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Brasileiro teve que correr ao criar capacete de Hamilton com tema LGBTQIA+

Lewis Hamilton usa capacete com arco-íris para o GP do Qatar de Fórmula 1 em 2021 - REUTERS/Thaier Al-Sudani
Lewis Hamilton usa capacete com arco-íris para o GP do Qatar de Fórmula 1 em 2021 Imagem: REUTERS/Thaier Al-Sudani

Arthur Sandes

Do UOL, em São Paulo

20/11/2021 04h00

Faltavam apenas dez minutos para a largada do GP de Interlagos, no último domingo (14), quando Raí Caldato terminou o desenho do mais novo capacete de Lewis Hamilton, pintado em tempo recorde e finalizado a tempo de o heptacampeão usá-lo nos treinos livres do primeiro GP do Qatar da história da Fórmula 1, ontem (19). A pintura destaca a bandeira LGBTQIA+ e é um ato político em um país que prevê até pena de morte a homossexuais.

Brasileiro, Caldato estabeleceu parceria com Hamilton em 2017 e desde então é chamado com frequência para desenhar os capacetes do piloto britânico. Em Interlagos a pintura homenageou Ayrton Senna; no Qatar Hamilton preferiu marcar posição.

"O pedido veio do próprio Lewis, já quase 23h da noite da sexta-feira, na semana passada. Já fui dormir sonhando com o capacete, para acordar e saber o que fazer no dia seguinte. Ele mandou a bandeira do LGBTQIA+, aquela criada pelo Daniel Quasar, e disse que gostaria de um capacete com estas referências", conta Raí Caldato em entrevista ao UOL Esporte. Ele passou o sábado inteiro no desenho até terminá-lo pouco antes da corrida.

"Foi bastante em cima da hora. No final eu estava um pouco tenso já, com a largada da corrida", diz o designer. "O tempo ideal de pintura de um capacete é de pelo menos quinze dias, mas este eu passei [o desenho] no domingo para ficar pronto na quinta, um dia antes dos treinos livres. Foi bem puxado. A Bell [empresa responsável pela pintura e parceira da F1] teve menos de uma semana para pintar."

O acaso ajudou Caldato em sua missão contra o tempo. Em condições normais ele estaria em Interlagos, convidado pela própria Mercedes para acompanhar o final de semana de perto, mas a covid-19 impediu a equipe de receber visitantes no paddock.

"Até pediram desculpas, ofereceram comprar um ingresso para mim, mas como tenho uma filha de dez anos que ainda não se vacinou, preferi ficar em casa", conta o designer. "Esta acabou sendo a sorte, porque em casa eu estava com o computador e o software quando o Lewis pediu o capacete. Moro em Campinas-SP [a 100km de São Paulo], e não sei como faria se fosse para a corrida, teria que correr."

Com o capacete feito por Raí Caldato, Lewis Hamilton teve apenas o quarto melhor tempo nos dois primeiros treinos livres do GP do Qatar (1:23.570), mas a Mercedes liderou com Valtteri Bottas. A programação do final de semana prevê neste sábado (20) mais um treino livre às 8h (de Brasília) e a classificação às 11h, com a corrida às 11h de domingo (21).

É a primeira vez que uma corrida de Fórmula 1 acontece no Qatar, um dos países do calendário que é acusado com frequência de não garantir direitos fundamentais a todos os seus cidadãos. Há acusações de exploração de trabalhadores nos preparativos para a Copa do Mundo de futebol, por exemplo, e grupos de defesa dos direitos humanos denunciam leis que oprimem mulheres e pessoas LGBTQIA+. Hamilton falou sobre o assunto nesta semana.

"Estamos cientes destes problemas nos países em que visitamos [com a F1], mas é claro que [o Qatar] parece ser considerado um dos piores desta parte do mundo. À medida que os esportes vão para esses lugares, têm o dever de conscientizar sobre essas questões. Esses lugares precisam passar por um escrutínio, porque direitos iguais é um assunto sério", afirmou o heptacampeão mundial.

Discriminação no Qatar

Pessoas lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros estão sujeitas a processos legais e à prisão simplesmente por suas orientações sexuais. Desde 2004 o Código Penal do país prevê multa e prisão de um a três anos para homens homossexuais. Se estes homens forem muçulmanos, porém, a punição pode ser a pena de morte —o país adota a Sharia, o sistema jurídico do Islã.

É consenso entre especialistas que leis deste tipo violam direitos fundamentais. O Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas confirmou já em 1994 que leis que criminalizam relações consensuais entre pessoas do mesmo sexo violam tanto o direito à privacidade quanto o direito à equidade e à justiça sem discriminações.

Ambos os direitos estão previstos no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, tratado assinado por 173 países desde os Anos 1960 e que o Qatar ratificou apenas em 2018.

As leis discriminatórias do Qatar são defendidas publicamente por autoridades do país, que além da estreia da Fórmula 1 ainda tem uma Copa do Mundo de futebol para organizar em 2022. Hassan Al Thawadi, um dos secretários-gerais da organização do Mundial, já disse que torcedores gays devem "respeitar a cultura" local.

"Há uma lista de regras que não são exclusivas do Qatar e são adotadas por uma porção do mundo. Nós pedimos aos visitantes que apreciem e respeitem a nossa cultura", afirmou Al Thawadi em entrevista à Folha de S. Paulo no ano passado. "Exibições públicas de afeto, seja entre homem e mulher ou de outros casais, não fazem parte da nossa cultura, e pedimos que respeitem isso. Não mostrem isso em público."

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