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Glamour portenho dá lugar a sonhos no primeiro Boca x River do Sergipe

Cantor Beto Caju (esq.), torcedor do River Plate-SE, ao lado do presidente do Boca   - Divulgação/Boca Junior
Cantor Beto Caju (esq.), torcedor do River Plate-SE, ao lado do presidente do Boca Imagem: Divulgação/Boca Junior

José Ricardo Leite e Lucas Tieppo

Do UOL, em São Paulo

06/03/2013 06h00

Não é Buenos Aires, mas sim Estância, em Sergipe. O estádio Governador Augusto Franco, o "Francão", substitui como palco a mítica La Bombonera ou o grandioso Monumental de Nuñez. No lugar de dezenas de milhares de torcedores, serão no máximo oito mil pessoas. E, em vez de valer pelo Apertura ou pela Libertadores, será pela quinta rodada de um estadual brasileiro. 

Genéricos dos célebres times argentinos, Boca e River Plate farão nesta quarta-feira, às 20h15 (horário de Brasília), o primeiro "clássico argentino" do Sergipe. Fundados recentemente, as duas equipes estiveram simultaneamente na primeira divisão por três vezes, mas nunca se encontraram.

“Falamos pra eles que é um clássico. Lá na Argentina é especial. Nós não somos os originais Boca e River, mas o pessoal aqui leva a sério. Vamos fazer um jogo disputado. Todos têm feito muita propaganda dessa partida. É um jogo especial e que  tem visibilidade pra nós aqui no Sergipe”, falou o técnico do Boca, Pedro Santos, ao UOL Esporte.

Do outro lado, com dois títulos estaduais na bagagem, o duelo é levado com menos entusiasmo. 

"Para nós é um jogo normal. O entusiasmo mesmo vem de fora, pois despertou o interesse da mídia de fora do estado. A rivalidade não existe. É um jogo importante sim, mas porque perdemos os últimos dois jogos", disse Ernando Rodrigues, presidente do River. 

BOCA JUNIOR DO SERGIPE

  • Divulgação/Boca Junior

A Sociedade Boca Júnior de Futebol Clube se localiza em Estância (70 km de Aracaju), litoral sul do Sergipe, cidade de aproximadamente 60 mil habitantes. A equipe migrou para a cidade há dois anos, vinda de Cristianópolis. De acordo com o presidente, Gilson Miguel Behar, a mudança ocorreu porque o antigo município não tinha estrutura para um time profissional.

A fundação do time foi em 1993, ainda como amador. Passou a disputar campeonatos de várzea e de categorias de base até se profissionalizar em 2004. Passou a jogar com as cores e o nome do maior campeão argentino por pura admiração. “Tínhamos que escolher um nome e havia meninos que gostavam do Maradona e do Caniggia. Tínhamos admiração pelo futebol do Boca. Falei com amigos sobre a ideia e o nome foi aprovado”, afirmou Behar.

A falta da letra “s” no final do nome original do time da Bombonera, segundo o dirigente, é para não perder as raízes brasileiras. “Ah, não poderia ficar igual, né? Tinha que ter algo desse país maravilhoso”, afirmou.

A admiração do cartola é tanta que ele colocou o nome de um dos maiores craques da equipe argentina em seu filho. Riquelme Miguel da Silva Santos tem nove anos e, segundo o pai, surge como futuro craque da base. “É canhoto e número dez. E não é porque é filho do presidente não”, disse o dirigente.

A média atual de público em Estância é de cerca de 1.500 pessoas. Mas, segundo Behar, o plano é de que em cinco ou seis anos a torcida abrace o time.  Disputou a primeira divisão do estado em 2005, 2006 e 2008, sendo rebaixado nas duas últimas. Tem como maior glória o título da segunda divisão local no ano passado.  

Apoio ou parceria com o Boca argentino são apenas um sonho distante. Nunca houve sequer um telefonema de um dos lados para uma aproximação. “Nunca tivemos contato. Rapaz, acho que seria um sonho pra gente, porque o Boca Junior é um time pobre ainda, com oito anos como profissional, não tem patrocinador forte. Se eles quisessem ajudar seríamos muito mais fortes. Aqui nunca chegou ninguém pra ajudar.”

RIVER PLATE DO SERGIPE

Apesar de hoje desdenhar da rivalidade com o Boca, o atual River Plate surgiu em 2007 vislumbrando um confronto com o time de Estância. Antes disso, o clube, que é da cidade de Carmópolis (40 km de Aracaju), se chamava São Cristóvão e disputava apenas torneios amadores no estado.

Com a chegada do cantor e compositor Beto Caju ao clube, foi decidida a mudança de nome e desde então o Rivar Plate “genérico” só cresce.

Em 2011, Fernando França, então patrono do River, fez uma visita ao xará argentino e tentou uma parceria que não teve sucesso. Mesmo assim, a visita ao país vizinho mudou a história do clube.

“O Fernando voltou com os uniformes do River, com a faixa no peito, e este passou a ser o uniforme do nosso River. Antes ele era todo vermelho”, lembrou Ernando Rodrigues.

Em alta no Sergipe, o time não descarta um novo contato com a equipe argentina, que ainda tenta se reerguer após passagem pela segunda divisão.

“Quem sabe não dá certo. É difícil pois o River é um time pequeno, mas a imprensa argentina nos procurou após a queda deles, sabem nós existimos. Tentaremos sim", completou o dirigente. 

SEM RIVALIDADE, MAS COM PROVOCAÇÃO

Se a falta de confrontos anteriores faz a rivalidade em campo ser desconhecida, isso é compensado com falatório para aquecer o jogo. Do lado do Boca, provocações de que o jogo nunca existiu só porque o River sempre fugiu de amistosos.

“O River Plate nunca quis fazer nem amistoso, a gente convidou, já teve TV que queria fazer matéria. Eles não aceitavam. Agora não tem jeito, vão ter que jogar”, falou o presidente do time de Estância.

Ernando se defende das acusações do adversário. "Tivemos alguns pedidos sim, mas as datas coincidiam com outros jogos nossos mais importantes, então não teve como fazer nenhum amistoso", lembrou. 

Os “xeneizes sergipanos” também dizem que o rival é mais rico e, por isso, se acha superior. “Lá é terra do petróleo, eles tem estrutura de time grande. São mais ricos, a cidade ajuda, a prefeita dá R$ 200 mil por mês pra eles, enquanto a nossa folha de pagamento é de R$ 40 mil por mês. Eles têm dinheiro certinho, o petróleo movimenta a cidade. Se acham mais do que a gente porque têm mais dinheiro. Acham que vai ser moleza passar por cima da gente”, disse o presidente do Boca, que promete dificuldades.

“Eles podem ter mais estrutura, mas a capacidade e vontade das pessoas é igual. Muitas equipes chegam aqui pensando que são os reis da cocada preta, mas chega dentro de campo é outra coisa. A equipe do Boca tem pessoal de qualidade e honestidade. É isso que vai fazer sairmos com bom resultado”, falou o capitão do time azul e amarelo, o volante Jéferson.

A estrutura do River, de fato, é maior e já foi traduzida em resultados mais expressivos, como os títulos sergipanos de 2010 e 2011, e participações em torneios nacionais - nas duas vezes que disputou a Copa do Brasil, foi eliminado pelo Botafogo, em 2010, e Grêmio, no ano seguinte. 

"Somos um clube bem estruturado, brigamos por títulos com os times mais populares aqui do Sergipe, como Confiança e Sergipe. Ganhamos dois campeonatos nos últimos três anos. O investimento é bem maior e eles estão vindo de carona", provocou Ernando, que confirmou que a folha salarial do clube está perto dos R$ 200 mil mensais. 

BICHO MAIOR DE UM LADO, DESDÉM DO OUTRO

“Todo jogo tem bicho. Pra esse não vai ser diferente. Vai ter um bichozinho maior, vamos fazer história se vencermos o primeiro clássico”, falou o presidente do Boca.

Já Ernando não pretende dar um prêmio especial para seus jogadores por conta da partida desta quarta-feira. "Aqui nós trabalhamos com metas por turnos ou campeonatos, não por jogo, e não vai ser diferente. Pagamos de R$ 70 a R$ 100 mil", afirmou o presidente do River. 

"FRANCÃO", COM CAPACIDADE PARA 8 MIL PESSOAS, É PALCO DO CLÁSSICO

  • Divulgação/Boca Junior