A F1 pode estar parada, mas não está inerte
Mesmo sem nenhuma atividade de pista, o automobilismo mundial ainda teve o que falar ao longo desta última semana. Nem todas são boas notícias, como era de se esperar; outras são excelentes. A melhor delas é o projeto Pit Lane, que reúne as sete equipes de Fórmula 1 com sede na Inglaterra e os engenheiros da University College de Londres, uma das melhores universidades da atualidade.
O primeiro resultado foi um respirador aperfeiçoado pelo setor de motores da Mercedes. Outros certamente virão rapidamente, consolidando da forma mais positiva a imagem da F1, compensando os danos sofridos pela hesitação que antecedeu o cancelamento do Grande Prêmio da Austrália.
Ninguém melhor que os engenheiros para mostrar ao mundo como reagir às necessidades com rapidez e eficiência. Acostumados a trabalhar em espaços de tempo extremamente curtos, eles mesmos criam as ferramentas e os aplicativos com que mudam um carro de ponta a ponta para ganhar um décimo de segundo.
São cérebros privilegiados, capazes de aperfeiçoar os mínimos detalhes de qualquer sistema. Revê-los, detectar o que pode ser mais eficiente, testar as novas ideias e colocá-las em prática é o que eles fazem da tarde das sextas-feiras até as manhãs de sábado.
Mas essa capacidade extrema, valiosíssima, passa despercebida nas transmissões de TV e no noticiário em geral. Essa genialidade só se torna evidente em momentos como esse, quando eles se reúnem para amenizar o sofrimento das vítimas da pandemia e, em alguns casos, salvar vidas.
Se a Fórmula 1 apregoa para o mundo os benefícios (altamente discutíveis) dos motores híbridos, é hora de voltar seus olhos para a realidade e render homenagens aos homens que fazem dela uma atividade de alta importância estratégica para toda a humanidade quando a necessidade se faz presente.
Outra boa nova foi a doação de Ron Dennis de 1 milhão de libras (cerca de R$ 6,430 milhões) à ONG SalutetheNHS.org que ele mesmo criou para fornecer alimentação gratuita para profissionais das UTIs inglesas durante três meses.
Visto (com inteira justiça) como um dos membros mais exigentes, mais duros e acima de tudo mais competentes da história da F1, Dennis fundou a empresa de cattering Taste Absolute, em 1997. Já desligada do grupo McLaren, ela ainda presta serviços para algumas equipes da F1, além da Fórmula E, a Regata Oceânica Volvo, o time Manchester City e várias frotas de jatos particulares.
Hoje, porém, a Taste está na mesma situação das equipes da Fórmula 1: sem corridas, a coluna de débitos de sua planilha ameaça superar a de créditos. Segundo Zak Brown, o CEO da McLaren, há possibilidades de até quatro equipes não sobreviverem às agruras deste ano. Ele aponta a melhor solução: o rebaixamento do limite de gastos das equipes que será introduzido em 2021.
UMA LIMITAÇÃO INSUFICIENTE
Estabelecido em 175 milhões de dólares por ano (cerca de R$ 915,250 milhões), este teto deveria ser rebaixado para 150 milhões de dólares (algo como R$ 786 milhões). Brown afirma que já há concordância unânime das dez escuderias e uma das três grandes está disposta a reduzir ainda mais esse limite. Nomes não foram citados, mas acredita-se que a Ferrari e a Red Bull são as que se opõem a essa redução extra.
Segundo a avaliação de Brown, a F1 pode conviver com a perda de uma, vai sofrer com a perda de duas, mas não tem como suportar se esse total chegar a três. E que esse risco só pode ser afastado com a redução imediata do limite de custos.
Ele defende um teto de 100 milhões de dólares (próximo dos R$ 524 milhões), os mais realistas rejeitam a possibilidade desta quantia ser inferior a 125 milhões (por volta de R$ 655 milhões). Sua escuderia foi a primeira a reduzir os salários dos diretores e de seus pilotos, Lando Norris e Carlos Sainz, além de licenciar parte dos funcionários - medida adotada também pela Williams nesta segunda-feira.
Esse quadro já justifica uma das decisões impostas pela FIA: o congelamento completo dos motores. Esse item exige investimentos que, na situação atual, podem levar à desistência ou à falência das equipes menos privilegiadas. Que hoje já se veem às voltas com a perda ou redução das verbas de patrocínio e do bolo de premiação do campeonato mundial de construtores.
Outra mudança importante é acabar com a unanimidade exigida das equipes para serem feitas alterações em alguns itens na F1 - a partir da última semana, basta a aprovação de 60 por cento das equipes, o que reduz drasticamente o poder das três grandes, Mercedes, Red Bull e Ferrari.
Outra modificação importante é a atribuição de poder absoluto à FIA e à Liberty Media, a detentora dos direitos comerciais (que pode ser vista, na prática, como a dona da categoria) de alterar o calendário. Neste novo quadro, medidas como a redução das atividades de pista de três para dois dias a cada grande prêmio, reduzindo gastos e desgaste de todos profissionais envolvidos na F1.
Uma má notícia com um lado positivo foi o rebaixamento das ações da F1 na bolsa eletrônica NASDAQ pela Moody's, uma das três maiores agências de avaliação de riscos de crédito. Em consequência da queda vertical de seus preços, sua avaliação passou de positiva para negativa.
O aspecto positivo é a própria Moody's ter afirmado que "a F1 tem liquidez e flexibilidade da base de custos suficientes para administrar o encurtamento da temporada de 2020 ou até mesmo seu cancelamento total". Ou seja, a F1 tem pela frente um período ainda duro, mas a sobrevivência está garantida.
Pai novo, mas não tanto
Outra notícia, desta vez surpreendente, é de que, aos 89 anos, o ex-todo-poderoso da F1 Bernie Ecclestone vai ser pai. Ele confirmou que sua esposa atual Fabiana Flosi, de 46 anos, está esperando um bebê do sexo masculino para meados deste ano. Bernie tem três filhas: Deborah, de 65 anos, com sua primeira esposa, Ivy; Tamara, 35 anos, e Petra, 31, de sua segunda esposa, Slavica, de quem se separou em 2009 em um divórcio avaliado em nada menos de um bilhão de euros (algo como R$ 5,65 bilhões).
O que temos para hoje
Enquanto luta para contornar suas agruras, a categoria tenta se manter viva junto ao público com jogos eletrônicos. Seu campeonato oficial teve neste domingo a segunda etapa, marcada pela estreia vencedora de Charles Leclerc. Disputada por diversos nomes ligados à F1, a prova utilizou o traçado virtual do GP da Austrália e teve bons momentos, mas nada que se compare às emoções de uma corrida real.
O mesmo se aplica a outros campeonatos, disputados em plataformas diferentes da utilizada pela F1. No sábado, por exemplo, Rubens Barrichello se tornou o grande vencedor da quarta etapa da The Race All Stars Series, que reuniu nomes como Jenson Button, Dario Franchitti, Kevin Magnussen, Hélio Castroneves e Emerson Fittipaldi.
Junto a eles, são disputados alguns outros torneios, como o Veloce Esports Not the GP Series. A última etapa foi disputada neste fim de semana e teve vitória do piloto da McLaren Lando Norris. Mas para isso ele teve de vencer em uma melhor de três o gamer Benjamin "Tiametmarduk" Daly, que eliminou outros pilotos "verdadeiros" nas várias baterias classificatórias, todas disputadas por apenas dois pilotos por vez.
Em si, o espetáculo desses torneios virtuais é um bom divertimento, mas deixa clara sua limitação como treinamento. Se serve como bom exercício de reações olhos/mãos e até de estratégia de corrida, a falta das forças físicas que atuam sobre os carros nas pistas reais permite aos melhores amadores se equipararem aos profissionais.
Melhores dias virão. Têm de vir.
HoJe, a partir das 20h30, eu e o Cassio Politi receberemos o jornalista Rodrigo Gini em um a live no YouTube para analisar o momento atual e o futuro próximo da Fórmula 1. Quem quiser acompanhar e participar com perguntas, o link é este.
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