Governo quer baixar MP para perdoar 90% de dívida bilionária de clubes
O governo federal prepara uma MP (medida provisória) para perdoar a dívida bilionária dos clubes de futebol em impostos, taxas e contribuições. Pelo projeto formatado por executivos do Ministério do Esporte e deputados federais, os clubes trocarão 90% da dívida que possuem com o governo pelo compromisso de realizar projetos sociais, que envolvem a abertura de suas estruturas esportivas gratuitamente para jovens das comunidades próximas aos clubes. A dívida dos 20 principais clubes do futebol brasileiro está avaliada em pelo menos R$ 4 bilhões pela pasta do Esporte.
Ainda não há data definida para a apresentação da MP, mas membros do governo e parlamentares favoráveis à solução esperam que ela esteja pronta antes da Copa das Confederações. De acordo com o secretário nacional de Futebol e Defesa dos Direitos do Torcedor, o jornalista Toninho Nascimento, a iniciativa não pode ser chamada de perdão, já que prevê uma contrapartida dos clubes de futebol em troca da anistia da dívida.
Dívidas x Receitas 2011 - Em R$ Milhões*
Dívidas | Receitas | Indicador | |
Atlético-MG | 368 | 100 | 3,7 |
Botafogo | 564 | 59 | 9,6 |
Corinthians | 178 | 290 | 0,6 |
Cruzeiro | 120 | 129 | 0,9 |
Flamengo | 355 | 185 | 1,9 |
Fluminense | 405 | 80 | 5,1 |
Grêmio | 199 | 143 | 1,4 |
Internacional | 197 | 198 | 1,0 |
Palmeiras | 245 | 148 | 1,7 |
Santos | 208 | 189 | 1,1 |
São Paulo | 158 | 226 | 0,7 |
Vasco | 387 | 137 | 2,8 |
"Eles vão ter que fazer a parte deles, que não é pequena", afirmou o secretário, em entrevista ao UOL Esporte. "E haverá punições para quem não cumprir o acordo", diz ele, justificando a renúncia bilionária a que pretende submeter o erário público com o argumento de que clubes de futebol não são empresas comuns. "Não podemos tratar os clubes de futebol, alguns com mais de 100 anos de idade, como empresas comuns", afirma. "É uma oportunidade dos clubes modernizarem suas gestões, um impulso".
Segundo Nascimento, entre as sanções previstas está a possibilidade de o clube faltoso no acordo de anistia da dívida perder pontos e até ser rebaixado no Campeonato Brasileiro, além de perder acesso a financiamentos públicos e ser impedido de estabelecer contratos com entes federais. "Qual dirigente que será louco de deixar isso acontecer com o seu time e sua torcida?", indaga o jornalista-secretário.
Assim, de acordo com o exposto por Toninho Nascimento, não há forma prevista de restabelecer a dívida dos clubes que não fizerem o combinado. O que está previsto são apenas sanções às agremiações, mas não uma forma de obrigá-los a cumprir o acordado.
A fórmula
O que será proposto aos clubes é que, em troca do perdão de 90% das dívidas que possuem os clubes originárias da falta de contribuição ao INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social), impostos não recolhidos à Receita Federal e falta de pagamento de FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), as entidades esportivas deverão investir em projetos sociais que envolvam atividades esportivas. Para isso, deverão abrir suas estruturas para jovens carentes receberem aulas de diversas modalidades, como natação e ginástica olímpica, gratuitamente.
Os outros 10% da dívida deverão ser pagos em dinheiro, de forma parcelada. Para os 90% anistiados, será criado um mecanismo de conversão da dívida, com desconto. "Por exemplo, se o clube deve R$ 100, pode investir R$ 70 ou R$ 80 em um bom projeto de base, e assim quitar essa dívida", explica o secretário nacional de Futebol. "A dívida dos clubes é impagável. É uma maneira de investir na formação de jovens talentos e futuros atletas, de fortalecer o esporte brasileiro", acredita Nascimento.
De acordo com ele, os clubes ficarão livres para retirar suas certidões negativas de débito com a União e voltar a pleitear financiamentos e linhas de crédito público. Ou seja, o clube poderá pegar dinheiro público emprestado para investir em suas infraestruturas esportivas e pagar os projetos sociais com os quais estarão pagando suas dívidas.
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A ideia é do deputado federal Vicente Cândido (PT-SP), vice-presidente da FPF (Federação Paulista de Futebol) e sócio de Marco Polo Del Nero, presidente da FPF e vice-presidente da CBF, em um escritório de advocacia. Ele é autor de um anteprojeto de lei sobre o tema, que é utilizado de base para o texto da medida provisória elaborada pelo Ministério do Esporte. "É uma mudança de paradigma, o governo brasileiro passa a agir diretamente no desenvolvimento de novos atletas e talentos", discursa o deputado. Para ele, com anistia, os clubes de futebol terão condições de criar e revelar atletas de várias modalidades.
Raspadinha
O texto, além do perdão da dívida, prevê incrementos na receita dos clubes de futebol. Os recursos da Timemania, espécie de loteria dos clubes de futebol criada para justamente pagar as dívidas das agremiações, irão para os clubes utilizarem em seus projetos sociais. Em 2012, a Timemania rendeu R$ 66 milhões em abate da dívida dos clubes, de acordo com o Ministério do Esporte. Além disso, o deputado Vicente Cândido afirma que possui um parecer favorável da Caixa Econômica Federal, responsável pelos jogos de loteria no Brasil, para ser criada uma "raspadinha" explorando os escudos dos times. Os recursos também seriam passados para os clubes investirem em modalidades esportivas diversas.
As reuniões para preparar o projeto têm acontecido de maneira informal, na liderança do PDT da Câmara dos Deputados, pelo menos desde o começo deste ano, com a presença de deputados e representantes do Ministério do Esporte. Na última terça-feira (26), o deputado Romário (PSB-RJ), presidente da Comissão de Turismo e Desporto da Câmara, resolveu oficializar o assunto, e a reunião foi realizada na sala da comissão.
Pressa
Romário defende o pagamento de no mínimo 30% da dívida em dinheiro, mas é a favor do projeto de conversão do restante em projetos sociais de esporte. "Acredito que não pode haver uma anistia geral", diz. "Acho que está na hora de os clubes de futebol assumirem mais responsabilidades com os outros esportes, principalmente os olímpicos. Estamos vivendo um momento propício para isso". Para ele, dirigentes que causem prejuízo aos clubes de futebol devem ser responsabilizados criminalmente.
O deputado Danrlei (PSD-RS), ex-goleiro e ídolo do Grêmio, é contra. "Não concordo com o pagamento das dívidas através da contrapartida social", diz ele. "Eu prefiro que paguem de alguma outra forma. É difícil de quantificar estes investimentos sociais, acho que este não é o caminho", diz ele. "Alguns clubes inclusive já pagaram suas dívidas, não devem mais nada. Como vamos compensá-los? E quem vai fiscalizar estes projetos?", questiona ele.
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