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Vinte e Dois

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Clippers buscam igualar maiores viradas da história da NBA contra os Suns

Chris Paul em ação pelo Los Angeles Clippers contra o Denver Nuggets em jogo da pré-temporada da NBA em 2014 - Ethan Miller/Getty Images/AFP
Chris Paul em ação pelo Los Angeles Clippers contra o Denver Nuggets em jogo da pré-temporada da NBA em 2014 Imagem: Ethan Miller/Getty Images/AFP

Vitor Camargo

Colunista do UOL

30/06/2021 04h00

Se você acompanhava NBA em 2016, com certeza já ouviu antes alguma piada sendo feita com times que perderam uma vantagem de 3-1 nos playoffs. Elas estavam por todas as partes depois da histórica virada do Cleveland Cavaliers sobre o favoritíssimo Golden State Warriors nas Finais de 2016, quando os Cavaliers se tornaram o primeiro time a virar essa desvantagem nas Finais da NBA. As piadas e memes usando a virada para diminuir os Warriors —que tinham batido o recorde da história da NBA ao vencer 73 jogos naquela temporada regular— tomaram conta da televisão, internet, e até mesmo da festa de Halloween que LeBron James deu no ano seguinte.

Essa história, naturalmente, volta à tona sempre que algum time se encontra nessa mesma desvantagem nos playoffs, exatamente o caso do Los Angeles Clippers antes da sua importantíssima vitória no jogo 5. Mas, embora seja uma história recorrente para situações semelhantes, o caso dos Clippers é particularmente curioso por causa de uma série de narrativas envolvendo alguns personagens chaves do confronto que possuem sua própria história com vantagens de 3-1 desperdiçadas.

A façanha do Cavaliers nas Finais de 2016 não foi a primeira virada em uma série que estava perdendo por 3-1, é claro —o pioneiro nesse tipo de reviravolta foi o Boston Celtics de 1968, liderado por Bill Russell, que nas finais do Leste virou para cima do favoritíssimo Philadelphia 76ers de Wilt Chamberlain para chegar às Finais e eventualmente vencer seu 10º título em 12 anos. No total, foram 13 viradas de séries 3-1 na história da NBA, e considerando que nunca nenhum time jamais conseguiu virar uma série que perdia por 3-0 essas 13 continuam sendo as maiores viradas da história do esporte.

Mas a do Cavaliers em 2016 é considerada especial, e por dois bons motivos: primeiro, por causa do adversário —Warriors atuais campeões, vencendo 73 jogos, grandes favoritos— e segundo, por ter acontecido nas Finais da NBA, o maior palco do esporte. Ela se tornou o modelo e inspiração para todos os times desde então que se encontraram nessa situação, e não é à toa... Mas, para mim, o título histórico dos Cavs ilustra justamente o quão difícil é reverter essa desvantagem. Os Cavs precisaram de atuações históricas de um dos melhores jogadores da história, de um adversário com seu astro jogando com joelho machucado e sem o pivô titular, com Draymond Green suspenso de um jogo crítico, e mesmo com tudo isso os Cavs AINDA precisaram de um arremesso histórico de Kyrie Irving no último segundo do jogo 7 para levantar a taça. É uma tarefa hercúlea.

A boa notícia para os Clippers é que eles têm do seu lado alguém que já passou por isso antes: seu técnico, Ty Lue, que também era o técnico dos Cavaliers durante a grande virada contra os Warriors. Na prática, é difícil saber se isso realmente ajuda ou não— são times diferentes, situações totalmente diferentes, e não é como se Lue tivesse feito algo de muito revolucionário em 2016 para seu time vencer o título— mas certamente não vai atrapalhar a confiança e o aspecto mental de um time dos Clippers que tem se especializado, nessa pós-temporada, em grandes viradas.

Curiosamente, força mental e resiliência eram os grandes pontos de interrogação para os Clippers entrando nessa pós-temporada, e isso justamente por ter estado do lado errado de uma virada por 3-1 como grande favorito um ano atrás. Depois de fazer seus principais movimentos na offseason para trazer duas grandes estrelas, Kawhi Leonard e Paul George, os Clippers enfrentaram os Nuggets na segunda rodada dos playoffs. Abriram 3-1 e estavam a uma vitória de chegar na primeira final de conferência da história da franquia quando veio o colapso. Los Angeles chegou a liderar o jogo 5 por 13 pontos nos segundos finais do terceiro quarto, apenas para tomar a virada no quarto período, e, então, tudo desandou. Denver venceu os dois últimos jogos da série por 28 pontos combinados, e esteve no controle do começo ao fim contra um time dos Clippers que pareceu um bando de crianças desesperadas enfrentando um time adulto.

Mas a relação mais interessante desse confronto com vantagens perdidas envolve os dois lados da série; mais especificamente, envolve o melhor jogador dos Suns, Chris Paul, quando ele ainda jogava pelos Clippers.

Não é exagero dizer que Chris Paul é o maior jogador da história do LA Clippers, sua chegada em 2011-12 foi o elemento transformador que fez uma franquia historicamente fraca e irrelevante passar a ser um dos times mais empolgantes e fortes da NBA. Entre sua chegada e sua saída em 2017, os Clippers tiveram seis anos como legítimos candidatos ao título nas mãos de sua grande estrela no que foi a melhor sequência da sua história até então. Só que os resultados em playoffs nunca vieram, um estigma que sempre assombrou tanto a franquia como o jogador: não apenas o time falhou em chegar a uma Final de NBA, mas Paul e os Clippers nem sequer chegaram a uma final de conferência.

Sua melhor chance veio em 2015, quando os Clippers jogaram contra os Rockets nas semifinais do Oeste pelo direito de enfrentar o eventual campeão Warriors nas finais de conferência. Apesar de os Rockets terem mando de quadra, os Clippers logo saíram na frente e abriram a vantagem de 3-1 nos primeiros confrontos. Houston venceu o jogo 5 no Texas, e o Clippers parecia pronto para fechar a série diante da sua torcida no jogo 6. LA liderava a partida por 19 pontos ao final do terceiro quarto, James Harden estava no banco, e tudo indicava que esse seria o ano em que os Clippers e Paul finalmente chegariam à elusiva final de conferência.

E foi quando tudo veio abaixo, e os Rockets viraram o jogo —não com James Harden, mas pelas mãos de Josh Smith e Corey Brewer, que combinaram 29 pontos no quarto período, quase o dobro do time inteiro dos adversários (15). Os Clippers não tiveram resposta, e Houston fechou a virada com uma vitória tranquila no jogo 7 em casa. A derrota não doeu apenas pela oportunidade perdida, mas marcou basicamente o fim da era Chris Paul em Los Angeles. O time nunca mais foi o mesmo, a dinâmica interna ficou visivelmente estremecida, e o time amargaria mais duas eliminações de primeira rodada até Paul forçar uma troca para o Houston Rockets —iniciando o caminho que eventualmente o levaria até os Suns. Não é à toa que Paul se sentiu desconfortável para discutir a vantagem de 3-1 quando perguntado sobre o assunto em uma entrevista pós-jogo; foi a pior derrota da sua carreira.

Será que os Clippers de 2021 podem repetir essas façanhas e se tornarem apenas o 14º time a vencer uma série depois de estar perdendo por 3-1? O caminho ainda é bem difícil, mas eles deram um primeiro passo importantíssimo ao vencer o jogo 5 em Phoenix com mais uma grande atuação de Paul George. Talvez mais importante, fizeram isso e venceram com propriedade um jogo no qual os Suns tiveram Paul E Booker jogando bem ao mesmo tempo, a primeira vez que isso acontece na série. A defesa foi excelente mais uma vez, o ataque conseguiu, finalmente, entrar e pontuar no garrafão depois de terem sido apagados por Ayton no jogo 4, e agora o time tem um jogo em casa para tentar igualar a série e forçar o jogo 7.

E, nas palavras do imortal Kevin Millar, em jogo 7 tudo pode acontecer.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL