Saiba como vive um jogador brasileiro em Israel em tempos de conflito
Israel e Palestina vivem uma disputa sangrenta que, em menos de um mês, já vitimou fatalmente mais de 1400 pessoas e feriu oito mil, segundo o Ministério da Saúde em Gaza. É em meio ao clima de guerra que jogadores brasileiros que moram em Israel realizam a pré-temporada para o campeonato nacional que começa em agosto.
A poucos dias do torneio, eles seguem com a vida normal em cidades distantes da Faixa de Gaza e não sofrem as consequências da 'guerra' que o noticiário da televisão mostra diariamente. Mas ainda assim enfrentam uma rotina de medo e de fugas constantes para esconderijos sempre que um míssil da facção Hamas é lançado.
O volante Lucas Sasha joga no Hapoel Tel Aviv e está há um ano no centro financeiro no país. Mesmo distante do confronto, ele tem se assustado com as medidas de segurança necessárias para a proteção dos civis. O barulho do toque de recolher é o mais amedrontador.
Quando a sirene é disparada, a população tem um minuto e meio para se proteger em um dos abrigos da cidade preparados para este tipo de ataque. E só é recomendável deixar o local pelo menos cinco minutos depois que o alarme é desligado porque ainda há chances de os destroços caírem sobre as cidades.
Os mísseis deixaram de ser uma grande ameaça para Israel já que são interceptados pelo sistema defesa israelense, o 'Iron Dome' (Cúpula de Ferro), mas ainda assusta.
Lucas conta que já viveu cena digna de filme hollywoodiano.“Teve uma vez que eu estava no carro e tocou a sirene. Eles falam que você tem que parar o carro e correr para o abrigo. Eu deixei o carro no meio da rua, saí correndo. Nossa, parecia cena de filme americano, saí correndo olhando para cima para ver se tinha algo, não tem como não ficar assustado”.
“Eu odeio esse barulho, é assustador. Como se fosse uma ambulância, mas é impossível não ouvir. Mesmo no meio da madrugada, você pode estar em um sono pesado que você acorda”.
Preocupado com a segurança, o jogador do Hapoel está vivendo sozinho no país nos últimos dias porque preferiu deixar sua mulher no Brasil até a situação se acalmar. Lucas conta que quem mais sofre são seus pais, principalmente depois que o governo brasileiro chamou a ação de Israel contra a Palestina de ‘desproporcional’. “Eles temem que eu seja perseguido. Muita gente me perguntou porque o Brasil se posicionou assim. Eu digo que nem todo mundo pensa assim, que é política. Mas nunca aconteceu nada comigo”.
Para permanecer tranquilo em Tel Aviv, Lucas conta com o apoio irrestrito do clube. “Toda vez que toca o alarme, os diretores me ligam e tentam me acalmar. Eles vão me dando as notícias. 'Olha, o antimíssil pegou, não tem perigo nenhum. Se tiver algum perigo, se eles chegarem mais perto, vamos te avisar’. Eles me passam uma segurança muito grande. Se não fosse isso, eu não sei se ficaria porque eu já disse que não gosto dessa situação”.
A situação é complicada mesmo para quem mais acostumado com os conflitos envolvendo israelenses e palestinos. O meia Gustavo Boccoli, revelado na Portuguesa, vive em Israel há 13 anos. Hoje, já é conhecido no país e se tornou um dos maiores ídolos do futebol local. Dono da camisa 7 do Maccabi Haifa, ele já tem cidadania israelense.
Boccoli se sente totalmente adaptado ao país e não pensa em voltar ao Brasil mesmo quando pendurar as chuteiras. Mas ainda sofre com a tensão dos confrontos. “Você fica esperando o dia inteiro a sirene tocar, vive em função disso. Em qualquer lugar que você vai, você procura onde é o quarto de abrigo porque se acontecer alguma coisa você tem um minuto e meio para se esconder. É carro, ônibus, todo mundo parando no meio da rua. Muita apreensão”.
O brasileiro sofreu na pele as consequência do clima hostil que envolve os dois povos. Na semana passada, ele estava disputando um jogo amistoso de pré-temporada entre seu time Maccabi Haifa e os franceses do Lille, na Áustria, quando vários manifestantes invadiram o campo com bandeiras da Palestina e cartazes contra Israel. Boccoli chegou a ser agredido e teve o pescoço ferido ao tentar impedir que um dos torcedores machucasse seus companheiros.
Vivendo há muitos anos no centro do conflito, Boccoli diz que a situação é muito complicada e critica a postura do Hamas. “Se hoje está assim é porque não teve outra alternativa. Não teve solução, o Hamas está todo dia atacando, tem 14 anos que caem foguetes todos os dias”
Os conflitos já alteraram o calendário do futebol local. No mês passado, a Uefa suspendeu temporariamente todos os jogos de competições europeias em Israel. A Toto Cup, um campeonato realizado durante a pré-temporada, teve cancelada a primeira rodada que estava agendada para o próximo fim de semana. Por enquanto, o Campeonato Israelense manteve sua previsão de estreia para o fim de agosto.
Vida tranquila em Israel
Apesar de todas as notícias sangrentas e o grande número de mortes na região, os jogadores dizem que a população tem uma vida muito tranquila em Israel.
Boccoli vive em Haifa, cidade no Norte de Israel. Ele conta que assaltos e atos de violência são muito raros e que as crianças andam sozinhas na ruas sem qualquer preocupação dos pais. “Quando eu ligo a TV no Brasil, eu fico sabendo muito mais coisas. O país está em guerra, mas fora da Faixa de Gaza todo mundo vive normal. É um país muito bom de se viver, roubo não existe, assalto a mão armada. As crianças saem sozinhas, andam de ônibus, os pais incentivam. A gente se sente livre, e infelizmente no Brasil não”.
Quem também está impressionado com a segurança em Israel é o volante Dudu Cearense, que defende o Maccabi Netanya desde o início do ano.
“Eu já morei em vários países e já rodei o mundo. Eu fico preocupado com o Brasil. Israel tem pouco mais de 65 anos e tem uma segurança imensa. Crianças brincam de madrugada aqui. Não tem um trânsito caótico, não tem violência… Em Salvador, onde eu moro, a insegurança é total. Você fica preocupado em como se vestir. Mesmo em guerra, Israel é mais seguro que o Brasil”, disse, em entrevista à Rádio Gaúcha.
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