando bem. Contra Atlanta, a vantagem de talento ajuda em parte a esconder esse problema e o time é capaz de vencer com dois em um bom dia; mas, com o jogo equilibrado no final e apenas Giannis dominando, Middleton salvou o jogo com sua explosão no quarto período - 20 pontos, mais do que o time INTEIRO de Atlanta e incluindo uma sequência de 11 pontos seguidos em um minuto e meio que efetivamente definiu o jogo. Eu escrevi outro dia sobre a importância de jogos assim por coadjuvantes nos playoffs, e embora Middleton seja muito mais que um coadjuvante ainda é muito necessário para Milwaukee que outros jogadores, além de Giannis, possam ocasionalmente dominar um jogo por conta própria.

Mas mesmo a explosão de Middleton não foi por acaso; ela também se aproveitou bastante dos problemas defensivos do Atlanta, e em particular de um elo fraco particularmente problemático.

Eu realmente não quero criticar demais Trae Young, já que ele é o maior motivo dos Hawks nem sequer estarem aqui e tem carregado uma carga gigante no ataque, mas sua defesa tem se tornado um problema cada vez maior para Atlanta —e foi um dos grandes motivos da derrota do time no jogo 3. Que ele é um alvo defensivo que os Bucks tem atacado para conseguir boas cestas não é nenhuma novidade, e é uma limitação que Atlanta precisa conviver, mas o desinteresse e falta de atenção em jogadas assim custaram caro aos Hawks:

Trae está sendo marcado por Portis após uma troca; Collins erra o chute, e Trae não acompanha o contra-ataque —ele deixa Portis correr na frente livre, não volta para marcar, e Collins precisa voltar correndo para impedir a cesta fácil, cometendo uma falta.

Esse problema se repetiu ao longo de toda a partida, especialmente em jogadas de transição. E, no momento crítico do jogo no quarto período, foi exatamente o que deu a Khris Middleton duas das cestas de três que decidiram a partida.

Primeiro foi esse lance, o que virou o jogo para Milwaukee. Em transição, Trae acaba ficando em Middleton, mismatch que Milwaukee iria atacar, e Trae pede ajuda para Bogdanovic. Mas, antes de Bogdan chegar, Trae simplesmente desiste de marcar a bola e recua —deixando Middleton completamente livre para arremessar.

E, duas posses depois, essa sequência fatal. Trae erra o arremesso longo, e os Bucks saem em transição a partir do rebote. Ao invés de voltar para a defesa, Trae faz uma tentativa horrível de roubar a bola no meio da quadra e desiste da jogada. Milwaukee ataca no 3 vs 3, roda a bola, Connaughton acha Tucker, que passa para Middleton completamente livre fazer a cesta... e Trae volta andando para a defesa só quando a bola já está no ar.

A margem de erro dos Hawks nessa série é pequena demais, as opções defensivas limitadas demais, para continuar cometendo esse tipo de erro mental com tanta frequência.

Jogo 4 vai ser o jogo da temporada para Atlanta.