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REPORTAGEM

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'Se isso salvar uma vida, já vale', diz autor de pedido para parar futebol

26.02.2021 - O governador João Doria (PSDB) durante entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes, em São Paulo - Divulgação/Governo de São Paulo
26.02.2021 - O governador João Doria (PSDB) durante entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes, em São Paulo Imagem: Divulgação/Governo de São Paulo

12/03/2021 07h42

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Palmeirense fanático, o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mario Sarrubbo, diz que ficar um tempo sem poder ver um jogo do futebol paulista será um sacrifício até para ele, que recomendou a paralisação. Mas o membro do Ministério Público de São Paulo afirma que o sacrifício feito pelos envolvidos com a modalidade no estado valerá a pena se ao menos uma vida for salva com a medida.

Ele pediu a suspensão das atividades esportivas e dos cultos religiosos por conta do momento crítico da pandemia de covid-19 e teve o pedido acatado pelo governador João Doria na quinta (11). A paralisação começa na próxima segunda (15) e vai até o dia 30 de março. Ela pode ser estendida dependendo da situação da crise sanitária.

Em entrevista exclusiva ao blog, o procurador-geral também falou sobre a intenção dos clubes de continuarem treinado e da possibilidade de jogarem em outros estados. O integrante do MP deixou uma porta aberta para analisar não se opor a jogos de outras competições, como a Copa do Brasil, no estado durante a suspensão, desde que o Campeonato Paulista esteja parado em todas as divisões. Abaixo, confira a entrevista com Mario Sarrubbo.

Como o senhor chegou à decisão de recomendar a paralisação do futebol ao governador de São Paulo?

Temos um comitê médico, com profissionais muito competentes, como Drauzio Varella e Roberto Kalil Filho, para nos orientar, de forma graciosa, na pandemia.

Com o nível de internações subindo de forma assustadora nas últimas três semanas, nós chegamos à conclusão de que, os próprios médicos foram muito enfáticos ao dizer: "vocês têm que trabalhar agora para parar a circulação de pessoas. As pessoas precisam parar de circular sob pena de colapsar o sistema de saúde e começarem a escolher quem vai viver, quem vai morrer". Então, o Ministério Público não podia ficar quieto. Na medida em que somos, de acordo com a constituição federal, defensores dos direitos da população na saúde, entre tantos outros. Tivemos uma reunião com o governo na semana passada e estávamos muito assustados com o que estava ocorrendo. Eles falaram: "o estado inteiro vai para a fase vermelha". Era o que agente queria.

O governador colocou igrejas como atividade essencial porque tem argumentos para isso. Então, começamos a olhar também para o futebol (até o pedido, que inclui igrejas, ser feito).

A federação discordou.

Alguns promotores participaram das reuniões antes de o futebol voltar. Os protocolos do futebol são excelentes, não tenho a menor dúvida disso. Só que a questão não se restringe ao futebol em si, ao jogo.

A questão não é o jogo. É o que está no entorno do jogo. Uma equipe como o Corinthians, como o Palmeiras, por exemplo, têm 100, 150 pessoas, um estafe muito maior do que os 11 jogadores em campo, os do banco, os treinadores, que estão lá.

Esse pessoal está circulando, todo esse pessoal está indo trabalhar, indo para os treinamentos, para os jogos.

O entorno, o que demonstraram esses primeiros três meses e meio do ano, as decisões (de campeonato) mobilizam as pessoas, há aglomerações nas portas de estádio, isso aconteceu no domingo com a vitória do Palmeiras (sobre o Grêmio, na final da Copa do Brasil). Foi pequena, mas houve uma aglomeração na porta do estádio. Então, é o contexto geral.

Na reunião que vocês tiveram, a federação insistiu nos protocolos.

A federação, evidentemente, na reunião, mostrou os protocolos, que são elogiáveis, são excelentes. O problema é que não se restringe aos protocolos. As pessoas precisam parar de circular. Essa é a razão que nos animou a fazer a recomendação ao governo, que acabou acolhida hoje (quinta, 11) em meio a um turbilhão de más notícias no campo da saúde.

Então é isso. O que a gente pede? Que pare o futebol, não é por três meses, não é para voltar em agosto, para estragar o calendário. É o que o governo procura aí, para gente estancar esse momento difícil que nós estamos enfrentado com pessoas morrendo nos corredores dos hospitais esperando uma vaga. A ideia é essa.

E o que a federação argumentou?

Eu conversando com o presidente da federação (Reinaldo Carneiro Bastos), ele falou: "vai ter jogo da Copa do Brasil, vamos conversar, ver o que a gente faz, tem jogo da Sul-Americana".

Eu falei que estamos à disposição. O que nós queremos é fazer as pessoas pararem de circular. "Se você parar o Campeonato Paulista, A-1, A-2 e A-3, a gente já tem uma massa de pessoas que para de circular, por uma, por duas semanas. Isso vai me ajudar a diminuir (a transmissão do vírus). Se isso salvar uma vida, já vai valer, é importante que se diga.

Dentro de um contexto genérico em que a gente caminha para quase um lockdown, é importante que o futebol dê a sua cota de sacrifício. É um sacrifício generalizado porque eu sou fanático, eu gosto de futebol.

É um sacrifício para todos nós, inclusive para a nossa cabeça. Estamos todos trancados em casa, chega no final de semana e você não tem nenhum futebolzinho pra assistir, é muito ruim.

Os dirigentes entendem que os jogos vão ser suspensos, mas não os treinos. O senhor entende assim também?

Treino passa pela fiscalização do governo, vamos ver como fica. E passa pelo bom senso que a gente pede para os clubes.

Não ficou claro para mim.

O que o Ministério Público recomenda é que pare o campeonato de futebol. A questão dos treinos, nós precisamos conversar. Se eles vão continuar treinando, vai continuar tendo a movimentação nos clubes? O quanto isso atende ou não a necessidade de controle da pandemia? O Ministério Público tem um limite, também, nessa avaliação.

Eu continuo, particularmente entendendo que as pessoas não deveriam circular. Eu, aqui no Ministério Público, o meu pessoal está ficando em casa. Se os clubes vão dizer para o pessoal ir treinar todos os dias, isso acaba, em alguma medida, prejudicando tudo aquilo que se pede nesse momento de crise.

Nós temos que parar a cidade para as pessoas pararem de morrer por falta de leito hospitalar. E aí eu pergunto para você, será que se os clubes continuarem treinando, isso vai ajudar? Acredito que não.

Mas eu não tenho uma definição clara pra te dizer agora. Se o Ministério Público fará algo ou não nesse sentido. Conto com o bom senso de todos no sentido de que é um momento em que, se ficar em casa e salvar uma vida, é um ganho extraordinário para todos nós.

Nós pedimos para parar o campenato. O governo parou o campeonato. Daqui pra frente, nós vamos aguardar, ver o que acontece. Conforme for, tomaremos medidas ou não, vamos avaliar. É muito difícil eu dar um diagnóstico para você agora, está errado, não está. Em princípio penso que tudo deva parar, mas vamos aguardar.

A federação e os clubes cogitam levar os jogos para outros estados. O que o senhor pensa disso?

Não tem nada oficial, não vou me posicionar. Se forem jogar em outro Estado, tenho a lamentar. Primeiro como cidadão, depois, como procurador-geral, membro do Ministério Público, nós avaliaremos eventuais medidas. Tenho a lamentar como cidadão porque acho que a medida que tomamos em São Paulo deveria ter sido tomada em nível nacional, não estadual.

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