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Rodrigo Mattos

REPORTAGEM

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Omissão do governo Bolsonaro torna futebol sem critério na pandemia

Delegação do Vasco da Gama fez visita ao Santuário de Nossa Senhora Aparecida em viagem pela Copa do Brasil - Rafael Ribeiro / Vasco
Delegação do Vasco da Gama fez visita ao Santuário de Nossa Senhora Aparecida em viagem pela Copa do Brasil Imagem: Rafael Ribeiro / Vasco

18/03/2021 04h00

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Na sexta-feira, a CBF transferiu seis jogos da Copa do Brasil para fugir de restrições de cidades e Estado a jogos de futebol pelo agravamento da pandemia de coronavírus. Em seguida, teve que mudar de novo uma das partidas, porque Minas Gerais decidiu veta-la depois de indicar que a receberia. O cenário é resultado da omissão do governo federal de traçar uma regra única para o futebol. Assim, cada prefeitura e Estado define um critério diferente e o esporte mergulha no caos.

Quando o futebol foi paralisado no ano passado, foi por determinação das entidades esportivas ou de autoridades locais. Isso aconteceu na sequência do STF (Supremo Tribunal Federal) dar a municípios e Estados a prerrogativa de fechar comércios e atividades na pandemia. O presidente Jair Bolsonaro pregava pela continuidade do esporte e, depois, falou até em ter público nos estádios.

Seu Ministério da Saúde aprovou protocolos de segurança contra covid da CBF, inclusive com público. Mas, de resto, nem permitiu, nem vetou o futebol. Não se criou uma regra para quando deveriam ser aplicadas às restrições. Estava nas mãos de autoridades locais.

O agravamento da pandemia de coronavírus fez a média móvel de mortes ultrapassar 2 mil pessoas no mês de março —ontem (17) o índice foi de 2.031 mortes. Um levantamento da Fiocruz apontou que 24 dos 27 Estados estão com mais de 80% dos leitos ocupados. Na quarta-feira, acrescentou-se o Rio de Janeiro à lista. Foi chamado de colapso sanitário.

Como reação, há Estados inteiros onde não pode haver futebol como São Paulo. E há outros locais em que determinadas cidades não podem ter jogo como os casos de Acre, Amapá, Rondônia, Tocantins, Santa Catarina, e em outros municípios, sim. Há ainda governos estaduais como o cearense que seguiu com a Copa do Nordeste e vetou o regional.

"Se tivesse uma coordenação nacional, essa diretriz viria do Ministério da Saúde. Não teria uma divergência dos governadores. Não há como o campeonato paulista ser transferido para Minas Gerais que está em colapso", analisou o epidemiologista Diego Xavier, da Fiocruz, que trabalha no projeto Monitora Covid, que fez o quadro sobre acompanhamento dos hospitais no pais. "Não se está dizendo que está transferindo de São Palo para Minas porque está tranquilo. Beira o absurdo com essa transferência".

Xavier diz que é até possível criar um ambiente controlado no futebol em determinados clubes de elite. Mas, em um momento de agravamento da epidemia, não vê outra solução a não ser parar o futebol. Afirmou que particularmente problemáticos são os deslocamentos da Copa do Brasil com 80 times viajando pelo país.

"Se pensar no deslocamento da variante de Manaus, foi do deslocamento em férias. Acho difícil a postura de manter o futebol no momento em que todos os Estados estão em colapso de UTI. Isso significa que, independente de recursos financeiro, um atleta corre o risco de não ter acesso a hospitais privados. No sistema público, a gente prima pela vida. Seja só um óbito é importante e tem que ser evitado", completou Xavier.

Justamente a falta de critério único nacional aumentou os deslocamentos da Copa do Brasil. Sem poder jogar no seu Estado de origem, um time sai para jogar em um local neutro. São dois viajantes. E, com os vetos de Minas às partidas, equipes que já tinham viajado estão impedidas de jogar após já terem se deslocado.

A CBF tem se mostrado mais preocupada com os deslocamentos aumentando protocolos de segurança de hotéis e aviões. Mas ainda não há nenhum controle sobre a vida pessoal do atleta e têm havido vários exemplos de transgressões por parte deles.

"Se a pessoa tenta seguir no ambiente controlado, se fora dele não seguir, pode ser negativa no caso de covid, ser assintomático, testa toda a equipe, todo mundo sem reação, ele pode estar em um período em que não foi detectado e em um período depois pode jogar. O principal é o exemplo. Pessoas públicas como jogador de futebol têm que dar exemplo. Todo mundo está exausto, todo mundo está cansando de seguir as regras. Mas um ambiente fechado como um cassino (Gabigol) que pode causar infecção? Isso traz uma mensagem que o problema não é tão grave. Tentamos mostrar a gravidade apesar da gestão do governo federal e outros governos", completou Xavier.