Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Um dia histórico para a arbitragem feminina: com a palavra, Nadine Basttos
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A Copa aqui no Qatar está super bem organizada, como todas as que fui. Os estádios são lindos, como em todas as outras. Nós, homens, brancos, héteros, não temos do que reclamar. Fazem tudo para a gente. E para as mulheres?
Para se ter uma ideia, estou em um hotel junto com o mestre Juca Kfouri, a jornalista Domitila Becker e a vídeorrepórter Raquel Arriola. Soube que, quando elas desceram dos quartos depois do horário do café da manhã, não foram servidas. Mas, na primeira vez que desci, e muito depois do horário, tomei café normalmente. Conversando, percebemos que elas não foram servidas por serem mulheres.
O Qatar não respeita os direitos humanos, trata as mulheres como seres inferiores e é intolerante com as questões de gênero. São homofóbicos de verdade.
A Fifa, por meio do presidente Gianni Infantino, censurou qualquer manifestação dos jogadores, proibindo inclusive que os capitães usassem a braçadeira "One Love".
Aconteceram alguns protestos por diversas causas durante a Copa, mas existem agentes secretos do departamento de inteligência do Irã que estão aqui para observar o comportamento das mulheres iranianas nos estádios. E também agentes do Qatar no meio dos torcedores para espionarem não só o comportamento das mulheres qataris, mas também gestos de apoio à comunidade LGBTQIA+.
Teve agressões e maus tratos às torcedoras iranianas, como bem mostrou a reportagem da Domitila.
Mas, nesta quinta-feira, no jogo entre Costa Rica e Alemanha, a Fifa escalou um trio de arbitragem totalmente feminino. A árbitra será Stéphanie Frappart, da França, com as assistentes Neuza Back, do Brasil, e Karen Diaz Medina, do México.
Sem dúvida alguma é uma conquista, uma grande vitória. Mas, do meu olhar de homem que defende os direitos humanos, das mulheres e é que contra todos os preconceitos, faz com que eu tenha uma visão um pouco desconfiada dessa escalação.
Para começar, não confio nas decisões da Fifa. Segundo, está parecendo que essa é uma decisão protocolar, como se fosse marcar um cartão. Talvez para tentar mudar os olhares do Ocidente para o machismo violento que existe por aqui.
Se a Fifa tem uma preocupação real com o avanço das mulheres na arbitragem e quer demonstrar que há importância igual aos homens, deveria ter escalado um trio feminino já na abertura, no jogo entre Qatar e Equador. Agora, espero vê-las também no mata-mata.
Como disse, estou bastante feliz com essa conquista feminina. Já contei várias vezes em entrevistas que fui criado e educado por três mulheres. Porque meu pai saia às 5h da manhã para trabalhar e eu ficava desde muito pequeno ouvindo, com muita atenção, os conselhos das mulheres da minha casa.
Cresci com uma visão bastante feminina do mundo, porque foi assim que aprendi as coisas: através do olhar da minha mãe e das minhas irmãs.
Como dizia minha mãe: as mulheres não precisam de homens cuidando delas. Precisam de parceria.
Aqui tive a preocupação de não dar minha opinião, simplesmente, sobre essa conquista da arbitragem feminina. Quis falar com uma mulher, árbitra, para saber sobre a importância e o lado emocional dessa vitória.
Por isso, procurei a ex-ótima auxiliar de arbitragem e ótima comentarista Nadine Basttos, para saber como isso está mexendo com ela.
Com a palavra, Nadine Basttos:
Essa estreia de uma arbitragem totalmente feminina representa a esperança de que as coisas possam mudar, que a inclusão da mulher e os seus direitos sejam de forma igualitária.
Ter um trio arbitragem feminino apitando uma partida de futebol masculina na maior competição do mundo significa que a nossa luta vale a pena, e estaremos sempre em busca dos nossos direitos, cada dia mais fortes, porque merecemos esse espaço. Que esse seja o início de um novo ciclo.
Eu estou extremamente emocionada, sonhávamos com esse dia, e quero aproveitar para parabenizar essas mulheres que merecem muito viver esse momento.
Apesar dessa Copa do Mundo estar sendo realizada em um país com tantas restrições em relação aos direitos das mulheres, nós não vamos deixar de lutar, e que essa conquista histórica seja uma forma de nos unirmos cada vez mais para que os direitos sejam de todos.
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