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Ação da Fifa aumenta polêmica sobre trabalhadores imigrantes no Qatar

Van Dijk, durante treino da Holanda, em conversa com trabalhadores imigrantes - Julio Gomes/UOL
Van Dijk, durante treino da Holanda, em conversa com trabalhadores imigrantes Imagem: Julio Gomes/UOL
, Julio Gomes, Colunista do UOL e em Doha (Qatar)

18/11/2022 09h15

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"One, two, three, cheeeeese". O pedido por sorrisos na hora da foto veio de um Louis Van Gaal animado, empolgado, emocionado, até, com o evento. O treino da seleção holandesa, na noite de quinta-feira, em Doha, terminou com bate-bola, autógrafos e fotos entre os jogadores e alguns trabalhadores estrangeiros que participaram das obras de construção dos estádios para a Copa do Mundo.

A Fifa deu a todas as seleções algumas opções de encontros voluntários (não mandatórios) com pessoas que, de alguma forma, estiveram envolvidas na organização da Copa - o Qatar foi escolhido para ser sede em 2010 e, desde então, passou por uma revolução. Foram construídas cidades, estádios, museus e uma rede de metrô. A que preço? Segundo entidades não governamentais, mais de 6 mil trabalhadores morreram nas obras. Muitas das mortes, a maioria, por frágeis condições de trabalho e segurança. As famílias, espalhadas por países pobres da Ásia e da África, não receberam compensação alguma. A organização da Copa nega os números e as acusações.

A tentativa da Fifa de agradar e passar boa imagem acabou tendo resultado oposto - pelo menos nas sessões de treinos da Inglaterra e da Holanda, que a reportagem do UOL acompanhou nesta quinta-feira, na área metropolitana de Doha.

Muitos repórteres dos dois países e de outras regiões, principalmente da Europa, confundiram a ação - como se tivessem sido organizadas pelas associações de futebol de Inglaterra e Holanda, justamente para jogar luz ao problema. No estádio onde treinam os ingleses, os imigrantes que foram levados a dar entrevistas pareciam bem treinados - ou, pelo menos, não atenderam aos anseios da mídia local.

"Eu sou parte desta jornada aqui no Qatar e hoje me sinto recompensado por participar de um evento assim. Sou muito agradecido à Fifa. Fiz parte das equipes de saúde e segurança e os padrões do Qatar são perfeitos quando se trata de direitos humanos. Quando tivemos condições extremas (de calor), eles não permitiram que os trabalhadores ficassem expostos. Nestes cinco anos, nunca enfrentei nenhum problema nas construções", garantiu Jused Muatez, paquistanês, segurando uma mini bola da Copa e vestindo uma camisa da Inglaterra, toda assinada pelos jogadores.

"Você acha que representa os trabalhadores imigrantes?", desafiou o repórter de uma TV inglesa. "Claro que sim", respondeu Muatez.

"A FA (Federação Inglesa) não tem nada a ver com este evento, ele é todo organizado pela Fifa", disse ao UOL uma das responsáveis pela comunicação da seleção da Inglaterra, Anna Busch. "Nós sabíamos que essa confusão poderia ocorrer por parte da mídia, mas não podemos fazer nada", disse ao UOL uma pessoa do Comitê Supremo local, que organiza a Copa.

Nos principais jornais ingleses desta sexta-feira, o treino do English Team ficou em segundo plano. O "The Guardian" destaca declarações do Sindicato de Trabalhadores internacionais, que não vê qualquer tipo de ação do governo do Qatar para melhorar as coisas. Nesta sexta, o técnico Gareth Southgate disse que os ingleses acabaram "criando problemas para si próprios" ao levantar questões de direitos humanos no país do Golfo, mas que não impedirá jogadores de seguirem falando sobre o tema.

Em Al Wakra, os ingleses fizeram fotos com os jogadores e trocaram cobranças de pênaltis. Já na Universidade do Qatar, onde treinou mais tarde a Holanda, o clima foi ainda mais descontraído, com uma espécie de rachão entre atletas e imigrantes. Nitidamente os jogadores holandeses tentaram puxar papo com os trabalhadores, interagir, mas Frenkie De Jong resumiu bem a dificuldade para tratar de assuntos sérios em um momento de descontração e deslumbramento.

"Eu perguntei sobre a situação aqui, mas eles só estavam tão felizes de estar com a gente que não queriam falar de nada. Um deles só queria me convencer a jogar no Liverpool!", contou o meia do Barcelona, que tem o nome especulado para possivelmente ir ao clube inglês em janeiro. "Mesmo que começássemos a perguntar sobre o tema (das obras e condições de trabalho), eles já iam para uma próxima pergunta. Espero ter dado a eles um dia legal, a energia positiva que eles trouxeram foi muito legal. Agora, vamos focar no futebol", resumiu Van Dyjk.

O capitão da Holanda era um dos mais animados nos treinos, conversando com vários dos trabalhadores imigrantes. Um assessor da seleção laranja, Jaap Paulsen, contou que a Holanda fez questão de trabalhar junto com o Comitê Supremo e ao Sindicato dos Trabalhadores Imigrantes para se certificar de que os convidados para o treino haviam, de fato, participado das obras de construção dos estádios.

Quando questionada sobre o tema pelo UOL, a representante do Comitê fez uma expressão de espanto, seguida de certo sarcasmo. "Nós que organizamos tudo", falou.

De fato, um dos trabalhadores, Solomon Jest, de Gana, conversou com alguns repórteres locais e parecia menos empolgado com as autoridades qatarianas do que o colega paquistanês que estava no treino da Inglaterra. "Para mim, as coisas ocorreram bem, não sei sobre outros. Nunca vi nada, mas ouvi histórias, claro. Daqui a alguns meses, minha jornada acaba por aqui e quero ir a outro país, talvez para a Europa", finalizou. "Chega de Qatar".