Segurar técnico é uma (quase) lenda no futebol
Prezado amigo, de cara e no estilo zagueiro botinudo, entro de sola no tema da crônica de hoje: manter técnico, independentemente dos resultados, é uma lenda do futebol. Ou quase isso. Noves fora os exemplos esporádicos e repetitivos, a praxe tem sido a de optar por permanência do "professor" (ou "mister", que está na moda), se a maré for favorável. Se a canoa virar, arrivederci.
É norma, aqui e no exterior.
Aviso que não prego intolerância e demissão sumária. Tampouco sou defensor ferrenho da estabilidade irrevogável do treinador. Vou pelo bom senso: se o trabalho não for pra frente, não engrenar, não vingar, que pegue as tralhas, passar bem e tente a sorte em outra freguesia. Como numa empresa: se o funcionário não dá conta do recado, não fica para semente.
Muitas vezes, insistir com um técnico em tempos de crise não é sinal de coerência e bom caráter do cartola, mas relutância em admitir erro. Erro na origem, na hora da contratação. O que não falta é dirigente atirar para qualquer lado, apelar para o primeiro nome disponível, fingir que tem um "projeto" e só depois se dar conta que pisou na bola. Daí vêm a dispensa, a busca por outro salvador da pátria e... a repetição de roteiro viciado.
Dá para contar nos dedos os clubes fiéis a um planejamento ou que têm segurança nos rumos que pretendem seguir. Na história recente, citaria o Barcelona ao apostar em Guardiola, que teve alguns sobressaltos antes de formar time supercampeão. Ou o Manchester City, ao mirar o mesmo Guardiola e ter paciência até as conquistas aparecerem. Só que aí é grife gigante...
Não há mais espaço para um Ferguson no M. United, Wenger no Arsenal, um Guy Roux no Auxerre, Lula no Santos ou um Telê no São Paulo. Gente que passou décadas ou muitas temporadas à frente de elencos, fizesse chuva ou sol. Hoje em dia, tira-se o chapéu para quem ficar no comando por dois ou três anos. Como Renato Gaúcho no Grêmio ou, até recentemente, Mano Menezes no Cruzeiro.
Os clubes têm pressa, necessidade de retorno no investimento e... lhes falta convicção. O rodízio de "professores" faz parte da engrenagem e do espetáculo. A chegada de um técnico desperta esperança e atrai torcida. Se der certo, beleza. Se falhar, troca-se e vida que segue.
(E, no fundo, é até bom para os treinadores, pois há os que ficariam sem mercado, se o critério competência fosse levado a ferro e fogo. Mas essa é outra conversa...)
Claro que o ideal é seguir trilha séria e profissional, com objetivo firmes e de longa duração. No Brasileiro deste ano, por exemplo, a maioria das equipes que ocupam a primeira página na classificação está sob a mesma direção desde o início. Santos, Grêmio, Athletico, Bahia. Parabéns para elas, sinal de que acertaram na escolha, conscientemente ou não.
E como explicar que os dois primeiros colocados trocaram com o campeonato em andamento e se deram bem? Também seguiram o pacote habitual: o Flamengo corrigiu rota em tempo, ao perceber que Abel estava aquém do esperado. Mirou em Jorge Jesus e foi de felicidade tremenda. Já o Palmeiras só se mexeu ao notar que a eficácia de Felipão se esgotara. (Tenho cá minhas dúvidas se Mano faz parte de projeto de longo prazo ou foi emergência.)
O Corinthians agora está no centro do tufão, com Fábio Carille. Prata da casa e promovido a técnico titular em época de vacas magras, quase três anos atrás, ganhou Estaduais e até Brasileiro. Com um detalhe: sem contar com tropa estrelada, o que valorizou a proeza. Parecia um gênio tirado de lâmpada mágica. O encanto pelo visto se quebrou.
Moral da história 1: escolha de técnico ainda tem muito de aleatório e pouco de "científico".
Moral da história 2: manter treinador com time em crise é rabo de foguete que raros seguram.
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