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Belletti cobra autoria do lance de Valdivia: "eu inventei o chute no vácuo"

Belletti revelou que fez gol pelo Barça usando o "chute no vácuo" para enganar rival - Photocamera
Belletti revelou que fez gol pelo Barça usando o "chute no vácuo" para enganar rival Imagem: Photocamera

Alexandre Sinato e Gustavo Franceschini*

Em São Paulo

17/05/2011 07h00

São 22 títulos na carreira, entre eles uma Copa do Mundo e uma Liga dos Campeões. Não satisfeito, Belletti ainda quer ser reconhecido como o criador do “chute no vácuo”, lance que ficou popular com o meia Valdivia do Palmeiras. Em entrevista ao UOL Esporte, o lateral lembra, em tom de brincadeira, que utilizou a técnica em 2004, muito antes do chileno irritar os adversários com o movimento.

O lance aconteceu em um amistoso do clube catalão em 2004, contra um combinado que se auto-denominava “seleção do mundo”. De frente para o goleiro, ele chuta o ar, engana o rival e bate no ângulo, fazendo o primeiro gol dele pelo Barcelona.

O segundo é, também, o mais importante da carreira do lateral. Nesta terça-feira, Belletti comemora cinco anos do marcante gol na final da Liga dos Campeões, contra o Arsenal. O jogo estava 1 a 1 e ele anotou o gol do título.

“Por mais que você pense em vencer e ser campeão, sendo lateral você nunca pensa em marcar o gol do título em uma final de Champions”, disse Belletti, que, no entanto, lembra de outro momento importante quando se trata de final da Liga dos Campeões: a disputa de pênaltis contra o Manchester United, em 2008, quando ele defendia o Chelsea.

“Eu quase vomitei de nervoso quando caminhei do meio-campo até a área. Foi o momento mais nervoso da minha carreira. Foi para os pênaltis e perguntaram: ‘quem quer bater?’ Ninguém falou nada. Eu disse que bateria, mas que não seria o primeiro. Fui o segundo. O Ballack, que era o batedor oficial, foi o primeiro a bater, mas só falou depois de mim”, disse, rindo, o lateral.

BELLETTI COMENTA O GOL NA DECISÃO DA LIGA E A SUA COMEMORAÇÃO SOLITÁRIA

Confira a íntegra da conversa com Belletti abaixo:

UOL Esporte: Como você avalia a sua carreira, com tantos títulos, tendo sido tão criticado ao longo dos anos pelas limitações técnicas?
Belletti:
Eu, de moleque, não sonhava nem com a metade. O que me fez conseguir tudo isso foi pensar em ser útil para o time. Aí dizem: ‘foi sorte, ele sempre estava no lugar certo’. Mas a sorte ajuda quem trabalha. Não adianta ficar em casa com a perna para cima achando que vão bater na porta e perguntar se eu quero jogar no Barcelona. Tem de aproveitar a oportunidade.

UOL Esporte: Mas você foi alvo de muitas críticas. Em 2002, por exemplo, o Casseta e Planeta, da Globo, fazia piada com o fato de que você só aparecia no jogo cobrando lateral. Como você lidava com isso?
Belletti:
Aí depende de como você vê. Eu podia pensar que os caras estavam me sacaneando. Não. Eu pensei: ‘o Casseta e Planeta está fazendo uma piada sobre um moleque lá de Cascavel, que era goleiro de futebol de salão’. Eu já fui em muitos programas de TV, ando na rua e as pessoas me parabenizam. Outro dia eu fui em um programa com campeões olímpicos, estrelas da TV e os caras parabenizando pela minha carreira.

UOL Esporte: Como foi quando te contaram que o Barcelona queria te contratar?
Belletti:
Foi o Sandro Rossel, vice-presidente do Barcelona na época [hoje presidente]. Quando eu estava na seleção ele era o representante da Nike, então ele me conhecia. Ele me ligou e disse: ‘E aí está tudo bem? Estou te ligando porque estou indo falar com o presidente do Villarreal [clube de Belletti na época] para te contratar’. Falei: ‘você está de sacanagem, né? Me deixa quieto aqui, fica fazendo brincadeira sem graça’. Ele respondeu: ‘não, tanto que a gente marcou amanhã de almoçar e saindo do almoço eu te ligo’. E deu tudo certo e fui para lá.

UOL Esporte: No lance do famoso gol da final da Liga dos Campeões, o Ronaldinho comemora com as mãos na cabeça, meio incrédulo. Por que ele teve essa reação?
Belletti:
É porque aquele foi o meu primeiro gol no Barcelona. Por isso que ele ficou espantado. Ele nunca veio comemorar comigo, sabe? Antes, eu só tinha marcado em um jogo amistoso, logo que eu cheguei. Aliás, vocês têm de procurar esse gol, foi um golaço. Esse chute no vácuo que o Valdivia dá, eu que inventei [risos].

UOL Esporte: E como era a relação com essas estrelas no vestiário? Tinha alguém mais marrento, alguma briga dentro do grupo?
Belletti:
É difícil você administrar um grupo tão grande, então é normal que existam grupinhos, mas nada que interfira dentro de campo. O mais difícil é ganhar respeito dos jogadores, é uma raça difícil [risos]. Muitos se acham melhores que os outros. O Ballack, por exemplo, é um cara complicado. O cara é alemão, bebe água quente, era difícil. Mas eu me dava super bem com ele. O Henry é outro, que as pessoas acham um cara mala. E ele é gente boa demais. Joguei um mês com ele no Barcelona. Mas sempre jantava com ele em Londres quando ele ia para lá. Quando eu ia em Barcelona também. Todo mundo que o pessoal acha mala eu me dou bem.

Eu podia pensar que os caras estavam me sacaneando. Não. Eu pensei: ?o Casseta e Planeta está fazendo uma piada sobre um moleque lá de Cascavel, que era goleiro de futebol de salão?.

UOL Esporte: Qual foi o melhor jogador que você viu jogar?
Belletti:
Dentro de campo, o melhor que já vi foi o Zidane. Mas o Riquelme também é demais. Parece que ele vê o jogo um dia antes e no dia já sabe tudo que vai acontecer, porque ele pensa antes de todo mundo. Você não precisa chamar a atenção dele e pedir a bola, antes disso a bola já está lá na frente só esperando sua ultrapassagem. O Ronaldo Fenômeno também é brincadeira. O Messi já não tem isso, é mais bola no pé.

UOL Esporte: E o melhor técnico?
Belletti:
O melhor foi o Guus Hiddink [com quem Belletti trabalhou por seis meses no Chelsea]. Eu gostaria de seguir o trabalho do Mourinho, mas ele tem um defeito: o trato com a imprensa. O Hiddink já sabe lidar melhor com isso. São caras que sabem lidar com craques e tocam bem o dia a dia. Sabem dar treino. São caras de quem eu tenho anotação até hoje no meu computador.

UOL Esporte: Já que você mencionou sua passagem pelo Chelsea, como foi aquela decisão da Liga dos Campeões nos pênaltis?
Belletti:
Eu quase vomitei de nervoso quando caminhei do meio-campo até a área. Foi o momento mais nervoso da minha carreira. Foi para os pênaltis e perguntaram: ‘quem quer bater?’ Ninguém falou nada. Eu disse que bateria, mas que não seria o primeiro. Fui o segundo. O Ballack, que era o batedor oficial, foi o primeiro a bater, mas só falou depois de mim.

SUPERSTIÇÃO FEZ A SELEÇÃO ATRASAR ENTRADA NA FINAL DA COPA DE 2002

UOL Esporte: E o Terry, ficou muito chateado por ter perdido o pênalti decisivo por um escorregão?
Belletti:
Ficou nada. Lá dizem que ele ganha 150 mil libras por semana. Você acha que ele vai se importar com o pênalti perdido? Mas era um baita jogador. Como capitão ele foi o melhor que eu já vi. Fala de igual para igual com todo mundo, dá bronca em todo mundo, fala com o técnico, com o diretor... É um cara muito diferenciado.

Nota da Redação: John Terry bateu o último pênalti do Chelsea, quando o time estava com vantagem na contagem. O zagueiro escorregou e perdeu. Nas cobranças alternadas, Anelka perdeu outra cobrança e o Manchester United foi campeão.

UOL Esporte: No ano passado você foi campeão brasileiro com o Fluminense e neste ano o time vive uma crise, inclusive no elenco. Como você vê tudo isso?
Belletti:
Estava tudo muito certo para ser campeão. Ninguém ligava muito para as coisas ruins. Eu podia estar puto de estar no banco, mas entendia a situação e a opção do Muricy. Aí com o título mudou a diretoria, mudou a assessoria de imprensa, que o Muricy confiava, e aí começou uma reação em cadeia.

UOL Esporte: E qual era a relação com o Fred? Recentemente, Emerson e Deco falaram que não são amigos dele.
Belletti:
Ali eu tinha uma relação de amizade só com o Emerson e o Deco, que eram casados também. O Fred é solteiro, tem uma vida diferente da rotina familiar que a gente tinha. É natural que ele não seja amigo de quem é casado.

UOL Esporte: Qual foi o maior erro da sua carreira?
Belletti:
Quando eu jogava no São Paulo, o Parreira quis me botar de lateral contra a minha vontade, porque na época eu era volante. Por falta de experiência e não ter tanto contato para falar de homem para homem, a gente acabou brigando por meio da imprensa. O Parreira falava que se eu mudasse para a lateral ia ser o melhor do mundo. Quando eu saía da sala dele, os jogadores falavam que eu jogava muito no meio, que era seleção, que não tinha de ouvi-lo. Ter a confiança dos jogadores me satisfazia mais que a do técnico. Coisa da época. Faltava experiência. Encontrei o Parreira muitas vezes. Eu jogava na lateral e cada vez que tinha oportunidade de cumprimentar eu fazia, no meio do jogo mesmo. Era pra deixar bem claro que a minha idade naquele período atrapalhou a relação com ele. 

*Produção de vídeo e edição de Alexandre Santos, César Cuninghant e Priscila Gomes