"A Justiça Desportiva é apenas administrativa", diz promotor do MP-SP
A discussão sobre a escalação do jogador Heverton na última rodada do Campeonato Brasileiro escancarou uma disputa nos tribunais brasileiros. Depois de a Portuguesa ter sido punida pelo STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva), o Ministério Público de São Paulo instaurou um inquérito para averiguar a possibilidade de a decisão ter contrariado uma legislação federal.
Com isso, mais do que a decisão, o MP-SP colocou em dúvida a força da Justiça Desportiva. O inquérito iniciado nesta semana é baseado em um conflito entre o CBJD (Código Brasileiro de Justiça Desportiva) e o Estatuto do Torcedor.
“A Justiça Desportiva é administrativa. Não tem força pública. Ela tem autonomia e auditores nomeados por pessoas ilibadas, mas é um órgão administrativo”, avaliou Roberto Senise Lisboa, da Promotoria do Consumidor do Ministério Público de São Paulo, responsável pelo inquérito sobre CBF e STJD.
“Há que se investigar a responsabilidade da Confederação Brasileira de Futebol e do Superior Tribunal de Justiça Desportiva por uma ofensa a uma lei federal. O Ministério Público tem função constitucional de defender o interesse da sociedade brasileira. O futebol não é só um aspecto presente na cultura, mas também a profissão e o ganha pão de milhares de pessoas. Portanto, precisa ser levado a sério. Não pode ser tratado como brincadeira, como alguns fizeram nos últimos dias”, completou o promotor.
A Portuguesa foi punida pela escalação irregular do meio-campista Heverton no empate sem gols com o Grêmio, válido pela última rodada do Campeonato Brasileiro de 2013. O jogador entrou no lugar de Wanderson aos 32min do segundo tempo.
Heverton havia sido expulso contra o Bahia e cumprido suspensão automática diante da Ponte Preta. Julgado pelo STJD na sexta-feira que precedeu o empate com o Grêmio, o jogador foi condenado a dois jogos.
A comissão disciplinar e o pleno do STJD entenderam que a escalação de Heverton fere o código 133 do CBJD. Contudo, Senise Lisboa contesta essa versão. O promotor argumenta que o Estatuto do Torcedor revogou esse dispositivo em 2010.
“Os torcedores têm vários direitos, e um deles é que o regulamento dos campeonatos seja seguido. O entendimento da Confederação Brasileira de Futebol é que a punição com base no artigo 133 cumpre o regulamento, mas essa é uma norma administrativa. Ela não tem força jurídica diante de uma lei que foi aprovada pela sociedade civil e sancionada pelo presidente”, disse o promotor.
Quando receberem notificação do inquérito, CBF e STJD terão dez dias para se manifestar. A Portuguesa fará defesa em audiência marcada para o dia 22 de janeiro.
“Se uma pessoa é condenada, sabe e não foi formalmente informada, a condenação não vale. É o mesmo para o esporte. Não é defender a Portuguesa. O Estatuto do Torcedor fala que não tem valor judicial. É simples assim. Até um aluno de primeiro semestre de faculdade de direito consegue entender”, provocou Senise Lisboa.
Na entrevista coletiva em que falou sobre o inquérito, o promotor questionou até o voto dado pelos auditores do STJD. Ele lembrou, por exemplo, que o relator do tribunal sequer citou o conflito entre o CBJD e o Estatuto do Torcedor.
“O voto do relator Décio Neuhaus, apesar de ter seu brilhantismo, não enfrentou a questão que estamos colocando aqui. Passou ao largo disso. A condenação se baseia em uma regra que contraria o Estatuto do Torcedor, que é uma lei federal”, encerrou o jurista.
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