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Messias, o corintiano que derrubou regras da Nike para ter o nome na camisa

O corintiano Messias de Oliveira, 41, nocauteou duas vezes na Justiça a política de personalização de camisas da gigante Nike. Morador de Caraguatatuba, no litoral de São Paulo, ele foi aos tribunais por algo que pode ser simples para você: comprar camisas da seleção brasileira e do clube de coração com seu nome estampado.

Messias, que é analista de sistemas, acionou a Fisia Comércio de Produtos Esportivos, distribuidora oficial da Nike no Brasil, duas vezes na Justiça para poder adquirir "mantos" da seleção e do Corinthians personalizados. Pelo site "nike.com.br", ele não conseguiu efetuar a compra porque seu nome foi barrado pela política da empresa, que veta palavras de cunho religioso ou político. Na Justiça, a justificativa para o caso foi a questão religiosa.

O corintiano obteve vitórias nos dois processos, com sentenças que transitaram em julgado. A camisa da seleção, na versão preta, já foi recebida. E a Fisia não cobrou por ela, segundo o consumidor. No caso da do Corinthians, ele aguarda trâmites burocráticos para efetuar a compra.

Fisia é o nome atual da antiga Nike do Brasil Comércio e Participações, adquirida em 2020 pelo Grupo SBF, que passou a ter exclusividade na distribuição de produtos da marca de material esportivo no país até 2030.

Ao firmar acordo com Ministério Público Federal do Rio de Janeiro sobre seu protocolo de personalização de produtos, em 2022, a Fisia informou que reproduz no Brasil medida da Nike que proíbe a customização de camisas com palavras ligadas a temas religiosos.

A jornada de Messias em busca da personalização dos produtos da Nike começou pouco antes do jogo em que o Brasil foi eliminado pela Croácia no Mundial do Qatar. Empolgado com a competição, ele resolveu comprar uma camisa do seleção pelo site da fornecedora oficial de material esportivo da CBF e do Alvinegro do Parque São Jorge. A página de vendas é operada pela Fisia.

"Fiz todo o processo para a compra. Quando coloquei o meu nome, apareceu: 'personalização indisponível'. Tentei de novo para ver se estava digitando um caractere especial. Nada. Coloquei o nome da minha esposa, que é Larissa. Aí foi normal", relembrou Messias.

Intrigado, o analista de sistemas pesquisou sobre o assunto na Internet e achou algo sobre gente com problema parecido. Ele chegou a pensar que a motivação fosse política, por causa do nome do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro.

"Eu falei, isso é uma mistura de religião e política. Testei nomes ligados a religiões de matrizes africanas, coloquei 'padre', 'pastor', não deu certo", contou.

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Então, o torcedor entendeu o que estava acontecendo.

Eu me senti segregado. Por que meu vizinho pode personalizar a camisa dele e eu não posso? Meu irmão pode, quase todos os brasileiros podem. Nome a gente não pode trocar. Eu gosto do meu nome e ele tem um peso emocional. Meu pai era Pedro Messias

Depois de entrar na Justiça contra a Fisia e vencer, já em 2023 ele tentou adquirir uma camisa do Corinthians personalizada no site da Nike, imaginando que o problema teria sido solucionado, mas não conseguiu. Assim, acionou a Fisia novamente.

Processos

Em 15 de dezembro do ano passado, Messias entrou com a primeira ação. O pedido foi para que a Fisia fosse condenada à obrigação de realizar a venda da camisa da seleção para ele e a estampar o nome "Messias".

"É manifestamente ilegal, preconceituosa, discriminatória, segregacionista a postura da requerida [Fisia]", escreveu em trecho da petição inicial o advogado do consumidor, Rogério Monteiro da Silva Teixeira de Carvalho.

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Em sua defesa, a Fisia alegou possuir regras próprias de personalização. "A proibição de customização das camisas de times e seleções esportivas com palavras ligadas a temas religiosos tem o escopo de proteger símbolos religiosos e estimular o esporte como instrumento da tolerância à diversidade e não de embates ou ofensas", diz a contestação. A peça foi assinada pelo advogado Nelson Wilians Fratoni Rodrigues.

O documento traz duas definições da palavra messias no dicionário precedidas da classificação "religião": "para os judeus, redentor prometido por Deus para redimi-los"; "para os cristãos, esse ser na pessoa de Jesus Cristo". Messias, o corintiano, se define como cristão protestante.

A Fisia também alegou que a ação seria uma forma de se obter lucro. No entanto, o analista de sistemas não pediu indenização.

Em fevereiro de 2023, o juiz Mario Henrique Gebran Schirmer, do Juizado Especial Cível e Criminal de Caraguatatuba, condenou a Fisia a efetuar a venda da camisa com o nome de Messias estampado sob pena de multa de R$ 30 mil em caso de descumprimento. O valor da penalidade, que não precisou ser aplicada, foi reduzido para R$ 3 mil após embargos apresentados pela Fisia. Em 11 de maio, Messias informou à Justiça ter recebido da empresa uma camisa da seleção com seu nome.

"Quando saiu a decisão, meu advogado mandou uma mensagem dizendo: 'agora você pode ostentar seu nome na sociedade'", contou Messias.

Corinthians

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Em 27 de junho deste ano, o torcedor do Timão entrou com outra ação contra a Fisia para comprar uma camisa do Corinthians personalizada.

Seu advogado lembrou da vitória no processo anterior e escreveu que a empresa "permanece com a lamentável conduta de segregar o autor [Messias], como se o mesmo não tivesse o direito de ostentar seu nome perante a sociedade".

Além de bater na tecla do cunho religioso em torno do nome do consumidor, a Fisia alegou que ele não chegou a efetuar a compra. Assim, estaria discutindo um direito inexistente. No entanto, a aquisição não foi feita justamente por causa da impossibilidade de personalização.

"Não existe conduta antijurídica ou ilícita praticada pela ré [Fisia], principalmente porque é direito da ré estabelecer políticas para a utilização de seus serviços", diz trecho da defesa da empresa.

A Fisia foi condenada em 27 de julho, pelo juiz Fábio Bernardes de Oliveira Filho, a fazer a venda da camisa do Corinthians com o nome de Messias. "Ocorre que o autor tem como nome próprio 'Messias'. Não se trata, pois, de manifestação política e religiosa", argumentou o magistrado em sua decisão.

Dessa vez, a empresa apresentou embargos alegando omissão na sentença por ela ter deixado de constar a necessidade de o consumidor finalizar a compra.

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Lembrando que a sentença obrigava a Fisio a "efetuar a venda", o juiz considerou a medida protelatória e condenou a empresa a pagar multa de R$ 10 (1% do valor da causa) para Messias. O pagamento já foi feito. O corintiano agora aguarda os procedimentos finais para efetuar a compra e receber a camisa.

Fisia e Nike procuradas

A coluna procurou a Fisia e a Nike por meio da assessoria de imprensa que atende ambas. A primeira enviou um comunicado, mas a segunda não respondeu.

"A Fisia, distribuidora oficial da Nike no Brasil, informa que cumprirá as determinações judiciais. A empresa também destaca que está comprometida a revisar seus processos para promover a melhor experiência a seus consumidores", diz a nota. Tinham sido enviadas cinco perguntas para a Nike e dez para a Fisia.

Ministério Público

No ano passado, o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro recebeu a informação de que estaria havendo prática discriminatória na venda oficial de camisas da seleção brasileira. Estariam sendo proibidas palavras vinculadas a religiões de matriz afro-brasileira. Ao mesmo tempo, seriam permitidos termos ligados ao cristianismo. Na ocasião, a Fisia respondeu ao MPF-RJ que a diferença ocorreu por desatualização na lista de palavras vetadas.

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Em novembro de 2022, a empresa assinou um termo de compromisso com o MPF-RJ. Entre outras medidas, a empresa se comprometeu a atualizar a lista de palavras barradas, criar um canal de comunicação para queixa dos consumidores e, até agosto de 2023, enviar relatórios mensais apresentando eventuais manifestações dos consumidores e as soluções dadas por ela.

A coluna perguntou à assessoria de imprensa do MPF-RJ se o órgão foi informado pela Fisia do problema envolvendo Messias. A resposta foi: "sobre o nome Messias, a Fisia encaminha os relatórios a partir de reclamações realizadas pelo site pelos consumidores, não havendo comunicação de processos individuais ajuizados".

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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