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Renato Mauricio Prado

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Apesar do título brasileiro, Rogério Ceni precisa evoluir. Muito

Rogério Ceni conversa com Gabigol durante São Paulo x Flamengo na última rodada do Brasileirão 2020 - REUTERS/Amanda Perobelli
Rogério Ceni conversa com Gabigol durante São Paulo x Flamengo na última rodada do Brasileirão 2020 Imagem: REUTERS/Amanda Perobelli

01/03/2021 04h00

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Apesar do título brasileiro, Rogério Ceni precisa evoluir. Muito

O título do Campeonato Brasileiro, conquistado na bacia das almas, após mais uma derrota para o São Paulo, com os jogadores rubro-negros torcendo, na telinha de um celular, por uma decisão do VAR, no jogo do Internacional, no Beira-Rio, não pode, nem deve ocultar uma obviedade: o trabalho de Rogério Ceni, à frente do mais caro e talentoso elenco do futebol tupiniquim, ainda precisa evoluir muito para ser considerado bom e o ex-goleiro são paulino, um técnico de ponta.

É inegável que conta a seu favor o pouco tempo à frente do esquadrão que encantou o continente, em 2019, sob o comando de Jorge Jesus. Há pouco mais de três meses, Ceni assumiu, na verdade, uma equipe desmantelada e desorientada pelo "jogo de totó" de seu antecessor Domènec Torrent e, bem ou mal, aos trancos e barrancos, levou-a ao bicampeonato nacional.

Mas, antes disso (com um período de treinamentos ainda menor, reconheça-se), foi eliminado da Copa do Brasil (pelo mesmo São Paulo) e da Libertadores (que era o sonho dourado da temporada do Mais Querido). Salvou-o da Tríplice Coroa de Espinhos e do cadafalso da degola a conquista do Brasileiro - muito mais suada do que deveria diante da força do grupo que tem nas mãos.

Desde que chegou, o treinador parece à procura de um estilo: prometeu, inicialmente, reeditar a maneira de jogar de Jorge Jesus; depois, flertou com o jogo posicional de Dome e acumulou erros - e maus resultados. Mas teve, enfim, uma boa sacada: recuar William Arão para a zaga, escalando Diego como volante. Qualificou assim o passe na saída de bola e aumentou o talento no meio-campo, setor de armação da equipe. O desempenho da equipe melhorou, mas não o suficiente para reviver o encantamento e, principalmente, a objetividade e a regularidade do ano de 2019.

Em alguns jogos, é verdade, os atacantes se fartaram de perder gols. Mas em muitos outros, o domínio territorial e a posse de bola, por vezes, avassaladora, não conseguiram se refletir em ameaça real à baliza adversária. E tome de cruzamento alto sobre a área. E tome de empates e derrotas incompatíveis com o elenco que tinha à disposição. E nada de jogadas ensaiadas ou novidades táticas capazes de surpreender os rivais.

A derrota na última rodada, diante do São Paulo, que provocou o sofrimento até que o juiz trilasse o apito final no Beira-Rio, foi um bom exemplo de suas dificuldades: o Flamengo dominou o primeiro tempo, no Morumbi, mas foi incapaz de ameaçar de fato a baliza de Tiago Volpi. E acabou sofrendo um gol de falta, numa falha de seu jovem goleiro Hugo.

Empatou no início do segundo tempo (em uma bola alta), mas perdeu-se em outro erro de seu arqueiro. E aí, Rogério, uma vez mais, deixou clara uma de suas maiores deficiências: a leitura do que vê em campo e as substituições que faz durante os jogos. Precisando desesperadamente virar o placar, preocupou-se apenas em trocar o lateral-direito (Isla por Matheusinho) e um dos volantes (Diego por João Gomes). Nem os tijolinhos do Ninho do Urubu entenderam... E a derrota se consumou.

O titulo não escapou por questão de centímetros (da posição adiantada de Edenílson, no gol do Internacional, corretamente anulado pelo VAR, no finalzinho do duelo no Sul), mas a análise fria do campeonato não permite que o octacampeonato varra para debaixo do tapete as muitas deficiências que ainda existem no trabalho do treinador rubro-negro.

Ceni tem potencial. Pode vir a ser um técnico de ponta. Mas ainda está longe disso. Por enquanto, seu time vence muito mais na base do talento individual do que do coletivo. Gabigol que o diga, na arrancada que permitiu uma conquista que chegou a ser vista como perdida, até a inesperada derrota do Internacional para o Sport, no Beira-Rio.

Esta temporada de 2021 (que promete ser mais desafiadora que a de 2020) será sua prova de fogo. Contando com tantos jogadores excepcionais, ele precisa fazer o seu time jogar muito, mas muito mais do que jogou na temporada que acaba de se encerrar.

E para que isso aconteça ele terá que se despir de preconceitos (como o que tem em relação a usar Pedro e Gabigol juntos), de apadrinhamentos incondicionais (como manter Éverton Ribeiro como titular, sem jogar bulhufas rodadas após rodadas) e criar coragem para lançar os jovens talentos da base (como Ramon, sistemática e inacreditavelmente, preterido pelo medíocre Renê).

Isso tudo sem falar no óbvio dos óbvios: ensinar seus comandados a fazer gols de falta e seus goleiros a armar decentemente uma barreira e sair jogando com os pés. Se nem isso, em que ele era excepcional, for capaz, esquece...