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Quase fui para Fiorentina a pedido de Eriksson; meus sentimentos à família

Acordei nesta segunda-feira (26) com uma notícia bem triste: a morte do ex-treinador sueco Sven-Göran Eriksson, que conheci na Itália nos anos em que joguei por lá. Na minha primeira temporada (87/88), Eriksson era treinador da Fiorentina, e foi exatamente contra a equipe dele que fiz uma das minhas melhores partidas no Campeonato Italiano. Vencemos em Ascoli por 3 x 0, sendo que sofri um pênalti e fiz um golaço, e isso chamou muito a atenção dele e da torcida de Firenze também.

Antes do fim da temporada, o representante da Fiorentina foi até Ascoli e fomos tomar um café para ele se apresentar e me falar sobre o interesse que a equipe tinha em mim. Conversamos algumas vezes, mas sempre fui muito ético nessa questão de clubes e disse a ele que achei superlegal a possibilidade de jogar na Fiorentina, mas que ele deveria procurar o presidente do Ascoli, Constantino Rossi.

Quando acabou o campeonato, vim para o Brasil de férias e deixei tudo isso de lado para curtir minha família e amigos, porque ficava um ano sem vê-los. Quando voltei para iniciar a pré-temporada, numa linda cidadezinha medieval cercada por uma muralha chamada Nórcia, na região da Úmbria, província de Perugia, o Ascoli já havia feito as contratações e o time foi formado em torno de mim. Os treinamentos eram pesadíssimos, em dois e às vezes três períodos, e à noite eu ficava no hotel morto de cansaço.

Numa dessas noites tocou o telefone do meu quarto e quando atendi era Dunga, que na temporada 87/88 havia jogado no Pisa e tinha sido contratado pela Fiorentina. Ele me disse assim:

"Fala, Casão, beleza?"

"E aí, Dunga, estou legal e você?"

"Casão, estou aqui com o mister Eriksson e ele quer falar com você."

Fiquei surpreso, porque já estava em pré-temporada, e respondi:

"Poxa, Dunga, será uma honra conversar com ele."

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Ele passou o telefone para o mister, que disse, em italiano:

"Olá, Walter, tudo bem com você?"

Continuei a conversa, também em italiano:

"Olá, Mister, que prazer falar com o senhor."

Então, ele me falou coisas incríveis:

"Walter, quero muito contar com você no meu time, você é o atacante certo para nós da Fiorentina."

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Agradeci e expliquei a situação:

"Seria incrível jogar na Fiorentina com o senhor como treinador, mas não quero deixar Ascoli agora, porque o time foi feito em torno de mim."

A conversa seguiu por mais um tempo e foi um contato incrível, porque ele era uma pessoa muito respeitosa, doce, com uma honestidade ímpar, sem contar que era um treinador espetacular, tanto que foi o primeiro treinador estrangeiro a trabalhar na seleção inglesa.

Encontrei-me com ele tantas outras vezes, e ele sempre me elogiava muito como atacante, dizendo que sempre quis me ter em seus times. Não tem um jogador que tenha trabalhado com ele ou que o conhecia que não tenha uma profunda admiração pelo mister Eriksson.

Com toda sua dignidade e leveza para encarar a vida, ele já havia anunciado, com muita serenidade, sem se lamentar e sem se fazer de vítima, que tinha um câncer terminal no pâncreas e que não iria viver por muito mais tempo. Mas, quando acontece, a gente se choca de qualquer maneira, e bate uma tristeza grande, porque sempre vai um pouco da nossa história junto. Assim como foi com a morte de Gianluca Vialli, por exemplo.

Meus sentimentos a todos os familiares e a todos que tiveram o privilégio de ter trabalhado com um cara incrível e um treinador espetacular.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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