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Blog da Amara Moira

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Que o São Paulo no Allianz ajude a acabar com a torcida única

14/03/2023 10h30

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Quem fosse bisbilhotar nas redes sociais de palmeirenses, antes da partida entre São Paulo e Água Santa no Allianz Parque, veria o predomínio de posições inconformadas. Muito torcedor incomodado com a decisão da presidente Leila Pereira, que assinou o acordo bilateral que permitiu ao Palmeiras enfrentar o Santos no Morumbi e, pela reciprocidade, levou o São Paulo a mandar seu jogo de quartas de final do Paulistão no estádio do Palmeiras. Minha opinião, no entanto, vai no extremo oposto dessas posições.

Tenho memórias muito bonitas de, na infância e adolescências, ir a estádios os mais variados com meu pai para acompanhar os confrontos tanto do Santos, time do coração dele, quanto do Palmeiras, que o destino colocou na minha vida. Era tenso, por conta do medo permanente de violência, mas me fazia acreditar que estávamos construindo uma sociedade em que pessoas que pensam diferente ou (o que deveria ser ainda mais simples) que torcem para times diferentes conseguiriam conviver numa boa.

Todo o contrário do que temos visto na atualidade, com a medida populista da torcida única se fortalecendo no estado de São Paulo e até sendo exportada para outros cantos do país. Alguma coisa mudou no nosso sentimento de segurança, após a implementação dessas medidas? Nada, mas parece que até conversar sobre a possibilidade de um retorno à realidade antiga vai se transformando em tabu.

Eu sou de Campinas, nasci e vivi lá a maior parte da vida, mas, na partida da última rodada da primeira fase do Campeonato Paulista (5/3), não pude ir ao estádio do Guarani, o Brinco de Ouro da Princesa, para assistir ao confronto com o Palmeiras. Mesmo estando na cidade. Por quê? Porque a medida da "torcida única" afeta, inclusive, os times campineiros, e não apenas quando disputam entre si, mas também quando enfrentam os quatro grandes do estado.

Conversei com amigos que frequentam o estádio, para saber se seria perigoso eu ir à partida na torcida do próprio Guarani, e me garantiram que seria arriscado, pois torcedores bugrinos mais fanáticos, já imaginando que muito palmeirense recorreria a essa tática, costumam parar pessoas "suspeitas" e ver se elas sabem o hino do time. Se não souberem cantar o hino, o risco é grande de armar-se uma confusão e a pessoa ter que abandonar o estádio escoltada. No meu caso, sou uma figura mais conhecida e o risco é ainda maior.

No entanto, o Brinco de Ouro estava com menos de metade da sua ocupação. Apesar de cerca de 30 mil lugares, apenas 12.593 torcedores foram ao estádio, o maior público da temporada. Imaginem o quanto o próprio Guarani não lucraria, se pudesse ter o seu estádio lotado. Ou vocês acham que não existem palmeirenses em Campinas?

Por isso, o acordo firmado entre Palmeiras e São Paulo, para poderem um usar o estádio do outro em dias pré-determinados, me pareceu tão salutar. Foi um primeiro passo para recuperarmos a nossa própria capacidade de conviver com torcidas adversárias, sem termos que nos considerar inimigos mortais por conta disso. Não fosse isso e nem sei quando é que eu poderia conhecer o Morumbi, não fosse isso e quantos são-paulinos jamais conheceriam o Allianz.

Foi lindo ver ontem a torcida do São Paulo fazendo a festa no Allianz, consumindo nos bares palmeirenses do entorno do estádio e, por que mentir, né?, sendo eliminado lá dentro mais uma vez. A zoeira faz parte, as provocações fazem parte, a rivalidade é do jogo. O que não podemos naturalizar é a ideia de que somos incapazes de conviver pacificamente uns com os outros e apenas a segregação daria conta de nos manter a salvos de nós mesmos.