Só para assinantesAssine UOL
OpiniãoEsporte

Entre Cláudio Coutinho e Adílio, Flamengo preferiu o jogador. E fez bem

Brown. Assim todos na Gávea o chamavam: companheiros, jornalistas e membros da comissão técnica. O apelido, que não o incomodava, nasceu por sua paixão pelas músicas e pelos passos de dança do superastro americano James Brown, cantor, dançarino, compositor e líder de sua banda nos 50, 60, 70 e 80. No walkman de Adílio (pesquisem o que era, jovens!), Sex Machine estava sempre no topo das músicas mais ouvidas.

Criado na Cruzada São Sebastião, bem perto da sede social do Flamengo, na Gávea, na zona sul do Rio de Janeiro, Adílio, na infância, pulava o muro do clube para garantir um trocado como boleiro nas quadras de tênis. Por lá, sua habilidade no controle das bolinhas, com os pés, acabou o levando para o time dente de leite rubro-negro. A partir daí é história: tornou-se um dos jogadores mais talentosos daquele timaço que ganhou tudo, até o Mundial, ao lado de gênios como Zico, Leandro e Júnior.

Sob o comando do técnico Cláudio Coutinho, apesar de toda a sua incrível habilidade como armador, chegou a jogar na ponta-esquerda, porque no meio-campo pontificava, em sua posição, Paulo César Carpegiani, maestro gaúcho que viera do Internacional de Porto Alegre. Muitas vezes, porém, Adílio começava no banco de reservas, pois na extrema havia também o endiabrado Júlio César, o Uri Geller, outro oriundo da Cruzada São Sebastião (*)

(* Conjunto habitacional inaugurado por Dom Hélder Câmara, secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que convencera o então presidente da República, Café Filho, a firmar um convênio para acabar com as favelas na cidade, transferindo seus moradores para esses novos prédios).

Na histórica final do Campeonato Brasileiro de 1980 (o primeiro dos oito conquistados pelo Flamengo), Adílio só entrou no segundo tempo, no lugar de Carpegiani, que ao final da temporada encerraria a carreira, abrindo de vez o caminho para Brown se firmar.

Curiosamente, porém, o técnico Cláudio Coutinho tinha outros planos e, pressionado pela perda do tão sonhado tetracampeonato estadual, preparou uma lista de dispensas onde estavam, entre outros, Adílio e Rondinelli!

Na necessidade de escolher entre o treinador e dois dos nomes mais adorados pela torcida, o presidente Antônio Augusto Dunshee de Abranches nem pestanejou: demitiu Coutinho, contratou Dino Sani e ficou com Adílio.

Dino não durou, e logo o time estava sob o comando de Carpegiani, que fez de Adílio seu substituto e titular absoluto. Assim ele ganhou a Libertadores e o Mundial, em 1981, os Brasileiros de 1982 e 1983 (foi dele o terceiro gol na final contra o Santos, num Maracanã com mais de 155 mil presentes) e um punhado de Taças Guanabaras e Cariocas.

Voz mansa e baixa, Adílio era gentil e educado. Não há na Gávea quem não gostasse dele. Quis o destino que sua chegada aos profissionais acabasse preenchendo a enorme lacuna aberta no elenco rubro-negro, dois anos antes, com a morte absurda de Geraldo Assobiador, numa simples operação de amigdalas. Geraldo era um "oito" de exceção, um cracaço, da geração de Zico. Adílio foi seu sucessor.

Continua após a publicidade

Descansa em paz, Brown, sua história jamais será esquecida pelos rubro-negros e por todos os torcedores amantes do bom futebol.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Deixe seu comentário

Só para assinantes