Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Uma carta de amor ao povo do Nordeste brasileiro
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Esta semana participei do Cast FC, do ótimo ex-jogador Chiquinho, pernambucano, criado na base do Sport. Ele fez parte de um grande time que tinha também Juninho Pernambucano, Leonardo, o zagueiro Sandro, entre outros.
Na conversa sobre futebol, aprofundamos bastante a minha relação com o Nordeste, em todos os sentidos. Então eu, um 'sudestino', resolvi escrever uma carta de amor a todos os 'nordestinos'. Porque, afinal, somos todos brasileiros.
Ao povo do Nordeste brasileiro, com todo amor:
Eu, quando bem garoto, apaixonado por futebol, colecionava todos os álbuns dos campeonatos, tinha vários jogos de botão e, claro, acompanhava o Campeonato Brasileiro — que, na década de 1970 e 1980, era disputado por vários times, muitos do Nordeste do país.
Adorava assistir os gols do Fantástico aos domingos, só para ver esses times. E assim fui criando ídolos das grandes equipes da região.
Beijoca, Baiaco, Douglas e Léo Oliveira, do Bahia; Osni, André Catimba e Mário Sérgio (carioca), do Vitória; Jorge Mendonça e Vasconcelos, do Náutico; Fumanchu, Nunes, Pio, Mazinho e Levir, do Santa Cruz. Também me lembro de verdadeiros craques como Assis Paraíba e Hamilton Melo, do Fortaleza. E assim seguia por todos os times...
Tenho ídolos por todas as regiões do país, e quando comecei a jogar no profissional do Corinthians, eu estudava a tabela para saber quando iríamos jogar no Nordeste.
Sabem por quê? Porque eu queria enfrentar aqueles times todos, talvez até enfrentar alguns ídolos de infância. E também porque queria ver a beleza das praias, ter a curtição dos barzinhos e da música que eu gostava desde a minha adolescência.
Cresci ouvindo a MPB produzida por compositores, cantores e cantoras do Nordeste, que era a minha preferida, aquela que mais mexia com o meu emocional, balançava os meus sentimentos.
Geraldo Azevedo e seu Táxi Lunar, que virou um hino para os hippies, que eram a minha tribo.
Alceu e o Espelho Cristalino, mostrando os ritmos nordestinos misturados com rock.
O Pavão misterioso Ednardo, cantando Enquanto engomo a calça e Manga Rosa, era de viajar e curtir.
Acabou Chorare, dos meus amigos dos Novos Baianos. E com a voz do Paulinho Boca, me identificava como um Mistério do planeta.
Zé Ramalho, com o seu Avôhai, mostrando a importância de ter um avô, mas sempre pisando no seu Chão de Giz.
Maria Bethânia, com discos que amo muito, como Álibi e Mel. E Gal, sempre divina e maravilhosa.
Sem contar Caetano, Gil, Dominguinhos, Luiz Gonzaga...
E não posso esquecer do poeta que, para mim, melhor definiu as dificuldades da juventude da minha geração. Belchior mexia muito comigo, por eu ser também um simples rapaz latino-americano, sem dinheiro no bolso.
Desde então, o Nordeste para mim é uma paixão. Não estou falando de política (ainda), mas, sim, de amor.
No ano de 1982, fui o terceiro artilheiro do ano (com 39 gols), e a Adidas entregava a Chuteira de ouro, prata e bronze. A festa era sempre na sede do time do jogador que fez mais gols. Como o jogador Baiano, do Náutico, ganhou a Chuteira de ouro, a festa foi na sede do seu clube. Foi uma festa maravilhosa, e eu peguei um carinho enorme pelo Náutico.
Fui para o Nordeste diversas vezes nos anos seguintes, para jogar campeonatos, e comecei a fazer amizade com pessoas super acolhedoras e carinhosas.
E o que dizer das praias maravilhosas de toda a orla? Depois que voltei da Europa, minhas férias eram sempre no Nordeste brasileiro.
Meus filhos (Victor Hugo, Leonardo e Symon) cresceram passando férias em Ilhéus. Tanto que Symon, o mais novo, entrou pela primeira vez no mar, de fraldinha, naquelas águas.
Depois virei comentarista, e aí ficou muito divertido. Porque eu trabalhava, mas no tempo livre saía para jantar e jogar futebol.
E me lembro de três situações maravilhosas. As duas primeiras foram cobrindo um torneio que se chamava Copa dos Campeões, em que o vencedor se classificava para a Libertadores. Eram duas sedes: uma era Maceió; a outra, João Pessoa.
Por dois anos fiquei na capital alagoana, e todos os dias caminhava na praia pela manhã e, no final da tarde, jogava beach soccer. Um lugar maravilhoso, assim como os Lençóis Maranhenses, com suas dunas fantásticas.
Mas foi durante a Copa América de 2019 que conheci o lugar que mais se conecta ao meu estilo de vida. Quando o Brasil jogou em Salvador, aproveitei a manhã da partida contra a Venezuela (0 a 0) e fui para a vila de Arembepe. Foi onde a Janis Joplin ficou quando veio ao Brasil, e inclusive tem o rancho com o nome dela.
Não poderia deixar de contar que joguei em São Francisco do Conde, uma cidade a 80 km da Salvador de Armandinho, Dodô e Osmar. Naquele período, morei na capital baiana, de frente para o mar, na praia de Piatã, no condomínio Casa Blanca, que os baianos sabem bem onde fica.
Bom, fiz questão de mostrar algumas passagens que tive pelo Nordeste, demonstrando todo o meu carinho por seu povo, sofrido, mas alegre. Um povo que sofre com desrespeito e ameaças. Não só por causa do preconceito social, que é muito forte, mas também por causa do posicionamento em favor da democracia.
No primeiro turno das eleições, o povo nordestino foi um exemplo de cidadania, mostrando total conhecimento sobre a nossa caótica realidade social.
Se o Brasil quiser mudar e ter sua democracia fortalecida, as pessoas de bem deveriam seguir os caminhos do povo de Mãe Menininha do Gantois, Marta, Pitty, Alcione, Jorge Amado, Dorival Caymmi, João Gilberto, Bobô, Elomar, Jackson do Pandeiro, padre Cícero, e tantos outros nordestinos e nordestinas ilustres que estão por aqui ou já partiram, mas que sempre pensaram na liberdade e na democracia brasileira.
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