Casagrande

Casagrande

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
OpiniãoEsporte

Fui campeão europeu jogando pelo azarão. Será que o Dortmund faz o mesmo?

Neste sábado, 1º de junho, teremos a grande final da Champions League entre Borussia Dortmund e Real Madrid, no histórico estádio de Wembley, em Londres. Sem dúvida alguma, a Champions é o torneio de clubes mais importante, competitivo e atraente do futebol mundial. A final da Champions é um jogo que faz o planeta parar, assim como uma final de Copa do Mundo.

Na última segunda-feira (27), fez 37 anos da primeira conquista da Champions League, que na época era Copa dos Campeões, do Futebol Clube do Porto. O jogo foi em Viena, numa quarta-feira (27 de maio de 1987), contra o Bayern de Munique, que era o grande favorito para o título. Ninguém esperava que o Porto conseguisse chegar à final porque naquela época não existiam as redes sociais, internet, e não se via os times jogarem. No máximo, no domingo à noite, assistíamos aos gols dos campeonatos na Europa.

Bom, eu cheguei ao Porto em novembro de 1986 sem conhecer o time, mas aceitei ir na hora exatamente por causa da Champions. Encontrei um grande time formado por 13 jogadores da seleção de Portugal, que havia acabado de disputar a Copa de 1986, no México. Tinha ainda o goleiro da Polônia, Josef Mlynarczyk, também o grande jogador argelino Rabah Madjer, e eu, que também tinha disputado a Copa. Éramos os três estrangeiros do time, porque a cota de brasileiros já estava completa. Por isso, entrei como um estrangeiro.

O nosso treinador, Arthur Jorge, era simplesmente incrível, não só no plano tático e técnico, como também era um cara muito acima da média culturalmente e com uma inteligência privilegiada. Em 18 de março de 1987, fomos jogar no inverno pesadíssimo de Copenhagen pelas quartas de finais da Champions, que naquela época só jogavam os campeões de cada país. Era mata-mata desde o início, ou seja, não havia fase de grupos. Uma semana antes, ganhamos do Brondby no Porto por 1 x 0, gol de Madjer, e fomos para a Dinamarca precisando só do empate. Estava tudo congelado, inclusive o mar no cais do porto de Copenhagen; eu nunca tinha visto uma coisa daquelas.

Bom, num jogo difícil e logo aos 20 minutos de jogo, eu rompi todos os ligamentos do tornozelo esquerdo e a fíbula (na época chamava perônio). Dois dias depois, fui operado e o meu tempo começou a rolar para eu conseguir me recuperar a tempo para jogar a final, que ainda não sabíamos que iríamos disputar. Do dia da cirurgia até a data da possível final eram exatamente dois meses. Na semifinal, o Porto venceu por 2 x 1, as duas partidas contra um dos grandes favoritos, que na época eram os soviéticos da Dínamo de Kiev, base da seleção da União Soviética nas Copas de 1982, 1986 e 1990.

Eu voltei na última rodada do Campeonato Português, no antigo estádio das Antas, e joguei os últimos 20 minutos do jogo. Na segunda, partimos para Viena e, quando chegamos lá, o treinador Arthur Jorge me chamou em seu quarto e me falou o seguinte: "Walter, como está se sentindo?"

Respondi: "Estou bem, Mister."

Ele continuou: "Estou querendo você na final porque precisamos da sua presença para segurar a bola na frente e deixar a defesa do Bayern preocupada e presa lá atrás. Vamos fazer um teste com você amanhã no treino no estádio e, se tudo estiver bem, você será o titular."

Eu falei: "Pode contar comigo."

Continua após a publicidade

O problema foi exatamente nesse teste de campo da véspera, porque na hora de fazer o zig-zag, o meu tornozelo ainda estava muito preso e vimos que não estava 100%. Ele conversou comigo e, mesmo ficando muito frustrado, concordei que não daria para jogar. Aí o meu objetivo era pelo menos ir para o banco.

No vestiário, no dia do jogo, eu estava relacionado para o banco e amenizou a frustração de não sair jogando, mas estava à disposição. Fizemos um grande jogo, mas terminamos o primeiro tempo perdendo por 1 x 0, gol do ponta-esquerda Ludwig Kögl. Mas o Arthur Jorge era um treinador espetacular e, no vestiário, mudou o esquema que começou com quatro no meio e dois atacantes, e virou um 4-3-3, com a saída de um volante e a entrada do meu amigo Juary. Aí o jogo mudou. O Juary tinha um problema sério no joelho, mas era muito rápido e poderia colocar qualquer um em dificuldade se tivesse espaço. E foi isso que aconteceu quando, aos 77 minutos, deu o passe para o Madjer empatar e, aos 79, o argelino devolveu a gentileza para o Juary fazer o gol da vitória.

Nunca vi uma festa de título daquele tamanho. Chegamos quase de manhãzinha na cidade do Porto e todos estavam nas ruas. Havia pessoas, bandeiras e camisas do Porto por todos os lugares, e, quando chegamos ao estádio das Antas, ficamos surpresos porque ele estava totalmente lotado. Foi um momento incrível que passei junto com meus companheiros de time e o mais engraçado era que, fora os brasileiros e o português Paulo Futre, meus dois melhores amigos eram o argelino Rabah Madjer e o goleiro polonês Josef Mlynarczyk. Às vezes, fazíamos alguma festa de aniversário de filhos e ele sempre vinha à minha casa com a família. Foi um dos melhores goleiros que vi e joguei junto e também um dos caras mais legais.

Nessa tarde, o Real Madrid entra como franco favorito, assim como o Bayern em 1987, e obviamente o Borussia é a zebra da vez, da mesma forma que o Porto foi no dia 27 de maio de 1987. Será?

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Deixe seu comentário

Só para assinantes