O (sofrido) ensaio sobre a cegueira de Lionel Messi
Classificação e Jogos
De repente, todos deixaram de ver. Um apagão. Holandeses e argentinos na escuridão total. Cegueira pura. Houve, no entanto, quem continuasse a enxergar na perfeição. Logo ele. Um solitário camisa 10 em campo.
Lionel Messi ficou um passo a frente. Livre, leve e solto. Teve liberdade de sobra para sobressair e decidir sozinho. Por que usufruir de tamanha vantagem quando, mesmo em condições iguais, não haveria alguém do mesmo nível no resplendor?
Um drible. Espaço aberto. O mínimo detalhe: um toque sem olhar. Para ser justo com os demais. Sobretudo, para colocar de forma premeditada Molina na cara do gol para iluminar o caminho da sofrida classificação às semifinais.
O facilitismo nunca foi - e nunca vai ser - uma especialidade daquele que sempre preferiu transformar a dificuldade em facilidade. Não confundir uma coisa com a outra, por favor. Parecem semelhantes, mas não são. Muito menos para um gênio.
Já são cinco participações em Copas do Mundo, a última delas agora no Qatar, e duas décadas de puro brilhantismo para, no apagar da noite, resolver sentar no conforto do comodismo. Olha que, com 35 anos nas costas, até poderia. Nada disso.
Não tardou e fez-se então luz no iluminado Lusail Stadium. A arbitragem pôde verificar sem qualquer obstáculo o pênalti em cima de Acuña. Oportunidade aproveitada em pleno pelo agora maior artilheiro argentino da história em Mundiais, com dez gols, ao lado de Batistuta.
A Holanda abriu os olhos e não desistiu. Enxergou para além da realidade. Encontrou forças para ver e crer. Diminuiu o placar, se jogou ao ataque e, aos trancos e barrancos, conseguiu o empate: 2 a 2. Levou o duelo para a prorrogação. Deixou os argentinos cegos de raiva.
Mais 30 minutos de bola rolando. De puro nervosismo. A Argentina quase se livrou das penalidades máximas, mas parou na trave. Foi preciso mesmo esperar pelo craque da equipe sair das sombras e abrir as cobranças. Fez com classe. Entregou depois o futuro nas mãos de Martínez e correu para o abraço. Para mais uma consagração.
Uma assistência. Dois gols de pênalti. Três momentos decisivos. Um triunfo histórico. Mais um espetáculo para o mundo acompanhar atentamente e aplaudir. Um verdadeiro ensaio sobre a bola, cujo próximo ato tem adversário marcado: a Croácia, não o Brasil.
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