São Paulo e Flamengo, a dupla do barulho
"Futebol é momento", filosofava Nicola Raccioppi, saudoso dirigente do Palmeiras, da época de Academia dos anos 70 e de jejum dos 80. Com essa lógica peculiar, o simpático napolitano tratava de explicar que períodos de crise e de euforia dos times variavam muito e, em certa medida, eram normais. O importante era aproveitar a boa fase, quando ela aparecesse; porque logo poderia passar...
O raciocínio do saudoso Nicolinha vale agora para São Paulo e Flamengo. O amigo há de concordar comigo que tricolores e rubro-negros estão em alta, em contraste com pouco tempo atrás, quando conviviam com decepções e trocas de comando. Hoje, a dupla está em ascensão no Brasileiro, com a mesma pontuação e igual pretensão e chance de título. Os cariocas com o adendo de terem colocado também um pé na semifinal da Taça Libertadores.
A transformação é visível - está na preparação e no desempenho no campo. Tanto são-paulinos como flamenguistas utilizaram com eficiência a pausa no calendário provocada pela disputa da Copa América. Não ficaram à toa e na conversa mole. Jorge Jesus conseguiu conhecer o elenco e passar com clareza sua ideia de jogo. Cuca recebeu novos atletas, definiu o grupo titular e encontrou o caminho de vitórias, após desilusões.
A guinada do São Paulo impressiona, sobretudo no astral. Em meio ano acumulava desclassificação na Libertadores e na Copa do Brasil e o vice paulista. Para complicar, no Brasileiro enxergava o líder Palmeiras só com luneta. Até seis rodadas atrás, brigava para "não fazer feio" e ficar numa situação ao menos digna na competição. Ou seja, parecia ter jogado a toalha e se conformava mais uma vez com o papel de coadjuvante.
Veio o empate com o Palmeiras, na retomada da Série A, e com bom futebol. Daí, emendou cinco vitórias em seguida e agora, não só igualou o rival, como está a dois pontos do topo. Quer dizer: o Tricolor disse "Presente!" na briga pelo sétimo título nacional. Pelo que tem mostrado, e por aquilo que os demais também fazem, não é fora da realidade pensar alto.
Não tem segredo nisso, só constatação: o time deixou de ser aquela bagunça de meses atrás. A defesa alcançou estabilidade, e já está entre as menos vazadas do Brasileiro. O meio-campo se acertou com Tche Tchê, a volta de Liziero, Vitor Bueno e a chegada de Daniel Alves. Na frente, Antony, Raniel e Pato (ele mesmo!) ajustam a sintonia. A maré é tão favorável que Hernanes e Pablo nem têm sido ausências sentidas.
O São Paulo é também mais ligado, mais intenso e mais confiante. Chutou a apatia e sabe esperar a hora para definir. Como se viu na quarta-feira, em Curitiba, diante do Athletico. O roteiro agora está perfeito, e Cuca tem a missão extra de preparar o time para quando vierem turbulências. São inevitáveis. Por isso, repito: é preciso aproveitar o vento a favor.
Vento que sopra muito forte pros lados da Gávea. Afirmo, com algum exagero, com dose de simpatia e acima de tudo com justiça, que o Flamengo é a equipe que mais empolga. Jorge Jesus recebeu um punhado de opções de qualidade e, sem ficar enrolando, já as inseriu na equipe. Rafinha, Pablo Marí, Filipe Luís e (aos poucos) Gerson se sentem "veteranos", atuam como se fossem velhos de casa.
A defesa encontrou equilíbrio, o meio-campo também não sente a baixa de Diego e o ataque resolveu virar arrasador com a fase que vivem Bruno Henrique e Gabigol. Em certos momentos, o Fla troca passes, roda a bola e vai à frente com desenvoltura assustadora. Adversários não têm tido espaço para contragolpes - como ocorreu com o Inter na quarta.
Não me surpreenderá se o Flamengo ou o São Paulo, nessa ordem, estiver na ponta do Brasileiro, na virada do turno. Estão firmes e confiantes. Não ignoro Santos, Palmeiras, Corinthians (outro que sobe muito), Atlético e mesmo o Inter. Não seria leviano a tal ponto, pois o campeonato está nivelado.
Mas a dupla acima é do barulho - e que saiba surfar na onda favorável.
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