Artilheiro da Copa Africana foi campeão com a Espanha e joga na 3ª divisão
Antes da Copa Africana de Nações começar, há duas semanas, a lista de candidatos a artilheiro do torneio tinha alguns dos melhores atacantes da atualidade: Mohammed Salah, Sadio Mané, Victor Osimhen e Serhou Guirassy puxavam a fila de possíveis goleadores.
As oitavas de final começam neste sábado com um cenário bem diferente. Em um torneio repleto de zebras, o artilheiro é Emilio Nsue, de 34 anos, atacante da Guiné Equatorial.
O veterano marcou 5 gols na fase de grupos e é a maior estrela da grande surpresa do torneio até agora: a seleção empatou com a Nigéria (1 a 1), passou por Guiné-Bissau (4 a 2) e goleou a Costa do Marfim (4 a 0), ficando em primeiro lugar no Grupo A. No domingo, Nsue será a maior esperança no confronto de Guiné Equatorial contra Guiné, valendo uma vaga entre as oito melhores seleções do continente.
Classificação e jogos
O desempenho na Copa Africana de Nações é a consagração de um jogador que tem uma história bem peculiar. Uma trajetória que poderia nunca ter se cruzado com a seleção da qual hoje ele é o maior ídolo e recordista de gols.
Emilio Nsue López nasceu na Espanha, como 17 dos 27 convocados por Guiné Equatorial para o torneio deste ano. Ele cresceu em Palma de Mallorca, filho de um guinéu-equatoriano e de uma espanhola, e começou a se destacar nos principais clubes da região, o Atlético Baleares e o Mallorca.
Nas divisões de base do Mallorca, Nsue consolidou-se como uma das maiores promessas do futebol espanhol. Ainda na equipe balear, ele começou a ser chamado para as categorias inferiores da seleção espanhola: passou pelos times sub-16, sub-17, sub-19 e sub-20.
Jogando entre os melhores
Em 2007, foi campeão europeu sub-19, ao lado de Javi Martínez, Cesar Azpilicueta e Dani Parejo. Dois anos depois, disputou o Mundial Sub-20 e marcou dois gols na goleada por 8 a 0 sobre o Taiti. A Espanha, que também tinha Jordi Alba e Ander Herrera, caiu nas oitavas de final contra a Itália. O Brasil, de Ganso, Giuliano e Douglas Costa, perdeu a final para Gana, nos pênaltis.
Presença constante nas seleções de base, Nsue ainda tentava engrenar a carreira profissional. Sem muitas chances no Mallorca, ele foi emprestado para o Castellón e a Real Sociedad, então na segunda divisão espanhola.
Em 2010-11, o atacante voltou a seu clube de origem, com um grande objetivo: ser chamado para a seleção sub-23 que disputaria a Olimpíada de Londres. A expectativa aumentou após mais um título europeu, agora na categoria sub-21, ao lado de Thiago Alcântara, Juan Mata e David De Gea.
Nessa época, a federação de Guiné Equatorial tentou convencê-lo a adotar a seleção africana. Nsue não quis, porque confiava no chamado para realizar o sonho olímpico. Mas ele acabou perdendo espaço, não voltou a ser convocado e ficou fora de Londres-2012.
Conselho de capitão
Em 2013, Nsue era um jogador consolidado no Mallorca, mas a seleção espanhola era um barco que já havia zarpado. Diante de mais uma proposta de Guiné Equatorial, ele finalmente tomou uma decisão. Não sem antes pedir um conselho a um futuro colega.
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Quero receber"Eu nunca tinha falado com ele, mas ele conseguiu meu telefone e me ligou. Disse que estava pensando em aceitar o convite e me perguntou o que eu achava", lembra o ex-volante Juvenal Edjogo-Owono, então capitão da seleção de Guiné Equatorial, ao UOL.
Diante da chance de poder ter um reforço de peso, Juvenal não pensou duas vezes. "Falei pra ele que, se quisesse viver o futebol de uma outra forma, sem tanta pressão, era uma ótima chance. Disse que as pessoas agradeceram muito que ele viajasse tantos quilômetros para defender a seleção, e que o povo africano é muito agradecido aos jogadores europeus que fazem isso".
Minutos depois daquela chamada, Nsue disse "sim" à seleção do país de seus antepassados.
Estreia com três gols e tapetão
A primeira partida de Nsue com a seleção africana entrou para a história do futebol do país. Ele marcou três gols, e Guiné Equatorial venceu Cabo Verde por 4 a 3, nas Eliminatórias para Copa do Mundo de 2014.
Só que, dias depois, a Fifa anunciou que o atacante havia atuado de forma irregular, por não ter concluído o processo de mudança de seleção. Guiné Equatorial perdeu os três pontos conquistados e viu o sonho de seu primeiro mundial terminar antes mesmo de poder se imaginar no Brasil um ano depois.
Apesar do problema burocrático em seu jogo de estreia e da perda dos pontos, Nsue tornou-se um ídolo do país e uma referência no vestiário. "Ele sempre mostrou muita vontade com a seleção. Mesmo quando estava no auge, jogando na Espanha, ia para os jogos com muita humildade", afirma Juvenal Edjogo-Owono.
Pela seleção africana. Nsua disputou as edições de 2015 e 2022 da Copa Africana de Nações. Na primeira, jogando em casa, Guiné Equatorial chegou à semifinal — perdeu para Gana por 3 a 0.
Premier, Chipre, Bósnia e terceirona
Se na carreira em seleções Nsue fez uma mudança radical que mudou a sua vida, a trajetória em clubes também teve alterações importantes na rota. Em 2014, quando já jogava pela seleção africana, o atacante trocou o Mallorca pelo Middlesbrough.
Na equipe inglesa, ele passou duas temporadas na Championship —a segunda divisão do país— e teve a chance de entrar em campo em quatro jogos da Premier League na temporada 2016-17, antes de ir para o Birmingham, jogar mais uma vez no segundo escalão.
Nsue passou também pelo futebol do Chipre, no Apoel, onde teve a chance de estrear em campeonatos europeus, na Europa League. Em 2021-22, ele defendeu o Tuzla City, da Bósnia, e marcou dois gols em 10 partidas.
A volta à Espanha aconteceu em 2022, pelo Intercity. O time, conhecido por ser o primeiro do país com ações na bolsa de valores, disputa a Primeira Federação, equivalente à terceira divisão.
Em um dia normal de jogo, Nsue atua em estádios acanhados, com públicos pequenos e sem muita mídia. Na Copa Africana, ele se transforma e vira o ídolo de uma nação e o maior artilheiro de um continente apaixonado por futebol.
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