O que o Brasil precisa fazer para conquistar a vaga olímpica no basquete

Quando primeiro foi anunciada a chave do Brasil no Pré-Olímpico do basquete masculino para a Olimpíada de Tóquio, a reação em geral foi de pessimismo. Vindo de um Mundial decepcionante, a seleção brasileira tinha caído junto de duas potências europeias, Croácia e Rússia, e apenas o campeão de cada chave avançava para Tóquio. A vaga, então, parecia improvável para a seleção brasileira.

Mas, depois da vitória maiúscula sobre a boa seleção do México nas semifinais do Pré-Olímpico por 102 a 74, o Brasil se encontra a apenas uma vitória dos Jogos Olímpicos e vai disputar a tão sonhada vaga contra a Alemanha, às 14h30 do domingo (4). E, se dois anos atrás esse era um confronto que assustaria até o mais otimista torcedor brasileiro, dessa vez o Brasil chega ao jogo decisivo, embalado depois de três atuações de gala contra boas seleções da Tunísia, Croácia e México na competição. A seleção tem jogado de longe o melhor basquete de qualquer time na chave de Split, e se usarmos esses jogos de parâmetro então o Brasil deve ser considerado favorito.

Mas final é final, e 40 minutos de sofrimento e tensão ainda nos separam de Tóquio. E, para conquistar a vaga, o Brasil precisa prestar atenção em alguns pontos-chave.

1. Acertar as bolas de três pontos

Na vitória sobre o México na semifinal, o Brasil acertou incríveis 18 bolas de três em 34 tentativas, um aproveitamento acima de 52%. Isso manteve o padrão do Pré-Olímpico até aqui, no qual as bolas longas têm sido a grande arma ofensiva do Brasil: o aproveitamento da seleção em Split é de 48% nesses três jogos, liderando com folga todas as seleções da sua chave.

Manter esse aproveitamento tão alto em uma amostra maior é sempre difícil, talvez até impossível. Alguma regressão, muito provavelmente, vai chegar para o Brasil eventualmente, mesmo com o time ostentando tantos bons arremessadores.

Mas, ainda que parte de arremessar bem seja, digamos, acertar os arremessos, ajuda muito quando você está criando os chutes certos, e é isso, acima de tudo, o mais encorajador que o Brasil tem mostrado até aqui: sua capacidade de distribuir a bola, rodar o perímetro e achar os arremessadores com espaço e equilibrados para as bolas de três. As bolas de três, nesse caso, são a consequência de um bom trabalho de atacar o aro, atrair a defesa e passar a bola para o espaço.

Esse elemento vai ser chave contra a Alemanha, um time que, apesar de não ter acertado ainda seus chutes de fora nesse torneio, ainda é extremamente perigoso com as bolas de fora. Se o Brasil levar vantagem no volume ofensivo do perímetro, movimentando a bola ao invés de se contentar com arremessos difíceis, vai ser meio caminho andado para a vitória

2. Usar todo o elenco

Se o Brasil não tem no time um astro como Bogdanovic, da Croácia, ou Gustavo Ayon, do México, compensa isso com o elenco mais completo da competição. A distinção entre titular e reserva é praticamente irrelevante. Todos os 12 jogadores estão sendo utilizados pelo técnico Aleksandar Petrovic, e em três jogos o Brasil já usou três formações iniciais diferentes.

Essa profundidade é o grande trunfo da seleção brasileira, porque permite ao time manter o nível e a intensidade por todos os 40 minutos da partida, independentemente de quem esteja em quadra. Muitas das vitórias do Brasil têm vindo em decorrência disso: o jogo começa equilibrado, mas quando os elencos começam a rodar, os reservas brasileiros mantêm o nível e a agressividade, enquanto os adversários perdem o ímpeto sem os titulares. E, quando o México tentou manter os titulares em quadra, acabou pesando a falta de energia: todas as três estrelas do México jogaram mais de 30 minutos, enquanto ninguém no Brasil passou de 22. Essa profundidade também permite a Petrovic usar diferentes formações e estilos, dependendo do adversário ou do momento do jogo, sem perder em qualidade.

Isso vai ser importante não apenas ao longo do confronto, para controlar os ajustes e se adaptar a cada situação, mas também para iniciar o jogo contra um adversário com tantas opções e variedade ofensiva. Não ficaria surpreso de ver novamente Petrovic se aproveitando disso para colocar Rafa Luz novamente de titular, talvez acompanhado de Georginho, o tipo de ajuste defensivo para atrapalhar o ótimo ataque da Alemanha.

E por falar em variação defensiva...

3. Usar bastante Lucas Mariano

Os três pivôs do Brasil em Split - Lucas Mariano, Varejão e Hettsheimer - estão jogando o fino da bola no Pré-Olímpico. Isso é excelente para a equipe, não apenas pela produção direta que eles trazem, mas porque são três jogadores com características diferentes que oferecem excelência em aspectos diferentes do jogo dependendo da necessidade do time. Petrovic usou os três em diversos momentos, e todos corresponderam muito bem quando chamados.

E, contra a Alemanha, eu acredito que Mariano será a peça-chave no garrafão. A principal qualidade da Alemanha é seu jogo de perímetro, em especial com seus jogadores de garrafão, Mo Wagner e Johannes Voigtmann, atacando de fora, e Mariano é de longe o pivô mais móvel e ágil do Brasil. Quando Varejão e principalmente Hettsheimer estão em quadra, o Brasil procura ser mais conservador na sua defesa, mantendo os dois perto do aro e fechando o garrafão. A mobilidade de Mariano, no entanto, permite a ele ser mais agressivo longe da cesta, o que vai ser fundamental contra a dupla de pivôs alemã. Não que Varejão e Hettsheimer não terão seu papel importante, como todos que entrarem em quadra, mas Mariano parece o pivô mais bem equipado para enfrentar os europeus sem comprometer defensivamente e deve ter a maioria dos minutos.

4. Manter a estabilidade emocional

Justo ou não, o basquete brasileiro nos últimos muitos anos ficou marcado por uma certa fragilidade emocional, um time que tem o talento para vencer qualquer um, mas que frequentemente atira no próprio pé nos momentos decisivos (o termo "bola do Nocioni" traz lembranças?). E esse é um momento decisivo para todo um ciclo, então não é incomum ver os torcedores brasileiros nervosos com a perspectiva de outro colapso.

Uma coisa eu fico confiante em afirmar: o Brasil é melhor que a Alemanha. Isso obviamente não garante vitória, porque essa é a magia dos esportes, mas se o Brasil jogar o seu jogo, é o favorito. E, para isso, vai precisar de frieza, cabeça no lugar, e estabilidade emocional.

O que, vale deixar claro, tem sido uma marca desse torneio até aqui para o Brasil. A semifinal contra o México, a meu ver, deixou isso incrivelmente evidente: o time começou nervoso, jogando mal, e deixou o adversário abrir 10-3 logo de cara. E só precisou de um pedido de tempo de Petrovic para o time voltar com a cabeça no lugar, jogar seu melhor basquete e colocar o jogo no bolso. E, toda vez que o México tirava a vantagem ou acertava um golpe, o Brasil não entrava em pânico, logo respondia, e mantinha o controle total. Foi inspirador ver um aspecto tão questionado da seleção funcionar como uma força em um jogo decisivo, e com essa mentalidade no jogo de domingo, o Brasil tem totais condições de vencer a Alemanha e voltar para o lugar que merece: na elite do basquete mundial.