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Ela treinava com Laís e precisou de ajuda para superar trauma do acidente

Josi chora depois de participar da Olimpíada de Sochi, em fevereiro - AP Photo/Andy Wong
Josi chora depois de participar da Olimpíada de Sochi, em fevereiro Imagem: AP Photo/Andy Wong

Dê Rana

Do UOL, em São Paulo

20/08/2014 06h00

Dois quilos e uma decisão da comissão técnica de ginástica tiraram de Josi Santos o sonho de disputar uma Olimpíada de Verão. Mal saberia a ginasta que, oito anos depois, receberia a oportunidade de enfim se tornar uma atleta olímpica. O sonho, dessa vez, viria como pesadelo: ela estava classificada para o esqui aéreo freestyle nos Jogos de Inverno de Sochi em 2014. A vaga apareceu depois que Lais Souza, sua melhor amiga e companheira naquele momento, se acidentou e estava em um hospital nos Estados Unidos. Seis meses depois de ser última colocada em Sochi, Josi revelou ao UOL Esporte o enorme baque que foi, para ela, aceitar a ideia de competir duas semanas após ajudar a socorrer Lais – que ainda não recuperou os movimentos das pernas - em uma pista de esqui em Salt Lake City, nos Estados Unidos.

“Estava muito mal, muito muito mal mesmo. Aquilo mexeu muito comigo. Todo mundo viu que eu estava muito mal. Recomendaram que eu tivesse um tratamento muito acirrado com psicólogo. Esse tratamento me ajudou bastante”, conta Josi, que passou a fazer uma bateria de sessões com o chileno Gáston Ortiz de Rozas, instrutor de esqui e psicólogo esportivo.
 
“Eu não queria ter ido para a Olimpíada, a verdade é essa”, revela Josi, contando que conversou com Lais, ainda nos Estados Unidos, e ouviu da amiga o pedido: “Pretinha, vai, é o seu sonho”. Josi foi até Sochi uma semana e meia antes de competir para que, na Rússia, tentasse esquecer um pouco das dificuldades que a amiga passava nos EUA. Na época, chegou à Vila Olímpica jurando à imprensa que competiria. Mas não era bem assim. Ela ainda estava emocionalmente destruída.
 
Em Sochi, foram pelo menos três horas diárias com o psicólogo. “Conversa de tudo, não só do acidente, mas sobre o treinamento, vida pessoal. Foi um tratamento para eu esquecer e me concentrar”, conta Josi.
 
Na sexta-feira em que competiu, dia 12 de fevereiro, a brasileira passou longo tempo ao lado de Gastón. “A gente saiu para esquiar, para relaxar. Eu ainda estava muito tensa, emotiva. Não só em relação ao acidente, mas ao meu joelho, que estava lesionado. Ele sempre dizia que eu já era uma atleta olímpica, mas eu sabia que só seria uma atleta se eu competisse.”
 
Josi competiu com o joelho direito lesionado e fez os saltos mais simples de toda a competição.  “Os médicos não estavam querendo me deixar competir. Pedi pelo amor de Deus para competir”, revelou ela, ainda em Sochi. Agora as dores passaram e as consultas com o psicólogo são esporádicas. “O acidente já foi passado. Não estou tendo mais contato direto [com psicólogo], só uma vez ou outra. Isso me ajudou a entender e a superar.”
 
Aos 30 anos, ela ainda não sabe seu futuro no esqui aéreo. Nas últimas semanas, participou de dois campings em São Roque (SP), onde a Confederação Brasileira de Desportos na Neve (CBDN) montou um centro de treinamento. Recentemente, Ana Mussi e Mariah Soares, também ex-ginastas foram escolhidas em uma seletiva e devem se juntar a Josi.
 

A crise do peso que encerrou a carreira na seleção de ginástica

Seis anos atrás, meses antes dos Jogos de Pequim de 2008, Josi ganhou a medalha de prata no salto no Campeonato Brasileiro de Ginástica Artística, perdendo só para Jade Barbosa, na época a grande revelação do país. Mas a atleta de São Vicente (SP) não iria à Olimpíada. Dois anos antes, havia sido expulsa da seleção brasileira por causa do peso.

“Pesava 48kg, cheguei a 45kg na seleção, mas queriam que eu mantivesse esse peso. Não conseguia fazer mais nada, ter ânimo para treinar. Eu era muito alegre, extrovertida. A ginástica era uma diversão para mim. Mas eu não estava sendo essa pessoa. Isso foi mexendo muito com a minha cabeça, queria voltar pra casa, depressiva. Comecei a comer, comer, comer. Cheguei a 50kg e eles cobraram. Falei: ‘Meu, não é isso que eu quero’. Quando viram meu peso, falaram: ‘Pode pegar suas coisas e ir embora’. Eu voltei para São Paulo feliz da vida”, conta.


“Eles” é a comissão técnica liderada pelo ucraniano Oleg Ostapenko, apontado como o grande nome por trás da melhor fase da ginástica artística feminina do Brasil, mas também muito criticado por seu método repressor de trabalho na seleção permanente, que treinava no Rio.


“Eu relevei o que aconteceu comigo e continuei treinando. Mas muitas que foram para a seleção permanente sofreram algum tipo de lesão e foram descartadas. Isso foi fazendo com que atletas fossem descartadas desistissem de chegar à seleção, ir à Olimpíada, isso atrapalhou muito. A Jade ficou de fora da última Olimpíada por causa de problemas internos. Ela conseguiu dar a volta por cima, mas outras não tiveram cabeça, paciência”, lamenta.