Não é só o Brasil: como seleções e clubes driblam a crise dos laterais
A atuação dos laterais foi um destaques negativos da seleção brasileira na derrota por 2 a 1 diante da Colômbia, na quinta-feira (16), em Barranquilla. Emerson Royal, pela direita, e Renan Lodi, pela esquerda, participaram pouco no ataque e sofreram na defesa, tanto na marcação dos pontas colombianos quanto nos lances dos gols de Luis Díaz.
O desempenho da dupla voltou a colocar em pauta a falta de opções para a posição na seleção brasileira. A "crise dos laterais" virou assunto no Brasil na reta final de preparação para a Copa de 2018 e ficou mais visível no ciclo de para o Mundial do Qatar, em 2022.
Só que a crise não é exclusividade da seleção brasileira. Ela atinge alguns dos principais clubes e seleções do mundo, incluindo equipes vencedoras como o Manchester City de Pep Guardiola ou os gigantes espanhóis.
A falta de jogadores na posição levou treinadores dos mais diferentes estilos a mudarem esquemas táticos e adaptarem seus times à nova realidade.
O City dos quatro zagueiros
Atual campeão da "tríplice coroa", o Manchester City entrou em campo para o jogo mais importante de sua história sem laterais de ofício. Na decisão da Champions League, Pep Guardiola levou a campo um sistema com três zagueiros na linha defensiva (Manuel Akanji, Ruben Dias e Nathan Aké), e um quarto, John Stones, atuando mais avançado, como um volante ao lado de Rodri.
O ataque pelas laterais era feito por Bernardo Silva, pela direita, e Jack Grealish, pelo lado esquerdo. Na hora de defender, além da ajuda dos pontas, Stones recuava para a primeira linha, e Rodri — que também já atuou como zagueiro — se juntava aos defensores.
A formação da final foi usada, com variações, em outras partidas. O lateral direito Kyle Walker, antes titular absoluto na posição, passou a ser usado também como zagueiro, apoiando menos o ataque. No lado esquerdo, a saída de João Cancelo para o Bayern não teve reposição. Guardiola simplesmente passou a usar um time base com um zagueiro (ora Aké, ora Akanji) no setor.
"Não podemos jogar com os laterais abertos, como 99% dos outros times fazem, porque não temos esse tipo de jogador agora. Não temos essa qualidade, então precisamos nos adaptar", disse o treinador catalão ao ser questionado sobre o sistema de quatro zagueiros.
Real Madrid e Barcelona improvisam
Se o time mais vencedor da Europa conquistou o continente sem usar laterais, os dois gigantes da Espanha também têm enfrentado desafios na posição. Nas últimas temporadas, Barcelona e Real Madrid precisaram recorrer a improvisos para driblar o problema.
No Barcelona, o drama da lateral-direita já se tornou uma espécie de instituição do clube. Nas últimas temporadas, a equipe catalã teve Sergi Roberto — que, de tanto ser improvisado no setor, mudou de posição —, Sergiño Dest e Nélson Semedo no setor. Nenhum deles convenceu.
A solução foi começar a usar zagueiros pelo lado direito. Ronald Araújo virou a principal opção de Xavi para a lateral-direita nos duelos contra o Real Madrid, por ser quem melhor marca Vinícius Jr.; Jules Koundé, zagueiro de origem, também foi usado como lateral.
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Quero receberCom a chegada de João Cancelo, o setor ganhou uma nova opção, mas os improvisos continuaram. No clássico mais recente contra o Real Madrid, Xavi escalou o português na linha de meio-campo, e manteve Araújo como zagueiro pela direita; Alex Baldé, o lateral-esquerdo, jogou mais avançado, como um ala, protegido por outros dois centrais (Iñigo Martínez e Christensen).
Em menor escala, o Real Madrid também já improvisou nas laterais para suprir a falta de opções. O principal exemplo é o volante Eduardo Camavinga, que passou a ser escalado como lateral-esquerdo, mesmo a contragosto, quando Carlo Ancelotti queria reforçar a marcação pelos lados do campo.
Alemanha usa tudo, menos lateral
Desde o título mundial em 2014, a seleção da Alemanha nunca mais foi a mesma: caiu nas primeiras fases de duas Copas do Mundo, não foi além de uma semifinal de Eurocopa e teve dificuldades para renovar em posições-chave. Entre elas, as laterais.
Com a aposentadoria de Philip Lahm e a transformação de Joshua Kimmich em meio-campista, a lateral-direita tornou-se um problema. Na Copa-22, foram três jogadores em três jogos na posição: Thilo Kehrer e Nicklas Sule (ambos zagueiros de origem), e o próprio Kimmich, de volta às origens.
Nos amistosos mais recentes, os alemães continuam testando de tudo, menos laterais de origem, na posição: Süle foi titular no amistoso contra o México, em outubro; outro zagueiro, Jonathan Tah, do Bayer Leverkusen, também atuou na posição recentemente. Outra alternativa testada foi Marius Wolf, do Borussia Dortmund, um meia aberto que nas últimas temporadas transformou-se em lateral por necessidades táticas.
No lado esquerdo, o atual titular é Robin Gosens, que ganhou destaque na Atalanta e na Internazionale jogando como ala pela esquerda em sistema de três zagueiros, ou como meio-campista aberto.
Espanha confia em veterano
Quando a Espanha foi campeã do mundo, em 2010, Jesus Navas era um ponta de 24 anos que entrava no time para tentar jogadas em velocidade. Hoje, prestes a completar 38 anos, o jogador do Sevilla tornou-se um lateral-direito que ainda tem espaço na seleção e sonha em ser um quarentão disputando a Copa de 2026.
O titular da lateral-direita ainda é Dani Carvajal, do Real Madrid, mas as tentativas de renovação no setor não prosperaram. Nos últimos anos, o futebol do país não produziu laterais que ganhassem a confiança dos treinadores — na Copa-22 e na Eurocopa-20, o titular foi outro veterano, César Azpilicueta.
Na esquerda, a saída de Jordi Alba abriu um espaço difícil de preencher. José Gayà, do Valencia, foi o mais usado nas últimas partidas. Contra o Chipre, pela primeira vez, Alejandro Grimaldo — um dos destaques do Bayer Leverkusen, líder da Bundesliga — foi chamado e escalado como titular.
Inglaterra é exceção, mas também sofre
No cenário de escassez de laterais, a Inglaterra é exceção, mas nem assim está livre do problema. Nos últimos anos, o futebol inglês produziu nomes como Kyle Walker, Kieran Tripper e Trent Alexander-Arnold, três dos melhores laterais-direitos da Europa. Mas e o lado esquerdo?
Com as lesões recentes de Ben Chilwell e Luke Shaw, o técnico Gareth Southgate tem usado a criatividade para povoar o setor. Nas últimas três partidas da seleção, ele usou duas soluções diferentes: contra Itália e Escócia, trocou Trippier de lado; e no amistoso contra a Austrália, usou Levi Colwill, zagueiro de formação, que tem sido usado como lateral no Chelsea.
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