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História de massacres e canibalismo leva Fifa a vetar 'cruzados' no Qatar

Torcedor inglês usa fantasia que remete às cruzadas na partida contra o Irã, pela Copa do Mundo. - DeFodi Images/DeFodi Images via Getty Images
Torcedor inglês usa fantasia que remete às cruzadas na partida contra o Irã, pela Copa do Mundo. Imagem: DeFodi Images/DeFodi Images via Getty Images

Do UOL, em Doha (Qatar)

29/11/2022 10h53Atualizada em 29/11/2022 17h26

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A Fifa confirmou que proibiu um grupo de torcedores ingleses de entrarem nos estádios da Copa vestidos de cavaleiros das cruzadas. Uma porta-voz da entidade afirmou ao UOL que especialistas da entidade alertaram que a fantasia é considerada ofensiva em países islâmicos.

A fantasia imita a vestimenta dos cavaleiros medievais que lutaram para retomar Jerusalém dos muçulmanos entre os séculos 11 e 13 e vinha sendo usada nas últimas Copas em contexto festivo e de exaltação da cultura inglesa. Mas a história dessas campanhas religiosas e militares tem relatos de massacres de povoados inteiros e até de canibalismo praticado pelos cristãos contra a população islâmica de cidades conquistadas. Para evitar ofender o país da Copa e os demais muçulmanos, a Fifa preferiu banir a fantasia.

Alguns dos torcedores ingleses já haviam sido barrados na estreia de sua seleção contra o Irã, embora ao menos um tenha conseguido entrar no estádio. No jogo seguinte, contra os EUA, já não foi possível vê-los nas arquibancadas. Os "cruzados" devem seguir ausentes hoje (às 16h), contra o País de Gales, duelo britânico decisivo no grupo B. No começo da Copa, eles podiam ser vistos passeando pelos pontos turísticos de Doha com a fantasia, como em uma tarde recente no Souq Waqif, o principal mercado do Qatar.

A vestimenta traz uma cruz cristã no peito, armadura falsa e espada de brinquedo e tem sido usada há muitos anos. Na Copa de 2014, no Brasil, o UOL fez reportagem com um deles que estava vestindo a mesma roupa por três dias em Manaus. No Qatar, o grupo vinha usando a fantasia junto com o tradicional gutra, o acessório que os homens árabes usam na cabeça.

As cruzadas foram uma série de expedições militares iniciadas sob ordem do papa Urbano 2º no século 11 que tinham como objetivo retomar o controle da cidade de Jerusalém, que havia sido conquistada pelos muçulmanos no século 7. Do ponto de vista islâmico, as cruzadas são lembradas pelos massacres promovidos pelos cavaleiros às populações das cidades conquistadas.

O cerco de Ma'arra, em 1098, é apontado como um exemplo da crueldade dos cavaleiros ocidentais. De acordo com relatos da época, as tropas comandadas pelo cavaleiro Raimundo Pilet d'Alès cercaram a cidade de Ma'arra, no sul de Damasco, território da atual Síria. Depois de negociar a rendição dos habitantes, Raimundo não conseguiu controlar seus homens, que avançaram sobre a cidade e promoveram o massacre da população.

Segundo o cronista cristão Rodolfo de Caen, uma parte da tropa passou então a comer os mortos no conflito: "Alguns disseram que, sofrendo pela falta de comida, eles ferveram os pagãos adultos em panelas, empalaram as crianças em paus e devoraram elas grelhadas." Os relatos de canibalismo nessa expedição foram confirmados por outros cronistas cristãos da época.

No ano seguinte, os cavaleiros conseguiriam retomar Jerusalém, onde também promoveram uma matança. No Domo da Rocha, local onde segundo a tradição islâmica Maomé subiu aos céus, cerca de 10 mil pessoas foram mortas, de acordo com o cronista Foucher de Chartres, que acompanhou o exército.

No livro "As Cruzadas Vistas Pelos Árabes", de 1983, o escritor libanês Amim Maalouf mostra como as populações árabes ao longo dos anos interpretaram os cavaleiros cristãos que marcharam sobre suas terras na Idade Média. Eles seriam homens violentos, selvagens e sem piedade. "As cruzadas são ainda hoje tidas como uma violação", afirma.

  • O Posse de Bola traz comentários de Arnaldo Ribeiro, Eduardo Tironi, José Trajano, Casagrande e Milly Lacombe sobre os destaques do dia da Copa do Mundo, confrontos das oitavas de final e mais. Assista: