Críticas ao estádio do Flamengo têm misto de hipocrisia e preguiça
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O projeto de construção estádio do Flamengo começa a despertar um debate público sobre a desapropriação feita pela prefeitura do Rio para viabilizá-lo. Essa discussão é válida, saudável e necessária quando se fala de um empreendimento que teve participação da administração pública e tem impacto na cidade. Mas boa parte das críticas ao projeto até agora têm sido marcadas pela hipocrisia e preguiça.
Primeiro, para entender o contexto, a Prefeitura do Rio decidiu desapropriar o terreno do Gasômetro, no Centro da cidade, com o objetivo de vendê-lo ao Flamengo. O valor do leilão tem lance mínimo de R$ 138 milhões.
Essa medida ocorreu depois de fracassarem as negociações sobre a área entre o Flamengo e a Caixa Econômica. O banco é o gestor do fundo que é dono do terreno - fundo este que tem recursos do FGTS.
O fundo passou a existir no projeto do Porto Maravilha, feito para a Olimpíada do Rio-2016. Foi elaborado pela Prefeitura do Rio, com participação da Caixa, com operações em torno de terrenos e direitos construtivos. É uma ideia para desenvolver a degradada região: vingou só em parte até agora. Agora, a justificativa da prefeitura é que o estádio iria, enfim, turbinar o projeto estagnado.
Pois bem, as críticas em torno do projeto têm dois polos: 1) torcedores de outros times envolvidos no futebol que veem favorecimento da prefeitura ao Flamengo 2) Especialistas que entendem que urbanisticamente o projeto é ruim para a Rio.
Em relação ao primeiro polo, há uma enorme hipocrisia. É preciso que se diga que, sim, a medida do prefeito Eduardo Paes é um benefício ao Flamengo que não seria dado a uma empresa qualquer.
Mas o poder público, no Rio e em São Paulo, tem favorecido os clubes de futebol com diversas medidas. Todos os times grandes das capitais tiveram alguma ajuda:
1) Corinthians - terreno da Neo Química doado, títulos da prefeitura (do orçamento municipal) de R$ 400 milhões para construção do estádio, juros subsidiados do BNDES para empréstimo, desconto de imposto federal na obra, intermediação da Caixa na operação, carência para pagamento e não execução após falhas em quitar.
2) São Paulo - CT da Barra Funda em terreno público, com concessão da prefeitura
3) Palmeiras - CT da Barra Funda em terreno público, com concessão da prefeitura
4) Botafogo - Concessão do Nilton Santos pronto, com outorga baixíssima, e poder ao clube para administrar o estádio sem cessão a outros times.
5) Fluminense - Doação de terreno para CT, mais projeto de potencial construtivo das Laranjeiras para ser usado em reforma do local.
6) Vasco - Doação de terreno para CT, mais projeto de potencial construtivo para reforma de São Januário.
Pode-se questionar essas ajudas? Sim, quem entende que clubes de futebol são como empresas quaisquer pode argumentar que as prefeituras não têm que ajudar nenhum deles. E isso valeria para o Flamengo e para todos esses outros clubes. É uma alegação pertinente, que pode se concordar ou não. Defender que a prefeitura não deve ajudar o Rubro-Negro e as outras intervenções são legítimas é só hipocrisia, pura e simples.
Entendo que os clubes devem ter benefícios de prefeituras - dentro de limites da moralidade obviamente - porque prestam serviços à sociedade com sua existência. Proporcionam tanto retornos econômicos com a movimentação econômica do futebol (0,7% do PIB do Brasil), quanto algo menos tangível como bem-estar e formação cultural da sociedade. Nos EUA, onde a gestão do esporte é essencialmente privada, esse tipo de ajuda é bem comum em construções de equipamentos para atrair times.
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Quero receberHá uma outra corrente crítica ao projeto do estádio que não vê ganhos para a cidade, nem necessidade de um nova arena no Rio. Aí até agora os argumentos são construídos de forma bem preguiçosa porque não se preocupam em estudar as informações sobre o caso.
O Rio de Janeiro tem três estádios grandes, e quatro times. Em Buenos Aires, são sete arenas acima de 40 mil pessoas, cada clube grande tem um. Em Londres, são cinco estádios com capacidade maior do que esta, e um total de 39 na cidade, vários deles com mais de 20 mil pessoas. Cada clube grande tem sua arena.
E é uma necessidade econômica para o crescimento do Flamengo ter seu estádio, sem o qual o clube ficará para trás. Todas as agremiações usam arenas como base para todos seus negócios, além de poderem atender diversos tipos de público. E nunca é demais lembrar: o clube vai pagar a construção.
O Maracanã não comporta o tipo de exploração que se desenvolve no futebol moderno, nem os requisitos técnicos para gramado pelo excesso de partidas. É caro a ponto de os clubes raramente ficarem com mais de 50% da receita, e não tem como isso ser mudado porque foi feito para uma Copa do Mundo, com custos altos de manutenção.
Quando se argumenta que o Maracanã ficará obsoleto, é preciso lembrar que o estádio tem um excesso de demanda de jogos. Atualmente, são cerca de 70 a 80 por ano, algo impensável em qualquer cidade do mundo. Há um conflito entre Vasco e os gestores Flamengo e Fluminense por jogos lá. Seu modelo futuro é ser algo parecido com o Wembley - o próprio Flamengo pretende seguir com clássicos cariocas no estádio. Dá para gerir, pagar as contas, sem gerar lucro. É o que basta.
Se houver possibilidade financeira, o Fluminense também deveria ter um estádio de porte menor para só mandar jogos grandes no Maracanã. Os outros, de menor porte, se tornam deficitários no estádio.
Um dos argumentos críticos é que os estádios são próximos e isso poderia causar problemas de trânsito e violência. Ora, era só olhar as tabelas e constatar que a CBF não marca jogos dos times da cidade nos mesmos dias justamente por questões de segurança. É preciso estudar minimamente antes de atacar um projeto.
Quanto ao desenvolvimento da região, a área do Gasômetro está ociosa há anos. O fundo da Caixa, que tantos querem defender agora, não tinha desenvolvido nenhum projeto ou venda antes de o Flamengo se interessar. Na realidade, o fundo está dando prejuízo ano a ano justamente porque boa parte dos seus terrenos está sem finalidade. De novo, é só olhar as demonstrações financeiras do fundo.
Se alguém se preocupar em olhar as fotos do edital de leilão, outro documento que vale a consulta, verá galpões em estado lastimável abandonados há anos. Quando se fala em "pensar o desenvolvimento da cidade", parece que ali havia um parque arborizado. Na realidade é um terreno anteriormente industrial cercado de viadutos para todos os lados.
É uma área da cidade totalmente degradada, onde se colocaria um equipamento para gerar movimentação por toda a semana, já que o Flamengo terá de gerar receita para pagar a construção. Mais, o clube será obrigado a reformar a área em volta, calçamentos, conexões de mobilidade, iluminação, exigências padrão para este tipo de projeto, diga-se.
O argumento da ilegalidade também tem enorme dificuldade de ficar de pé visto que a legislação federal prevê desapropriação para construir estádios como uma das possibilidades. E o Flamengo vai comprar o terreno, não será dado, não vai gerar ônus para a prefeitura.
Então, repita-se, há um debate público necessário. O projeto, na realidade, nem está pronto para sabermos sobre seus ganhos, nem para a cidade, nem para o Flamengo. O próprio Conselho do clube tem que analisar os dados financeiros para saber se vale a pena levar tudo em diante. Assim como a prefeitura terá 18 meses para receber um projeto, analisa-lo e ajusta-lo para ficar mais benéfico para a cidade.
Mas, para fazer esse debate sobre o estádio, é preciso deixar de lado a hipocrisia clubística e estudar o caso antes, para no mínimo, usar argumentos ancorados na realidade.
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