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Promessa que escapou de aborto estreia com status de estrela na NFL

Quarterback do Denver Broncos Tim Tebow durante um evento com jovens nos EUA - Reprodução
Quarterback do Denver Broncos Tim Tebow durante um evento com jovens nos EUA Imagem: Reprodução

Maurício Dehò

Em São Paulo

24/12/2010 07h00

Tim Tebow podia nem ter nascido. Mas, 23 anos depois de um drama, estreou como titular na NFL com status de estrela, um diamante a ser lapidado pacientemente pelo Denver Broncos. Em sua primeira temporada na liga dos EUA de futebol americano, o quarterback vê olhos voltados às suas performances, por conta de uma história de vida muito particular, que passa por temas como aborto, cristianismo, virgindade e, claro, superação no esporte.

Dizer que Tebow poderia nem ter deixado o ventre da mãe não é um exagero. Afinal, ela foi aconselhada a abortar quando estava grávida, nas Filipinas. Os pais, Pamela e Robert Ramsey, eram missionários cristãos no país da Ásia. O problema é que Pamela contraiu uma disenteria amébica, que complicou a gestação e causou um deslocamento da placenta.

Mas, apesar de os médicos aconselharem a interrupção da gravidez, Timothy Richard Tebow cresceu bem, após um início de vida tormentoso, por ter nascido fraco e com complicações nas Filipinas – dificuldades muito bem superadas pelo corpulento jogador de 1,91 m e 111 kg.

UM QUARTERBACK À LA KAKÁ:
Linha virgem e pró-vida causa polêmica

  • Getty Images

    Tim Tebow tem um estilo de vida que muito se assemelha ao do brasileiro Kaká, marcado pela vida religiosa, paralela às conquistas feitas no âmbito esportivo. O quarterback afirmou em 2009 que vai preservar sua virgindade para o casamento. Além disso, até por conta de quase não ter nascido devido aos conselhos dos médicos para que fosse abortado, passou a integrar movimentos pró-vida, o que gerou polêmica nos Estados Unidos.

    O que mais gerou repercussão foi a participação em um comercial no intervalo do Super Bowl deste ano, em que apoiou a organização Focus on the Family. Sua história fez parte do vídeo veiculado na TV. Mesmo não sendo citada diretamente uma posição contrária ao aborto, o anúncio foi visto desta maneira por muitos espectadores, gerando assim o debate.

    Outra polêmica de Tebow foi pelo fato de ele passar mensagens durante suas partidas como universitário. Além de pintar duas faixas pretas sob os olhos, algo costumeiro na NFL, ele colocava nelas, em branco, passagens da Bíblia. Durante suas partidas televisadas, diversas vezes os versículos exibidos por ele foram campeões de acessos em sites de busca. A prática é proibida na NFL e também acabou vetada na liga universitária.

Mesmo no futebol americano, as dificuldades foram grandes para o apelidado “Super-Homem”. Como recebia aulas da própria mãe, em casa, teve um caminho mais árduo para entrar em um time colegial e, quando conseguiu, foi alvo de críticas. Provou no campo sua qualidade, passando com grandes marcas à liga universitária, em que é considerado por muitos o maior jogador da história do campeonato.

A trajetória o levou a ser escolhido pelo Denver Broncos no draft, na 25ª posição da primeira rodada. Nesta semana, depois de um início de temporada cauteloso e com poucas entradas, ele começou pela primeira vez um jogo, devido a lesão do quarterback titular Kyle Orton. “A lenda universitária fará sua estreia”, disseram os sites norte-americanos, sobre o ex-jogador da Universidade da Flórida.

Diante do Oakland Raiders, fora de casa, o camisa nº 15 acabou derrotado por larga vantagem dos rivais, por 39 a 23, mas mostrou porque tem potencial, com dois touchdowns. Um deles foi num passe longo e de precisão milimétrica, de 33 jardas. O outro foi mostrando uma habilidade especial, a de correr com a bola, aproveitando o tamanho e a força dos 111 kg: correu 40 jardas pelo meio da defesa dos Raiders até a end zone. O time precisava de 24 jardas na terceira descida e ele converteu sozinho o touchdown, um recorde do time pela distância para um atleta da posição.

Bom passador e muito bom correndo sozinho, ele foi apenas o terceiro quarterback na história da NFL a combinar as marcas em uma partida: corrida de 40 ou mais jardas para touchdown e anotação em passe de 30 ou mais jardas.

O caso de superação de Tebow foi além do sofrido nascimento e das críticas por ser um aluno independente, ensinado pelos pais. Ele provou por duas vezes sua perseverança, em uma partida atuando com a pé quebrado e, em outra, com uma das mãos fraturadas. Por essas atitudes e por sua qualidade em anotar touchdowns, ele recebeu o prêmio de MVP da liga universitária, o Heisman Trophy, logo no segundo ano de faculdade, em 2007, um feito inédito.

A chegada ao Denver Broncos impulsionou a venda de camisetas, fazendo do time o que mais comercializou as vestes nos primeiros meses da temporada. A nº 15, de Tebow, passou a ser a mais comprada pelos fãs da NFL.

O quarterback bonzinho

No esporte norte-americano, cheio de figuras ostentativas e muitas vezes irresponsáveis, Tim Tebow conquistou parte do público por sua colocação religiosa. Filho de missionários, ele sempre demonstrou publicamente sua fé e até usa isso para seguir os passos aprendidos. Periodicamente viaja às Filipinas para missões, ajudando crianças e outras pessoas em situações miseráveis no seu país natal.

Uma curiosidade é que em 2008 ele foi chamado para participar de um time da pré-temporada que leva o nome da revista Playboy. Como suas convicções batiam de frente com uma possível participação, ele rejeitou o convite.

“Sabe, há muitos líderes por aí. Mas, infelizmente, há poucos bons líderes. Este é o meu sonho. Quero ser alguém que os pais olhem e digam ‘Olhe, esse garoto fez as coisas do jeito certo’. Esse sempre foi meu sonho, mais do que ter um campeonato”, disse Tim Tebow, mostrando ser um possível genro que toda sogra gostaria de ter.