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Documentário mostra Havelange vaidoso, incoerente e autoritário

Jones Rossi

Do UOL, em São Paulo

23/10/2013 15h35

Em um momento em que as biografias não-autorizadas estão em debate, o documentário Conversa com JH mostra como elas continuam sendo uma ferramenta necessária para conhecer a fundo personagens que fizeram história.

O filme, que está em cartaz na 37ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, expõe João Havelange, um dos cartolas mais poderosos do século 20, sem filtros: rancoroso, amargo, incoerente, prepotente e autoritário. Embora já estivesse na casa dos 90 anos - hoje Havelange tem 97 - sempre se manteve lúcido nas entrevistas dadas ao jornalista Ernesto Rodrigues.

Rodrigues é o autor de Jogo Duro - A história de João Havelange, livro de 2007 que conta como o ex-presidente da Confederação Brasileira de Desportos, a CBD, conseguir se eleger presidente da FIFA e transformar a entidade em uma gigante global e multibilionária. Para realizar o livro, ele se comprometeu a mostrar os originais a Havelange, embora a palavra final continuasse a ser sua. É esse embate com Havelange que é mostrado no filme.

Havelange é vaidoso ao ponto de querer vetar o depoimento de um antigo amigo, Mario Amato, que o classificou como um "medíocre" jogador de futebol, mesmo que a crítica viesse acompanhada de um elogio sobre sua capacidade física.

Outro ponto que o ex-cartola quis suprimir foi a fala de Victorio Filellini, amigo dos tempos que o Tietê era um rio onde se podia nadar. Em uma prova anual, quando os dois competiam pelo Clube Esperia, Havelange teria ficado cansado e pedido para o amigo esperá-lo. Exaltado, Havelange pede para cortar do livro o trecho.

Mais adiante, o documentário confronta Havelange com falas nas quais ele aparente ter a mais absoluta das certezas, como quando ele diz jamais ter se envolvido com o governo militar. No corte seguinte, ele mesmo se desmente ao contar sobre seu contato direto com o presidente Emílio Garrastazu Médici.

Desafeto de Pelé, a ponto de tirá-lo da festa de apresentação da Copa de 1994, nos Estados Unidos, irrita-se ao ser perguntado sobre um suposto pedido de apoio ao craque para angariar votos na África, na primeira eleição para presidente da Fifa. Afirma com segurança que nunca pediu ajuda a Pelé. É desmentido por Pelé e até pelo amigo Elias Zaccour.

Havelange chega a dizer, reclamando dos que o criticam pela desavença com Pelé. "Falam dele como se fosse um gênio!"

Mais à vontade, Havelange chega a dar conselhos financeiros que diz ter recebido de seu pai. “Meu pai dizia: ‘Filho, se case em regime de separação total de bens. Assim não podem tirar nada de você’”. Questionado por Ernesto sobre seus bens, Havelange irrita-se novamente: “Não é da sua conta. Você quer fazer livro ou quer fazer fofoca?”

Nos últimos anos, o poder de Havelange esvaiu-se aos poucos. Ele renunciou ao posto de membro do Comitê Executivo Olímpico Internacional e de Presidente Honorário da Fifa. Sobre sua fonte de renda, que especulava-se vir de um cartão de crédito sem limite da Fifa e do aluguel de imóveis no Rio de Janeiro, depois descobriu a que ele e Ricardo Teixeira, seu ex-genro e também ex-presidente da CBF, receberam a incrível quantia 44 milhões de dólares em propinas da empresa de marketing esportivo ISL para fechar contratos com a Fifa.

Segundo Ernesto Rodrigues, o filme, com 93 minutos, pode ganhar mais duas versões. Uma direcionada apenas a Havelange e outra à conversa que ele trava com outros três jornalistas sobre os desafios enfrentados na apresentação dos originais a João Havelange.

Serviço: Exibição no dia 27/10 18h15 - Matilha Cultural (Rua Rêgo Freitas, 542 - República  São Paulo)

TRAILER OFICIAL CONVERSA COM JH