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Reserva por 45 min, brincalhão e líder. O lado B de Dida no Inter

Jeremias Wernek

Do UOL, em Porto Alegre

27/09/2014 06h00

A porta do vestiário fecha e no meio do círculo de jogadores estão D’Alessandro e Juan. Os dois expõem o tema aos colegas e aguardam por uma posição, que brota em diversos cantos da sala. Muitas ideias, caminhos para a decisão coletiva. Dida, sentado em um canto, interrompe e faz o grupo inteiro ficar quieto. Não com gritos, mas com o gesto de querer falar. Prestes a completar 41 anos, o goleiro se posiciona e ganha apoio. Exerce o papel de líder no Beira-Rio.

A cena relatada acima serve de exemplo para o momento de Dida no Internacional. Contratado em dezembro, o camisa 1 se tornou um dos comandantes do vestiário. Chamado de líder de atitude. E, no campo, surpreende o senso comum de sua imagem ao ser brincalhão. Mas só entre os outros goleiros.

“Ele se fecha no mundo dele, não se abre, mas com os outros goleiros ele se solta. O Dida é o que mais provoca, é o cara que cutuca e sai. Joga fogo na coisa mesmo, no bom sentido. Ele é quem provoca a brincadeira, um brincalhão”, conta Antônio Marques Lopes, o Marquinhos, preparador de goleiros do Inter.

O lado líder foi o que primeiro apareceu na versão colorada de Dida. Egresso do Grêmio, após não renovar contrato, o goleiro usou a ótima relação com Juan, antigo companheiro de seleção brasileira, para ganhar mais rapidamente o respeito interno. Ao lado deles está D’Alessandro, capitão do time desde 2011. E assim se forma a tríade que comanda o vestiário vermelho na atualidade.

“Ele é um líder, sem dúvida. Uma coisa é você falar e não demonstrar. Mas o Dida é coerente, ele fala e mostra. Não adianta só citar o passado de glórias e não fazer no agora, no presente. O Dida é um dos primeiros a chegar e um dos últimos a sair”, aponta Marquinhos.

A raridade das palavras é que torna a opinião de Dida tão respeitada. Introvertido, o goleiro não é flagrado na resenha – termo usado pelos jogadores para conversa, antes dos treinamentos. O lado mais extrovertido só aparece no campo, no canto onde ficam os goleiros.

“Ele é bem na dele, assim como vocês veem aqui de fora”, relata Juan, o parceiro que foi reencontrado em Porto Alegre. “Quando o Dida abre a boca, todos param para ouvir. Ele é o líder da atitude, que fica na dele e age na hora certa. No momento decisivo”, reforça outra fonte do vestiário.

No campo, Dida fez aquilo que não se permite na vida real: oscilou. Regular em seu mundo, em sua quietude, o goleiro falhou dentro das quatro linhas diante do Vitória – onde foi vice-campeão brasileiro em 1993. O erro em uma falta cobrada por Richarlyson o mandou para a reserva. Mas a condição de suplente durou apenas 45 minutos. Muriel, o herdeiro da vaga, sentiu um problema muscular antes do intervalo e devolveu o lugar.

“Ele passa muita confiança para o time, é muito regular. É um privilégio compartilhar o vestiário com um cara como o Dida. Ele é muito humilde”, aponta Juan.

A bagagem de títulos e uma década só de Milan, além de três Copas do Mundo no currículo, pesaram a favor na hora de acertar com o Inter. A diretoria comprou a ideia de que era preciso contar com um goleiro experiente, rodado. Capaz de orientar a defesa. Usou até exemplos de Manga, campeão na década de 1970, e Clemer, em seu argumento interno. E levou Dida.

No dia a dia, Dida ganha mais respeito. Às vésperas dos 41 anos, ele começa a treinar duas horas antes do trabalho orientado por Abel Braga. Os primeiros 60 minutos são só dele, com ele mesmo. Alongamento e fortalecimento muscular. Depois mais uma hora de atividade com os demais goleiros do elenco e, enfim, o encontro com o técnico e o time titular. Este protocolo faz com que os integrantes da comissão técnica o chamem de máquina. Uma máquina de treinar. De jogar futebol.

"Ele é uma máquina, é abençoado pela natureza pela constituição física. É privilegiado mesmo", opina Marquinhos. "O Dida é fora de série, profissional ao extremo", elogiou Abel Braga logo após o jogo da saída e volta - ao mesmo tempo, de Dida ao time titular.