O campeão de 2019 estreia no Brasileiro de 2020
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Sonhei que Jorge Jesus e Domènec Torrent se encontravam, em algum ponto incerto entre Lisboa e o Rio de Janeiro. Sentavam-se numa tasca, que bem poderia ser na Catalunha, e nesse meu delírio noturno, quem puxava o papo era o Mister, como sempre agitado e falante:
- O que estás a fazer com o "meu" time, ó pá?
Dome, com seu jeito tranquilo e diplomático, sorria e tentava se explicar:
- Temos métodos diferentes de jogo. E o técnico agora sou eu, Jesus. Desencarna!
O português, porém, não estava pra brincadeira:
- Espera aí, Torrent: dissestes que ia chegar devagarzinho e mudar aos pouquinhos. Não é o que tenho visto. Tocastes fogo no parquinho, gajo. "Meus" jogadores não estão acostumados a essa história de jogo posicional. Tens que ensinar aos poucos e, pra ser sincero, nem sei se essa é a tática ideal para esse elenco...
- Jogo assim há 11 anos. E vou continuar jogando! - rebateu o Dome, enfático.
Jesus levou as mãos à cabeça e alisou os longos cabelos brancos, em claro sinal de impaciência. Mas respirou fundo e decidiu insistir num ponto que considerava fundamental:
- Olha só, catalão, vou te contar um segredo. Nem deveria, pois não gosto de revelar meus segredos, mas quero tão bem a esse clube e a esses jogadores, que vou abrir uma exceção...
Curioso, Domènec, arqueou as sobrancelhas e aguardou a revelação:
- Arrascaeta e Éverton Ribeiro são a alma desse time. Muito se fala em Bruno Henrique e Gabriel, por serem os avançados que mais fazem gols, mas a bola não chegaria a eles com tanta qualidade não fossem os passes açucarados e o ritmo perfeito que ditam esses dois. Tenho visto que tu tens escalado um ou outro. Isso é um crime de lesa-futebol, ó pá!
O catalão fez uma cara contrariada e se defendeu:
- Eu jogo sempre com dois extremos bem abertos. É a base do meu jogo posicional. E Arrascaeta e Éverton Ribeiro jogam por dentro. Então, tenho optado sempre por um ou outro - explicou.
- Não, não e não! Eles têm que jogar juntos. Podem até começar abertos nas pontas, mas precisam ter liberdade para criar por todo o ataque. É dos pés deles que nasce a magia desse time - exasperou-se o atual técnico do Benfica.
Dome refletiu por alguns instantes. Seus primeiros resultados tinham sido bem aquém do retrospecto do campeão brasileiro, da Libertadores, da Recopa Sul-americana, da Supercopa do Brasil e do Carioquinha. Por isso, admitiu:
- No próximo jogo, contra o Bahia, estou sem vários titulares e pretendo "rodar" o elenco. Vou colocar o Éverton na direita e o Arrascaeta no meio e lhes darei a liberdade que você sugere - concedeu o catalão.
- Faça isso e você não se arrependerá - disse Jesus, antes de se despedir.
Acordei e vi à noite, pela primeira vez sob o comando de Dome, o Flamengo gastar a bola, na goleada sobre o Bahia. Com um show de Arrascaeta e Éverton Ribeiro, que atuaram com a liberdade que tinham sob o comando de Jorge Jesus e, além de ditar o ritmo do rubro-negro, fizeram gols espetaculares.
O campeão brasileiro de 2019, pode-se dizer, enfim estreou no Brasileiro de 2020, com uma vitória retumbante, que só não foi perfeita, porque a defesa ainda falhou muito, permitindo três gols ao adversário. A volúpia ofensiva da equipe de 2019 (e, por que não dizer, do início de 2020?), porém, ressurgiu, ainda que tenha arrefecido, após o quinto gol (coisa que Jesus jamais aceitaria).
O Flamengo de Dome se aproximou, em Pituaçu, do time multicampeão de Jesus. Mas precisa ainda corrigir a marcação no meio-campo e na defesa, que falhou demais contra o Bahia. Da maneira que jogou, entretanto, já dá pra dizer que voltou a ser um fortíssimo candidato ao título. Desde que, é claro, o técnico catalão que o dirige tenha entendido, de uma vez por todas, que esse não é um time de totó.
O fortíssimo elenco formado em 2020 permite até que esse time continue dominante, mesmo sem Gabigol e Bruno Henrique. Imaginem quando eles voltarem à forma. E que bela contratação foi a de Isla. Ao que tudo indica, só se sentirá a falta de Rafinha, na hora do cavaquinho, nas festas dos próximos títulos...
Retranqueiro
E o Vanderlei Luxemburgo que, mesmo jogando em casa, contra um Internacional, com vários desfalques, escalou o Palmeiras com cinco jogadores de meio-campo (três deles, volantes) e apenas um atacante? Covardia e mediocridade imperam.
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