Como foi construída dívida que fez agente ser maior credor do Corinthians?
Num buraco cavado com parcelas não pagas, acordos não cumpridos, juros e multas, o Corinthians deve enterrar R$ 78,1 milhões. Esse é o valor cobrado do clube pelo empresário Giuliano Bertolucci na Justiça.
Documentos anexados pelo agente em cinco processos explicam como a dívida chegou a esse ponto. Bertolucci aparece como maior credor do Alvinegro na lista entregue à Justiça pela agremiação no pedido de RCE (Regime Centralizado de Execuções). Na relação alvinegra, o valor é de R$ 78,2 milhões, aproximadamente.
Só num dos processos são cobrados R$ 12.147.534 em juros. Isso é o que aconteceu com o débito pela compra de 50% dos direitos direitos econômicos de Ramiro e que pertenciam ao agente.
Em 2 de janeiro de 2019, o Corinthians se comprometeu a pagar 3,5 milhões de euros pela aquisição. Pelo clube, o contrato foi assinado por Andrés Sanchez, que estava na presidência.
O pagamento deveria ser feito até 1 de agosto de 2020, de acordo com a cotação do euro na ocasião.
Conforme narram os advogados de Bertolucci no processo, a quitação não foi realizada.
Em 22 de novembro de 2021 foi feito um acordo, assinado por Duilio Monteiro Alves, como presidente, para o pagamento de R$ 26.411.287,18 em 24 parcelas. Nenhuma das prestações foi paga. O montante cobrado na Justiça é de R$ 43.248.429,40. Além de juros de 1% ao mês e correção monetária, a conta inclui multa de 2% do valor da dívida, o que representa R$ 609.821,48.
Empréstimos
Num dos processos, o Alvinegro é cobrado para pagar mais que o triplo da quantia que pegou emprestada com o agente, apesar de acertar uma parte da dívida.
Em 7 de abril de 2017, durante a gestão de Roberto de Andrade, Corinthians pegou R$ 6 milhões emprestados com Bertolucci.
Ficou combinado que o dinheiro seria devolvido até 8 de maio do mesmo ano. O empresário deveria receber mais R$ 90 mil como juros e correção monetária.
O clube pagou R$ 1,3 milhão. Em 11 de maio de 2018 foi firmado novo acordo. A agremiação se comprometeu a pagar R$ 6,1 milhões em 24 parcelas.
O débito aumentou porque, em 29 de dezembro de 2018, o Corinthians pegou mais R$ 2 milhões emprestados com Bertolucci. A quitação deveria ser feita de uma só vez em fevereiro de 2021.
A inadimplência continuou. Em 22 de novembro de 2021 foi selada a repactuação da dívida. O documento, assinado por Duilio Monteiro Alves, presidente na ocasião, registra que a dívida já estava em cerca de R$ 16,2 milhões.
Desta vez, ficou combinado o pagamento em 24 parcelas de R$ 675,1 mil.
Os advogados do empresário sustentam na ação que o clube pagou apenas as duas primeiras prestações. No início de janeiro de 2025, o agente entrou com ação cobrando, em valores corrigidos, R$ 24.570.561,19. São R$ 228.858,97 em juros (1% ao mês).
Comissões
A inadimplência do clube tornou rotineira a assinatura entre as partes de "termos de transação", documentos por meio dos quais eram feitos novos acordos.
É o que mostra ação movida pela Bertolucci Assessoria e Propaganda Esportiva, agência do empresário.
Documentos apresentados pelos advogados do agente mostram que em dezembro de 2021, na gestão de Duilio, foi firmada a repactuação relativa a quatro dívidas.
O acordo englobou diversas parcelas não pagas vinculadas aos seguintes contratos assinados durante gestão de Andrés Sanchez:
1 - R$ 600 mil referentes a comissões ligadas à contratação de Douglas, em julho de 2018.
2 - R$ 925.999,25 por 15% dos direitos de imagem de Jô repassados para a Bertolucci Assessoria em 20 de dezembro de 2018.
3 - R$ 993.500 pela renovação do contrato de Léo Santos em maio de 2020.
4 - R$ 2,3 milhões pela intermediação da prorrogação do contrato de Jô, em 20 de julho de 2020.
Ficou acertado o pagamento de R$ 3.822.729,08 em 24 prestações. Segundo alega a empresa no processo, o clube "inadimpliu integralmente as parcelas ajustadas".
Com multa de 2%, juros de 1% ao mês e correção monetária, o valor cobrado saltou para R$ 6.259.711,15. São R$ 1.758.215,39 de juros e R$ 88.264,62 de multa.
Paulinho
Outro caso que mostra a escalada dessa dívida está registrado no processo em que a empresa do agente cobra comissão pela intermediação da contratação de Paulinho.
Em janeiro de 2022, com Duilio na presidência, foi ajustado o pagamento de R$ 2.880.000. O compromisso não foi honrado e o valor cobrado na Justiça é de R$ 3.720.412,81. Ou seja, a inadimplência enforcou o Corinthians em mais R$ 840.412.81.
Recente
Com pouco mais de um ano na presidência, Augusto Melo já deu sua contribuição para aumentar o débito do Alvinegro com Bertolucci.
O empresário alega na Justiça que não recebeu R$ 307.125 referentes aos três primeiros dos 20 pagamentos de R$ 102.375.000 cada pela comissão na contratação de Matheuzinho, em fevereiro de 2024.
Com juros e correção monetária, a cobrança passou a ser de R$ 322.451,11. Vale lembrar que em todos os casos os valores são atualizados durante os processos.
Presidente responde
Por meio de sua assessoria de imprensa, Augusto Melo respondeu a perguntas da coluna sobre a dívida com Bertolucci. Confira.
Por que a atual gestão não conseguiu pagar as três primeiras parcelas da comissão para o Giuliano Bertolucci referente ao contrato com o Matheuzinho?
Augusto Melo - Porque infelizmente no começo do ano passado estávamos sem nada de dinheiro no caixa e tínhamos um fluxo de pagamentos para fazer. Inclusive, essa é a única divida da gestão com o Giuliano Bertolucci.
2 - Na sua opinião o que levou o clube a ter uma dívida tão elevada com um só empresário?
Augusto Melo - As gestões passadas tinham o costume de fazer dívidas com empresários, achando que a conta nunca ia chegar para o clube. Os empréstimos eram feitos e de repente algum jogador desse mesmo empresário aparecia contratado pelo Corinthians, e dessa forma tudo ia se prolongando. Tudo em troca de empréstimos que um dia precisam ser pagos. E a conta agora chegou
O que o clube precisa fazer para que isso não volte a acontecer?
Augusto Melo - O Corinthians precisa ser autossustentável para não depender de empresários e correr riscos. Todos os problemas que estamos encarando financeiramente são decorrentes de problemas das gestões anteriores, que contavam com o dinheiro dos empresários e só prolongavam os pagamentos. Precisamos primeiro resolver nossas dívidas, com a RCE, isso está sendo feito, e depois não ter os empresários como um problema, mas sim como parceiros. Hoje em dia a gente não trabalha com o dinheiro do empresário, quando recebemos, já pagamos o que é de fato do empresário, isso não era feito antes e acarretava nesses juros absurdos que hoje temos que pagar.
O que diz Duilio?
Em troca de mensagens com este colunista, Duilio também falou sobre a dívida com Bertolucci.
"Essas coisas vinham de outras administrações, envolviam um empresário que trabalha com dezenas de talentos. Eu mesmo contratei dois jogadores que atuavam com ele, Willian e Paulinho. Se você parar para ver, não é só o Corinthians que deve a ele", afirmou o ex-presidente.
Indagado sobre acordos para quitar dívidas não cumpridos, Duilio disse: "havia um diálogo franco sobre as nossas dificuldades de quitar compromissos e isso era repactuado. O que não quitamos não significa que não tínhamos a intenção de pagar".
A coluna ainda entrou em contato com Roberto de Andrade. O ex-presidente disse não lembrar os motivos que o levaram a pegar dinheiro emprestado com o agente para o clube.
Andrés Sanchez, que contraiu parte significativa das dívidas com Bertolucci, não fala com este colunista.
Bertolucci
Por sua vez, o empresário não respondeu às perguntas enviadas por mensagem de texto.
O agente vinha mantendo diálogo com a diretoria para receber o valor devido nos mesmos moldes do RCE, caso o plano de quitação seja aprovado pela Justiça.
Porém, existia dúvidas no Parque São Jorge sobre se ele seria incluído no processo que organiza os pagamentos dos débitos corintianos sem fazer a cobrança na Justiça. A expectativa no clube é de que a dívida com o empresário entre em breve no RCE.
41 comentários
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Mauricio Tavares
Andres e Duilio deveriam responder por esses atos. Administração temerária. A impressão é que eles ganhavam algo nessas operações.
Ward Eletro Eletronica Ltda
CADÊ O TUMA? Não foi atrás disto ainda? Porque? Vamos TUMA, defenda o clube agora!!!!!
José Pedro dos Santos Neto
Até que enfim alguém resolveu fazer jornalismo e mostrou o absurdo que fizeram com o clube. Mais absurdo ainda é ex presidente não se lembrar porque pediu dinheiro emprestado para o agente. E o problema é o Augusto. Incrível.