Rodrigo Mattos

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Quais problemas explicam a má qualidade do gramado do Maracanã

A partida Fluminense x Olimpia transformou o gramado do Maracanã de coadjuvante em protagonista. Isso porque o campo virou um lamaçal após duas partidas seguidas de Fluminense e Vasco. Como consequência, houve troca de acusações entre os clubes pela qualidade do solo e até relacionado à gestão do estádio, de forma provisória nas mãos de Flamengo e Fluminense.

Mas por que a grama do Maracanã tem apresentado problemas de qualidade durante a temporada? Por que será necessário fechar o estádio por 20 dias até a Copa do Brasil para recuperar o campo?

Para responder à pergunta, é preciso ler um relatório de maio de 2023 feito pela engenheira agrônoma Maristela Kuhn. Contratada pela gestão do Maracanã, que é feita pelo consórcio formado por Flamengo e Fluminense, ela é uma referência na área e cuidou dos gramados da Copa-2014. Seus dados foram cruzados pelo UOL com informações da gestão do estádio carioca.

O laudo aponta três principais problemas:

1) sombreamento de uma parte do campo pela nova cobertura feita para a Copa

2) excesso de jogos em períodos de um mês

3) aquecimento dos times realizado no campo, que aumenta o desgaste

Sombra

A cobertura de lona feita para a Copa é maior do que a anterior do Maracanã. Com isso, há uma sombra na área do gol Norte, onde bate pouco sol.

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No verão, até fevereiro, isso não é um problema pelo sol forte no Rio. Mas, de abril a setembro, seria preciso trocar a grama de verão (Bermuda) pela de inverno (ryegrass). O Rio, no entanto, continua quente, obrigando que a substituição seja feita mais tarde. Então, há uma grama que precisa de mais luz quando não há tanto sol durante alguns meses.

Refletores são usados para compensar. Próximo de setembro, a grama de inverno começa a definhar. É o período em que estamos.

Desta forma, há um período mais crítico do ano, geralmente nos meses de abril, maio e setembro (quando o ryegrass já começa a definhar). Isto pode variar, de acordo, com o mês em que o ryegrass for semeado e com as variações de temperatura no período de inverno a cada ano, que vão interferir no estabelecimento, desenvolvimento e na persistência da grama de inverno.

Trecho do relatório da engenheira Maristela Kuhn

Excesso de jogos

O principal problema é a carga elevada de jogos. Pelo relatório, o Maracanã deveria ter idealmente de 4 a 6 jogos por mês. Poderia, sim, chegar a um número de 60 em um ano desde que essas partidas fossem bem distribuídas pelo ano.

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Para um campo de estádio, em que se deseja manter uma superfície de alta performance para as partidas, considera-se adequada uma carga de uso entre 4 e 6 jogos por mês (sem treinamentos ou aquecimentos pesados dentro do campo). Nos últimos 30 dias que antecederam esta inspeção, a caga de uso tinha sido de 12 jogos, o dobro do tolerado ou recomendado.

Trecho do relatório da engenheira Maristela Kuhn

A questão é que o calendário do futebol brasileiro prevê um número maior de jogos no período de outono e inverno, isto é, de abril a setembro. Há três competições, Libertadores, Copa do Brasil e Brasileiro, em que Flamengo e Fluminense atuam constantemente.

No verão, quando o gramado sofre menos, só há o Estadual, com carga menor de jogos. Os campeonatos teriam de ser melhor distribuídos pelo ano como ocorre na Europa.

No total, já houve 55 partidas no Maracanã em 2023. O Vasco x Atlético-MG foi o quarto em oito dias. Normalmente, a recomendação de Maristela Kuhn é de que fossem jogadas sementes logo após os jogos para recuperação da grama ryegrass. No final de semana, houve um jogo menos de 24 horas de intervalo e o replantio ocorreu na segunda.

"Deve-se considerar que os danos por pisoteio são cumulativos. O gramado, sendo um ser vivo, precisa de um tempo para sua recuperação, mesmo em períodos de crescimento ativo e com manutenção adequada", diz o relatório.

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A partir de setembro e outubro, em geral, reduz-se o número de jogos por datas-Fifa. É justamente quando chega a primavera e as condições do campo começa a melhorar.

Aquecimento

O relatório de Maristela Kuhn aponta que o aquecimento no campo do jogo é uma atividade que desgasta tanto ou mais do que os jogos.

"Além da carga de uso frequente, deve-se considerar o dano potencializado que os aquecimentos localizados trazem ao gramado. Prova disso é que não são somente os locais de mais uso do campo durante as partidas, (como a frente dos gols) que se apresentam com desgastes visíveis", diz o texto.

Pela apuração do blog, o principal problema são atividades intensas com vários jogadores, com rodas de passes. O relatório aponta que isso causa tração no gramado, desgastando-o.

A recomendação é que o aquecimento seja feito em áreas alternativas, na área externa ou em locais com grama sintética. As áreas do goleiro, como o prejudicado setor do gol Norte, deveriam ser preservados com aquecimentos com traves móveis nas laterais. Os setores à frente da área de técnicos também são prejudicados.

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A gestão do Maracanã já pediu para que sejam diminuídos os aquecimentos nos gramados. Mas o regulamento da CBF diz que eles podem ocorrer por 50 minutos antes do jogo. A Conmebol também exige a atividade. Ambas não admitiram mexer nas regras. Na visão da administração do estádio, é como se houvesse três tempos em cada jogo.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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